terça-feira, 26 de novembro de 2019

Partido e reeleição 


Longe está de ser reduzido o número de observadores que consideram o novo partido do presidente da República como um primeiro passo no elenco do projeto que o levaria à reeleição em 2022. O segundo foi fato foi um papai-noel antecipado, com o trenó em que Lula deixou a prisão para robustecer o fenômeno da polarização, tão ao gosto de políticos do perfil bolsonarista. O presidente precisava muito disso, como no passado precisou Carlos Lacerda (estarão lembrado os cariocas veteranos), quando amor e ódio tornavam-se grandes eleitores. Bolsonaro necessita de Lula, para ter um nítido contrário na outra ponta da corda que estica o eleitorado em movimento único, sem intermediações. Ai de quem estiver no meio do caminho, porque a lei dos extremos é tiro ou queda. 

Outra análise a ocupar as pautas aludi ao partido em formatação, que nada releva de conteúdo ideológico ou doutrinário; fala vagamente na pátria sem a preocupação de propor ideias e remédios por ela reclamados. Esse projeto começa por substituir o indispensável “partido” por “aliança”, o que permite aprofunda a suspeita de algo improvisado, meramente circunstancial, como foi a Renovadora Nacional nos tempos da ditadura; será uma organização capaz de arregimentar simpatizantes, ao mesmo tempo que permite ao presidente desvencilhar-se do incômodo e de antigas cobranças do PSL. Eis a repetição do enredo: não são os partidos que se prestam ao poder dos homens, mas os homens que servem ao poder dos partidos.

Já se acentuava, com o fim da Velha República, certa vocação laboratorial em relação a organizações políticas. Quando estão a reclamar situações momentâneas, os dirigentes cuidam de juntar experiências frustradas, um projeto de poder e temperar o novo suco com acomodações. Como ainda em nossos dias, mistura-se tudo em almofarizes e tubos de ensaio; e das buretas nasce um partido, como agora oferecem os alquimistas do Planalto. Algo feito para gestação suficiente. No começo do século passado Joaquim Nabuco já havia percebido: “as massas vão do partido A ao partido B, que morrem e recomeçam sempre na mesma oscilação, num flutuar de esperanças sempre decepcionadas”.

O Brasil caminha para o 38º partido oficialmente constituído, sem que deles se possa cobrar consistência e alguma coincidência entre o que dizem em suas siglas e o que realmente produzem para a sociedade. Em sua grande maioria inspirados em contingências, como a novidade dessa aliança, cujo primeiro teste, na eleição de prefeitos no próximo ano, será a preliminar para a campanha de novo mandato presidencial.

Melhor fariam as lideranças, Bolsonaro à frente, se abrissem discussão sobre a experiência vivida pelo Brasil sob o instituto da reeleição, nunca acolhido pela unanimidade dos estudiosos da ciência política, além de autorizar a suspeita de que o segundo mandato presidencial – mera coincidência? - sempre é inferior ao primeiro. Não há negá-lo, a partir de evidências colhidas na segunda gestão de Fernando Henrique, depois com Lula e Dilma. O ditador Vargas, que retornou ao poder com o voto popular, teve desempenho tão acidentado na volta, que acabou por levá-lo ao suicídio. A continuidade, por mais tentadora que seja, é espinhosa e escorregadia. O principal argumento de que se valem defensores da reeleição, estribando-se no modelo dos Estados Unidos, é a administração não interrompida; diferentemente do primeiro mandato, este de quatro anos, dos quais apenas dois com real utilidade, pois no primeiro arruma-se a casa e no último, enfraquecido, espera-se a chegada do substituto. Pois nesse particular, o lastro da experiência, o Brasil não tem muito a oferecer. 

Ter partidos como peças degradáveis, fruto de maquinações do momento, e os mandatos elásticos são o bastante? Certamente que não. (Wilson Cid hoje no "Jornal do Brasil!") 

terça-feira, 19 de novembro de 2019

Constituinte fora de hora


Wilson Cid hoje no "Jornal do Brasil" 

Inebriado pelos louros que lhe subiram após a vitória da emenda que criou nova estrutura para o sistema previdenciário brasileiro, o presidente do Senado achou conveniente uma mexida geral no texto constitucional, não só para prender criminosos abatidos pela condenação em segunda instância, como também para rever aspectos da Carta que considera defasados. Não há como atribuir ao entusiasmo uma proposta com escassa capacidade de ajudar a sociedade a solucionar problemas que, como sabe o jovem senador, já estariam removidos com o que se herdou da Constituinte de 88; ou, mais simplesmente, no que coubesse, pela via larga da legislação ordinária. Nada que se possa creditar além do ímpeto comemorativo, mas longe de constituir novidade, porque as reformas constitucionais sempre foram tentação para muitos políticos e raros juristas, estes por saberem que retoques ocasionais sempre se revelaram insuficientes, quando não para ferir direitos coletivos. Advertiu Pierre Marie Duguit sobre “essa eterna quimera de procurar inserir na Constituição a perfeição que não temos”.

A prisão em segunda instância, sem que se espere pela última, é tema que excita, ao calor da revoada dos condenados que proliferavam na cadeia, carpindo os excessos navegantes no generoso mar da corrupção com que se contempla o Brasil. Precipitar o castigo, antes que morram as últimas esperanças, parece ganhar a simpatia popular, porque faria bem o Congresso dar fim aos avanços e retrocessos tão ao gosto do Supremo Tribunal Federal; cabível, portanto, um suficiente reparo por uma emenda ao Texto Maior; mas sem que se possa aproveitar a carruagem para a incursão geral sugerida. É possível que, vencido o natural entusiasmo da hora, o presidente Davi Alcolumbre conclua pela desnecessidade da cirurgia profunda de uma nova Constituinte, seja formada por representantes para ela especificamente eleitos ou – muito pior – se para tanto se credenciem deputados e senadores, que não foram eleitos para tamanha responsabilidade.

Sempre houve congressistas que cederam à tentação de admitir que a Lei Maior é uma espécie de panaceia, mesmo que a experiência insista em demonstrar o equívoco creditado às sete anteriores, homologadas ou promulgadas. Nem por isso se deram ao trabalho de aprender que o texto pode ser sintético ou analítico; o primeiro modelo certamente mais eficaz. Já havia anotado o jurista e ex-ministro Saulo Ramos que temos sucumbido ao erro de organizar um texto constitucional como se elaboram os estatutos de clube recreativo, cheios de miudezas, penduricalhos e extravagâncias. Contudo, todos aplaudem a enxutíssima constituição americana, mais ainda a inglesa, consuetudinária, na qual apenas 25% são escritos e o mais confiado à tradição.

Quanto menos retocada a Carta mais respeitada, sem aventuras políticas e jurisdicistas, e sem essa perigosa tentação de substituí-la totalmente à frente do primeiro impasse. Valeria não descuidar da advertência de quem promulgou a de 88, "alforria dos cidadãos", definindo-a como um caminho a ser percorrido com persistência, mas sem do arcabouço descuidar. Muito antes dele, sempre o respeitável Rui já havia traçado o perfil da Constituição ideal: “sensata, sólida, política nos seus próprios defeitos e compreensível nas suas contradições inevitáveis.” Sucessor de Ulysses Guimarães na presidência do Congresso Nacional, o senador Alcolumbre facilmente chegará à conclusão de que uma reforma geral e imediata é tudo de que precisamos para conturbar e ampliar inseguranças na convivência mínima do momento político, que já não são poucas.  

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

PSB e PT juntos ?

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursou no Nordeste, domingo último. O primeiro discurso naquela região, depois que foi solto, após decisão do Supremo Tribunal Federal. Valendo-se de um festival de música no Recife, o presidente de honra do PT atacou novamente a Operação Lava Jato e o presidente Jair Bolsonaro. Aproveitou a oportunidade para se encontrar com o prefeito da cidade, Geraldo Júlio, e o deputado federal João Campos (filho do falecido Eduardo Campos), ambos pertencente ao PSB.

A eleição municipal de 2020 já entra nas conversas dos políticos, e Lula demonstra que tem pressa. E pretende manter o PSB como aliado dos petistas. Especula-se que ele vai morar no Nordeste, e pode ser em Pernambuco, seu estado natal, e governado pelo PSB. O Sudeste está muito influenciado pelo bolsonarismo, e São Paulo governado por João Dória; não é um bom lugar para Lula fazer moradia. Mais uma vez, a deputada federal Marília Arraes (PT) será convencida a deixar de ser candidata à prefeitura de Recife, pois Lula prefere que o PT apoie primo dela, o deputado João Campos. Com isso o PSB deverá recompensar em outro município importante, apoiando candidatura a prefeito do PT, e retirando uma candidatura própria. Pode ser que o deputado federal Júlio Delgado (PSB-MG) aliado dos socialistas pernambucanos, seja solicitado a fazer algum sacrifício em sua candidatura em Minas, uma vez que ele tem o controle do partido no estado. Talvez ele mesmo venha a declinar de sua pré-candidatura a prefeito de Belo Horizonte.

Em Juiz de Fora os dois partidos devem ter candidaturas próprias. O PSB tem candidatura praticamente consolidada, a do empresário da construção civil Wilson da Rezato, que há três anos está em campanha diária, desde sua primeira experiência em 2016, quando ficou em quarto lugar, e bem votado ('empate técnico' com o terceiro colocado) .O PT tem na deputada Margarida Salomão a possibilidade de, pela quarta vez, candidatar-se à prefeitura, mas caso o partido procure outra opção terá no deputado estadual Betão um combativo substituto. Diante disto é difícil imaginar a retirada da candidatura de Wilson da Rezato pelo PSB para apoiar candidato do P; e da mesma forma o contrário é verdadeiro. Talvez em eventual segundo turno os dois partidos caminhem juntos. Talvez, porque em se tratando de política tudo é possível.

sábado, 16 de novembro de 2019

Esta velha República

Neste 15 de novembro são comemorados os 130 anos da república brasileira, sem que faltem novos livros lançados para se reestudar nosso período republicano. Por definição a república significa o cuidado com o bem comum. Res publica, ensinaram as lições latinas do nosso ginásio; algo bem distante dos fatos atuais, quando alguns empresários e políticos brasileiros (ocupantes de cargos de relevo) são processados, condenados e presos, devido a condutas nada republicanas. Os corruptos e corruptores deixam-se guiar apenas pelos interesses egoístas.

A necessária reflexão sobre a data sugere a dissonância da realidade política nacional com os ideários proclamados pelos fundadores de república em 1889. Alguns historiadores, ao se debruçarem na leitura dos registros históricos desde o início do período republicano, certamente estarão acometidos de sentimento de desencanto.

Relembrando alguns fatos históricos marcantes no período que começou com o velho marechal Deodoro, que febril e confuso fez a Proclamação, é possível pontuar os seguintes:
  • O período Vargas na década de 1937, com a implantação do regime do Estado Novo;
  • A época do regime militar, quando se destacam a repressão política e o 'milagre econômico', na década de 1970;
  • A efervescente década de 1980, com a volta das eleições diretas para presidente e o processo constituinte;
  • A implantação do Plano Real, que proporcionou uma inflexão na condução da economia brasileira na década de 1990;
  • A vitória política da esquerda brasileira na eleição para Presidência da República na década de 2002.
Hoje vivenciamos a incerteza no momento político brasileiro, depois da eleição e posse de um político, que, por seus atos, demonstra vontade de marcar a república com iniciativas inusitadas. Pode representar uma nova fase da vida nacional, onde preponderariam os valores conservadores nos costumes e o liberalismo na economia.

quarta-feira, 13 de novembro de 2019


Proposta inoportuna 


O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, considerou, na última terça-feira, a necessidade da instalação de uma nova Assembleia Nacional Constituinte para estabelecer, através do poder legislativo, as prisões daqueles condenados em segunda instância judicial. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, ao analisar a proposição, disse que iniciativas como esta geram insegurança no país.

A Constituição Federal em vigor desde outubro de 1988, portanto há mais de 30 anos, com emendas superiores a 100, tem sido objeto de controvérsias. O STF sempre é solicitado a se posicionar diante de temas controversos do cotidiano brasileiro. O mais recente foi a análise da jurisprudência existente desde 2016, que permitia a prisão de condenados em segunda instância. No penúltimo entendimento a corte, pelo placar de 6 x 5, havia considera devida a prisão de um condenado após a segunda instância do poder Judiciário confirmar a condenação. Agora, no último entendimento, pelo mesmo placar o STF, porém inverso, não autoriza a prisão, mas apenas após o trânsito em julgado.

Uma nova Assembleia Constituinte com o objetivo de se repensar o país poderá acontecer no futuro. Agora não se justifica o tema, embora mobilize a opinião pública. Há várias possibilidades no Legislativo de forma a agilizar o processo no poder Judiciário, para que se impeça o uso abusivo, pelos advogados, de expedientes protelatórios que evitam a condenação de seus clientes. Isso acarreta impunidade e enfurece a população ávida por justiça.

Precisa ser analisada a fundo a propositura de uma Constituinte pelo jovem presidente do Senado, oriundo do estado do Amapá. Seria apenas um arroubo de poder do senador Davi, após a promulgação da nova Previdência Social? Às vezes os políticos, inebriados por vitórias retumbantes, encorajam-se a propor novos desafios. Mas seu colega do partido Democratas, o deputado Rodrigo Maia, presidente da Câmara Federal, mais experiente, foi logo emitindo opinião contrária, evitando mais turbulências no ambiente político nacional. Ou seria o sr. Alcolumbre um porta-voz de políticos interessados em uma constituição mais restritiva de direitos?

terça-feira, 12 de novembro de 2019


A cara do inimigo 



A libertação do ex-presidente Lula foi o alvoroço da semana passada, como também o pioneiro instrumento para definir com clareza os papéis de oposicionistas e governistas nas duas eleições que se seguirão. A oposição devolve às ruas a bandeira lulista, depois de permanecer indefinida enquanto seu líder purgava condenação trancafiado em Curitiba. Parece ter ficado claro na veemência com que ele deixou a cela e investindo contra os adversários. É naturalmente o escalado para bater, sem resquício de tolerância, no governo Bolsonaro. 

Mas o episódio sugere revelar que o presidente também saiu contemplado. Se até agora os ensaios de contestação e descontentamento vinham das próprias entranhas do poder, em clima de convulsão intestina, aqueles 6x1 do Supremo Tribunal fizeram o favor de dar a Bolsonaro um adversário visível e autêntico, o que lhe permitirá proveito da polarização, fenômeno talvez já formatado para o cenário eleitoral de 2020. Foram duas as portas que se abriam para os dois.

De novo assistiremos àquela radicalização do ano passado, quando o antilulismo converteu-se em gigantesco cabo eleitoral da direita. Nesse novo tabuleiro do xadrez os eleitores estarão em xeque-mate para optar entre ser contra ou a favor, um espectro que rouba parte da identidade do cidadão e de seu voto.

Tal ocorrendo, os municípios serão chamados a oferecer sua cota de sacrifício. Envolvidos pela polarização das lideranças nacionais, os problemas do cotidiano das populações do interior cairão para segundo plano. Um prefeito se elegerá mais pelas simpatias ou antipatias em relação a Bolsonaro e a Lula, o que bastará para relegar a plano inferior propostas locais sobre saúde, educação e transporte. Nas urnas de 2020, ardendo paixões cristalizadas entre o presidente e seu desafeto, uma política de arcos e flechas, ódios derramados e o país sob a égide da intolerância, ao munícipe pouco espaço restará para cuidar dos temas que interessam à terra em que vive.
Seja qual for o destino mediato ou imediato do ex-presidente, que já partiu para o ataque, um fato consequente irrecusável é que Bolsonaro conheceu a cara do adversário, depois de passar parte de sua gestão convivendo com esse ineditismo: a oposição, diferentemente do que vivenciara em outros tempos, não se encarregara de uma contestação natural de grupos contrários. Estranho que pareça, até essa providencial libertação de Lula, estão nas próprias trincheiras os criadores de problemas para o Planalto; involuntários empenhados no esforço de corroer as entranhas do poder, a começar pelo papel desgastante desempenhado por parentes ou amigos de consoada; não os que deviam trazer pedras na mão, mas os que aplicam tapinhas nas costas. Peculiar, quase bizarra, a realidade a que se assiste através dos meios de comunicação: ataques, denúncias e suspeitas quase sempre nascendo e prosperando entre antigos correligionários de partido e ex-colaboradores, para não se falar das incursões da prole.

Note-se, então, que foram duas as portas libertadoras, por onde os dois acabam de passar. O ressurgimento de Lula é, nesse sentido, quase uma bênção para o adversário que pretende destruir.

Bom que os litigantes, conhecidos por cultivarem incontinência verbal, não deem asas ao catastrofismo nem estimulem correligionários a manifestações predatórias; mas cuidem de discutir, criticar, denunciar, sem que facilitem desordens, impasses e destruições. Diferentemente do que se tem visto em países asiáticos, na França, no Chile, no Iraque, como também na metrópole Hong Kong. Não custa considerar as lições que vêm de longe. (Wilson Cid hoje no “Jornal do Brasil”)

domingo, 10 de novembro de 2019


Bolsonaro x Lula



Não seria conveniente tirar conclusões apressadas das primeiras consequências da libertação do ex-presidente Lula, depois de 20 meses encarcerado em Curitiba; até porque ele ainda terá de enfrentar sete processos por crimes diversos. O que não impede de dizer que, estando solto, ele veio contribuir, polarizando a disputa pelo poder central, tudo para gerar radicalizações em série a partir de agora. Estão concordes os analistas políticos quanto a essa tomada de rumo e essa nova cor da política nos próximos meses: Lula em um extremo, Bolsonaro na outra ponta, medindo forças e ambos cuspindo fogos e marimbondos. O fato de estarem de acordos nos imediatos disparos contra a Rede Globo, apoiados por manifestações públicas, nada mais representa que uma breve coincidência. Aliás, essas manifestações têm primado, entre seus exageros, pela humilhação a que são submetidos nas ruas os repórteres e cinegrafistas, injustamente humilhados.

Mas, voltando ao cenário criado com a votação do 6x1 do Supremo, quando a corte decidiu acabar com a prisão de criminosos em segunda instância: essa apertada votação enfraqueceu o tribunal, deixando claro que o tema guarda enormes divergências. Decisão sem robustez e sem convencimento, reconhecem alguns juristas.

Outro aspecto, este de nosso interesse imediato, é que a polarização na política nacional tem tudo para comprometer a temática municipalista na eleição do novo prefeito já no ano seguinte. Valerá pouco saber se o candidato tem o melhor programa para os problemas da cidade, porque sua sorte dependerá de ser simpático a Bolsonaro ou a Lula. Estando os ânimos acirrados, as ruas tomadas por lulistas e bolsonaristas, as questões da população terão tudo para naufragar em segundo plano. Péssimo para nós.

A política em razões que ela própria desconhece. Veja-se o que aconteceu agora: Bolsonaro precisando urgentemente de um fato para beneficiar-se da polarização; algo ou alguém capaz de reeditar o 2018, quando o que mais pesou foi o voto contra, pois é exatamente nesta hora que surge par salvá-lo, um Lula espumante e esbravejador.


quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Tempo de águas

Cidades que o descaso do serviço público vem transformando em mais líquidas que certas, mergulhadas em temporais com alto poder destrutivo, Rio e S.Paulo tornaram-se referência para se avaliar o que elas e outros grandes centros urbanos do país passam a sofrer nessas épocas do ano, que geralmente se situam entre novembro e abril. Importantes concentrações urbanas, nelas, quase sem exceções, não se realizam obras e serviços indispensáveis para impedir que as chuvas causem grandes estragos; a começar pelo maior deles, a tragédia das vidas humanas que se perdem. Observe-se o noticiário: em todas as regiões brasileiras grandes prejuízos por causa das águas que não escoam.

No Rio, para não ser preciso sair de casa, cita-se que são antigos os planos de contenção de encostas, todos referentes a lugares de maior risco, cuja execução independe de investimentos monstruosos. E, mesmo que assim fosse, poderiam ser realizados paulatinamente. Ora, desde os tempos de Pedro Ernesto a prefeitura sabe onde se situam as áreas perigosas e vulneráveis no tempo das águas.

Mas, ainda que fosse possível justificar a negligência ante o custo das obras, há que se considerar que boa parte dos estragos que o Rio enfrenta nos últimos meses é consequência da ausência de serviços comuns, como limpeza de córregos e bocas de lobo. Acumuladas toneladas de detritos, a água não tem como ser canalizada. Os resultados já conhecemos, e com eles muito sofremos, também em Juiz de Fora. Ora, serviço de limpeza não pode ser razão para as desculpas de prefeitos, que continuam emprestando ares de perplexidade aos desastres que as populações tem enfrentado.

Com as chuvas ou sem elas, temos sido condenados a coisas exóticas no Rio de Janeiro: na administração, um “bispo licenciado”, o que constitui singularidade em qualquer organização religiosa. E um prefeito fatalista, sem reconhecer, com humildade, ser ele próprio uma fatalidade. (Wilson Cid, hoje, no “Jornal do Brasil” )



Possível aliança

Segundo a imprensa paulistana, lideranças do PV, PDT, PSB e Rede avançam para costurar alianças em cerca de 120 cidades na eleição do ano que vem, com vista à escolha dos prefeitos. Certo que Juiz de Fora está na lista para tais negociações. Naturalmente a cabeça de chapa ficaria com o nome que nessa aliança se mostrasse mais competitivo. Segundo a mesma fonte, novas reuniões devem ocorrer ainda neste mês.
Em Juiz de Fora, a se viabilizar o entendimento, parece que o cabeça de chapa seria Wilson da Rezato (PSB). Possível vice, o vereador Zé Márcio (Partido Verde).

Emendas 

Raramente na política municipal uma liderança do Partido dos Trabalhadores admitiu razão para entender-se com os tucanos. A deputada Margarida Salomão encurtou as distâncias, foi estar com o prefeito Antônio Almas. E explicou em sua página eletrônica a reunião que tiveram, “somando esforços para que as emendas sejam totalmente executadas, para que o município não perca nenhum centavo”, declarou a deputada sobre emendas parlamentares anteriores, ainda não completamente executadas, além do anúncio das indicações de novas emendas ao orçamento de 2020”.
Ela destinou para o próximo ano R$ 5,4 milhões para a prefeitura, metade destinada à conclusão de duas obras de Unidades Básicas de Saúde que estão paralisadas em São Benedito e Jóquei Clube 1.

sábado, 2 de novembro de 2019


Aos Mortos



 A gente precisa dedicar um pouco mais de atenção aos parentes e amigos mortos, que não podem ser esquecidos, seja pelas virtudes que praticaram, seja pelos erros que construíram na sua efêmera peregrinação pelo mundo. Os bons merecem ser lembrados pelas obras e bens que semearam; os outros também, porque, afinal, mostraram maus exemplos a serem evitados. Há séculos também as Escrituras sustentam que os caídos não devem ser relegados, até porque eles apenas nos antecederam. O fim deles também será o fim de todos. Não é outra a verdade que alguém mandou gravar no frontispício de um campo santo do Maranhão: “nós, os ossos que aqui estamos pelos vossos esperamos”.

E digam que não. Há quem consiga escapar da última batalha, aquela que se travará contra a morte?. Lembrando isso, quase todas as religiões recomendam que sejamos modestos nas vaidades e prudentes na busca dos poderes terrenos, pois nada se leva daqui, como lembra o portal de um outro cemitério, este em Genebra, com grandes letras para ninguém esquecer: “Ici, l’légalité. Aqui, a igualdade. Todos no mesmo nível da miséria final.

Esquecer os mortos jamais, também porque com seus ossos se sepulta um pouco de cada sobrevivente retardatário, como definiria Felipe Casteline Roque: “Aqueles que passam por nós não partiram sós; deixaram um pouco deles; levaram um pouco de nós”. A propósito, certo dia, curioso, o deputado Ulysses Guimarães perguntou a um cacique tapuia o hábito de sua gente amarrar nas costas ossos dos antepassados, e ficou sabendo logo: “é porque os mortos nos governam”.

Padre Vieira disse, parece que numa pregação em Lisboa, que a virtude da morte é que ela amansa tudo, e perante ela todos são horizontalmente iguais. Melhor ainda o sermonista definiria depois. A nossa pobre vida humana vai do pó ao pó. Sobe o vento é o pó de pé, é a vida; cessa o vento, o pó deitado, é a morte. Um de seus grandes leitores, o ex-ministro Darcy Ribeiro também filosofou sobre os finados: se a carne volta à natureza cósmica, a grande coisa que está na vida é o nascimento da morte. Não há negá-lo.

Este Dia de Finados enseja pensar no inevitável crepúsculo das vitórias fugazes e o erro dos excessos que em nome delas se praticam. Em nada adianta acumular riquezas à custa de imensos sacrifícios. Tão bem disse um jornalista contemporâneo: a vida, na sua instantaneidade, é apenas uma centelha na noite densa do nada. A morte nos espreita em algum desvão do tempo. Caminhamos irremediavelmente ao encontro dela. Mesmo os que, pretextando falsa naturalidade no fatídico rompimento da existência, busquem coragem em Fernando Pessoa para dizer que a morte nada mais é que apenas a curva na estrada. “É só não ser visto mais” .

Seja como for, reverenciada a memória de tantas ausências queridas nesta quinta-feira, afastando maiores pessimismos sobre a duração da vida, fique a palavra final com o grande Guimarães Rosa: vale a pena morrer para a gente provar que viveu.