Coluna Wilson Cid, JB, 27 jan 19
As linhas da oposição
Como haverá de se comportar, no Congresso Nacional, a bancada de oposição a Bolsonaro? Na Câmara, a liderança desse grupo vai, naturalmente, para o PT, que três meses atrás o enfrentava nas urnas; não se saiu bem, mas manteve imagem e discurso para contestá-lo. Opor-se, agora, a ele parece ser, então, algo natural e automático. A questão é como desempenhar a contento a tarefa.
Um detalhe da imaginação que circula em mesas palacianas é que esse encargo, se efetivamente confiado aos petistas, não seria totalmente do desagrado do presidente. A razão é que, com seu dever de hostilizar, o PT se afastaria de segmentos políticos mais brandos, não radicais, podendo o Palácio manter com eles um diálogo menos acidentado. Para os bolsonarianos, trata-se dedução lógica, ainda que dependente de avaliação mais cuidadosa.
Seja como for, o momento é importante para o partido, que vive a travessia; vencê-la, sem acidentes, significa muito para consolidar projetos imediatos. O primeiro é abrir caminhos que levem ao esvaziamento do governo, explorando-lhe as vulnerabilidades, uma das quais identificada na precária harmonia do discurso que se ouve no primeiro escalão. Mas, não poderia cometer o erro de contentar-se com críticas e acusações, mesmo que aplicadas sem dó nem piedade. Antes, o partido, para ser alçado ao comando da oposição, terá de dobrar os joelhos frente à inevitável autocrítica; avaliar, sem os calores da campanha, o que se fez ou se deixou de fazer na pregação eleitoral. Por que não conseguiu conter a maré alta da direita no Brasil? O que faltou dizer e fazer? É na busca dessas explicações que será possível elaborar novo plano de voo para contestar o novo governo. Difícil o mea-culpa, porque não falta entre petistas quem considere isso uma humilhação.
Outro detalhe instigante, e não se sabe exatamente o que os dirigentes pensam a respeito, é se seus caminhos devam continuar mapeados na imagem de Lula. Se, por fim, a ideia prosperar, será preciso decidir de que forma ocupá-la, sem aguardar sua volta à liberdade. O recolhimento à cela do ex-presidente ninguém sabe quanto vai durar. Mas convém o PT refletir que a pena, já em fase de cumprimento, não ficará nos nove anos das sentenças prolatadas em Curitiba e Porto Alegre. Pode mantê-lo como símbolo martirizado pela Justiça “tendenciosa”, mas é preciso adotar algum realismo, pois liderar um projeto de poder, para quem está atrás das grades, é difícil. Lula não tem o mesmo destino de um Nélson Mandela.
De quem a culpa?
Em meio a discussões que se arrastam, sem que falte sutil caça às bruxas, busca-se, ainda, identificar e condenar culpados pela derrocada do partido. Há resistências em transferir essa responsabilidade a Haddad, vencido por Bolsonaro, quando se imagina que exatamente esse revés é que o credencia a dar curso a novos planos capazes de fazer esquecer o que as urnas frustraram. Convém não fechar os olhos a uma realidade incontestável: é injusto achar que ele deva carregar nas costas o acidente eleitoral de outubro. A grande tragédia do PT nem teria sido o fracasso diante de Bolsonaro. A maior ficou plantada em Minas, onde a ex-presidente Dilma foi condenada a modesto quarto lugar na disputa de uma cadeira no Senado; justamente ali, onde sua candidatura pretendeu ter o sabor nacional de reparo e desagravo, o amanhecer de um retorno. Haddad foi uma emergência, adotada em clima de divisionismo, talvez mesmo para não ganhar; porque, se ganhasse, não haveria como tirar de suas mãos a liderança do partido.
A nova legislatura do Congresso Nacional inaugura-se dentro de cinco dias. Seria temerário para a oposição já entrar em cena titubeante, sem estratégias definidas.
“A oposição será sempre popular. É o prato que resta à multidão fora do banquete”
-Joaquim Nabuco
-Joaquim Nabuco