terça-feira, 21 de setembro de 2021

 




Divagações em torno da conjuntura


((  Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Tomadas as pesquisas eleitorais até agora publicadas, se a eleição presidencial fosse no próximo dia 3, exatamente um ano antes do que determina o calendário, os mais votados seriam Lula e Bolsonaro. E, com os costumeiros 10% de votos brancos e nulos, venceria quem conseguisse 45% + 1 da votação. Ainda com base nas pesquisas, um palpite: Bolsonaro com 30%, Lula com 40%, e outros avulsos somados 20%, o que significa que a terceira via não vingaria. Num segundo turno, a permanecer assim, possivelmente Lula ganharia.

Os candidatos do lulismo do bolsonarismo, expressões políticas consolidadas e radicalizantes, devem representar, cada um, em torno de 25% do eleitorado nacional. São os seus eleitores considerados fiéis, fechados com seus líderes, sugerindo que a terceira via só vingará em 2022 se for possível construir amplo apoio em torno de um único nome. Mas se um daqueles não for candidato o quadro hipotético mudaria muito. A conversa teria de ser outra.

Pode-se prever que o impasse estará resolvido a partir de abril de 2022, com as candidaturas então definidas, restando a possibilidade de a história de 2018 se repetir: os partidos que atualmente debatem possível união vão mesmo caminhar para candidaturas próprias, sabendo-as inviáveis. Mas por que? Porque com isto ajudam a indução de votos para cada legenda, podendo-se eleger mais deputados federais. Então PDT, MDB, PSDB, DEM e mais alguns devem apostar nessa opção pragmática. Ter votos na Câmara dos Deputados seria - quem sabe? - mais importante que a eleição do presidente, pois, quem quer que seja o governante de plantão, vai precisar de maioria no parlamento. Em 2018 foram 13 candidatos a presidente. A tendência é que isso se repita.

Outro dado da conjuntura revela que lideranças militares elaboram todos os sinais de que não querem deixar o governo federal. E Bolsonaro verbaliza o pensamento de uma parcela delas. O general Braga Neto, ministro da Defesa (ou, como antigamente, ministro para a guerra) surge no horizonte como a figura talhada para cuidar do movimento de manutenção do poder dos militares no Planalto.

Imagina-se, com todas as razões, que o pré-candidato Lula e a cúpula do PT devem estar buscando saída política para eventual movimento militar contrário ao seu governo, se bem sucedidos nas urnas. Acredita-se que isso deva estar ocorrendo, começando pelas conversas que emissários petistas vêm mantendo com o meio empresarial, importante para uma possível interlocução.




Vida ou morte



Já se vai o Setembro Amarelo, não sem, antes, deixar recado sobre uma realidade que, insistentemente, os governos primam por desconsiderar; se não tanto, preferem reduzi-la a segundo plano. Trata-se da Saúde Mental, que precisa ganhar maiores espaços nos investimentos sanitários dos orçamentos federal e estaduais; a começar cuidando de elaborar e acompanhar estatísticas reais sobre a incidência dos suicídios.

Recorro ao médico e professor José Fiorillo, estudioso da matéria, que concluiu terem aumentado, nos últimos dois anos, em 30%, os casos de pessoas que tentaram por fim à vida. Vinte por cento consumados.

Se a morte provocada é, por si só, um grande problema, deve-se admitir sua crescente gravidade nas faixas mais jovens da população. Tem-se constado isso nos últimos tempos. Moços e moças, hoje mais que nos anos passados, são desafiados pelas coisas  que lhes parecem insolúveis, e padecem da escassez de perspectivas, sejam elas profissionais ou sociais. Para não esticar no tempo esse vazio, os mais instáveis são impelidos a recorrer àquilo que Albert Camus chamou de “atração pelo nada”.

As políticas de saúde mental começaram a ganhar alguma envergadura nos últimos 20 anos, mas os governos precisam reciclá-las, como imposição de experiências e conhecimentos adquiridos nas tragédias causadas por transtornos. Nesse sentido, uma última advertência há de ser oportuna, carregada pelos reflexos e consequências da pandemia, que tem levado milhares de pessoas ao isolamento social, algo doloroso, principalmente para os jovens. O último trimestre do ano seria mais que adequado para pôr em prática o que o Setembro Amarelo ensinou.



Direita precavida



A emergência de uma solução para os precatórios, ao lado de sua complicada relação com o teto de gastos, desviou parte das atenções políticas, mais centradas no Congresso e no Judiciário, o que, por certo, desaqueceu, no final da semana, confabulações em torno da fusão do DEM e PSL, simbiose que excita os gabinetes do Planalto. Sobram razões para interessar, e uma delas é a investida das forças de direita, olhando para a eleição de 2022. Se elas têm Bolsonaro para apostar numa reeleição, não deixam de perceber que seria inconveniente permanecer refém dos destinos do presidente. Jogam, preventivamente, numa defesa de longo alcance, o que inclui a possibilidade de constituir terceira via no quadro sucessório. O que, aliás, insinua sem qualquer preocupação com os desafios mediatos e imediatos do país; sem planos e sem ideias.



Há toda evidência de que se trata de projeto circunstancial, sem compromisso com a durabilidade, meramente eleitoral. Mas começa, se vingar, criando uma bancada de 80 deputados, o que não é para desprezar.



A previsão era de que, findos os entendimentos, a batida do martelo seria neste começo de semana, mas ainda persistia dúvida, sem que os articuladores consigam remover temores constatados nos estados sobre a real eficácia da fusão. Algo que precisa ser levado na devida conta, porque os governadores, sobretudo dos estados menos expressivos, não pretendem apenas fazer parte de uma plateia que assiste às decisões tomadas pelos caciques. Já aprenderam a desconfiar. Além disso, querem, com justiça, avaliar melhor em que a inovação pode influir nos seus planos de ganhar novo mandato.



Vindo a fusão, será ela, por acréscimo, mais uma razão para a esquerda se repensar, sem ceder à tentação de achar que é bastante escalpelar Bolsonaro.



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