quinta-feira, 5 de setembro de 2019


Mal que vem pra bem



No interior de Minas, correligionários do presidente Bolsonaro pretenderam promover manifestação na sexta-feira, quando transcorre o primeiro aniversário do atentado que sofreu, ainda como candidato, naquele Estado, onde quase perdeu a vida. Acabaram desistindo de algo mais expressivo, porque o próprio desinteressou-se por ampliar o uso político do episódio, não mais envidando esforços para provar que o agressor agia sob inspiração de oposicionistas interessados em sua derrota nas urnas. Pensava-se, até mesmo, inaugurar uma placa metálica na esquina comercial em que ocorreu o atentado, onde, para muitos, reescreveu-se a crônica eleitoral de 2008. Bolsonaro cresceu e venceu ao impacto da solidariedade de milhões a alguém ferido por uma facada. Mas a data não fica totalmente esquecida, porque simpatizantes pragmáticos vão celebrá-la com uma campanha de filiação em massa ao PSL, partido governista.

Dia como esse 6 de setembro não é para festas, sejam quais forem as simpatias ou antipatias alimentadas pelos brasileiros em relação ao presidente, pois tais sentimentos há; para mais ou para menos, conforme a terminologia das pesquisas que são elaboradas sobre ele e seu governo. Mas, se ainda se permite aproveitar o ensejo da data, valeria lembrar que a Amazônia e sua fornalha, se ardem e castigam, também podem se converter em presente.

Primeiro detalhe é ruim. O desastre abala o governo, pois o mundo fez o Brasil sentar-se no banco dos réus, acusado de ter se transformado no mais cruel dos delinquentes ambientais. Não arrefece as hostilidades lembrar que o fogaréu vem de pecados que se repetem há décadas; e nem por isso os ambientalistas deixam de se queixar do pouco-caso brasileiro com o verde amazônico, mesmo que seus países tenham cometido crimes tão ou mais graves.

Por outro lado, não falta algo de útil que Bolsonaro pode extrair desse temporal que desabou sobre o governo. Porque o mundo, mesmo crítico e agressivo, vê-se obrigado a reconhecer o Brasil como principal instrumento de desejável mentalidade ecológica universal, tão revolucionária quanto corajosa. A causa, se o presidente desejar, pode lhe cair ao colo como regalo, com todas as oportunidades para mostrar que, se o planeta precisa da Amazônia, a Amazônia precisa de todos os povos que se preocupam com ela.

Cabe então aos outros governos respeitar a floresta, não com verbas ocasionais oferecidas ao sabor de reações da opinião pública, mas adotá-la, principalmente contribuindo com serviços técnicos e contendo ambições desmedidas de certas organizações não governamentais, que, sob capa ovina, são as primeiras a proteger incursões criminosas e a exploração de diversificadas riquezas naturais. O esbravejador presidente Macron prestaria relevante serviço se ajudasse a conter a ganância com que empresários europeus subornam madeireiros e comunidades indígenas em busca de fortunas pela via da importação predatória e clandestina dos lenhos de qualidade que saem por fronteiras quilométricas, carentes de fiscalização. Ou que, incidindo em delitos não menos graves, almejam facilitar a internacionalização da exploração de minerais. Desconfia-se, não sem fundadas razões, que a preocupação com as árvores que pegam fogo esconde o que está por baixo delas…

Não é tarefa das mais fáceis obter que o presidente dê tratamento a tão grave problema sem as paixões  conhecidas em suas abordagens. Mas, como se diz, ele precisa aproveitar o limão da hora e dele fazer a limonada: tão logo cessem as críticas e cobranças, sensibilizar a opinião pública internacional para os reais desafios da Amazônia. Fazê-lo em termos severos e respeitosos, com a serenidade digna de quem há um ano começou a viver de novo. O momento pode ser o grande presente, se souber aproveitá-lo e vender seu peixe ao mundo.

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