terça-feira, 30 de agosto de 2022

 

Propaganda enganosa 

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))






Começou o horário eleitoral gratuito no rádio e TV. Em outras épocas, a campanha limitava-se à propaganda apenas a esses meios de comunicação, diferentemente de agora, quando estão no cenário as redes sociais (whatsapp, facebook, instagram etc.) a levar a mensagem dos candidatos. Ideal é que houvesse alguma sinergia entre o rádio, a TV e redes sociais na divulgação dos candidatos.

A dúvida que se tem é quanto ao alcance da propaganda, sobretudo entre os mais jovens, que vão deixando de lado o hábito de ver TV ou ouvir rádio. E, quando o fazem, é através das redes sociais. Entretanto, parece que as assessorias sabem como lidar com isso. Espera-se que consigam motivar a participação dos eleitores, reduzindo-se a abstenção.

Lembranças de eleições anteriores dizem respeito ao uso equivocado de boa parcela dos candidatos, que, pretendendo chamar atenção, conseguiram transformar o horário gratuito em espetáculo de bizarrices, às vezes engraçadas, às vezes de mau gosto. O que revela certa despreocupação dos partidos com o espaço público concedido para veicular propostas.

O público espectador da propaganda na TV geralmente desgosta do horário reservado pela Justiça Eleitoral, mesmo quando de curta duração. Na avaliação de alguns, é chatice que devia acabar, enquanto, em outros, a crítica é a qualidade do conteúdo. Seja como for, permite-se concluir que é mais eficaz a mensagem de curta duração, inserida no meio da programação comercial.

Enfim, a nós, eleitores, resta ter o discernimento suficiente para desconsiderar a propaganda enganosa, essa que ludibria os desavisados. O melhor a se fazer é avaliar as propostas em conversa com os amigos, com os círculos de convivência, e votar com consciência. O eleitor só tem um voto, e deve privilegiar aqueles que carregam uma história de vida consentânea ao cargo que pretende ocupar.

A tentação da reeleição

Tem sido frequente, nas entrevistas com candidatos à Presidência da República, indagar se estariam dispostos a ceder à tentação de um segundo mandato; o caso, agora, de quem for eleito pela primeira vez. A prudência tem sugerido que os consultados neguem a intenção, embora eles e todos saibam que o projeto de reeleição escapa de seu domínio, porque é sempre determinado pela contingência, pelo momento. Chegada a hora, o presidente ou governador vê-se diante de pouco poder de decisão, ainda que, sinceramente, pretenda cumprir o que foi prometido, contentar-se com mandato único, esquecendo a aventura de mais quatro anos.

As forças políticas e, sobretudo, os interesses econômicos que se formam e prosperam ao lado do chefe do Executivo, é que impõem a busca da perpetuação no poder. O presidente Castello Branco, nos idos do golpe de 64, havia prometido passar o governo em janeiro de 66 a quem fosse eleito para substituí-lo. Não obstante, mesmo sendo considerado um homem pessoalmente honrado, não teve como cumprir a palavra, em nome do que se convencionou chamar de “emergência revolucionária”.

Resta o fato de a reeleição ser um instituto sem maior acolhida na tradição da política brasileira, só rompida com Vargas, na década de 30, e, bem mais tarde, com os segundos mandatos de Fernando Henrique, Lula e Dilma. Deu no que deu.

Acerca de alguns mistérios

Os mistérios da política costumam ser mais salientes do que permite a avaliação de quem a observa. Já se disse sobre a estranha realidade de estarmos frente a uma eleição, a mais polarizada e tensa de todas, sem que para tanto hajam contribuído divergências em torno de um verdadeiro projeto de poder e de governo. O eleitorado é instado a ser árbitro de dissidências que nada têm a ver com os interesses do país. Em rigor, é chamado a votar coisas sem importância maior.

Não menos misteriosa é a questão das urnas eletrônicas, tidas como resultado da mais alta tecnologia, elogiadas em quase todo o mundo, mas, ao mesmo tempo, cercadas de grandes dúvidas quanto à sua capacidade de respeitar o voto que lhes é confiado.

O pasmo, capaz de preocupar o eleitor, estende-se às pesquisas sobre intenção de voto, que variam entre a derrota de um candidato e a vitória de outro em turno único. Mais ainda: os preferidos são exatamente os mais rejeitados… Em que ruas e caminhos andam os pesquisadores, que continuam esbarrando em número tão conflitantes? Mistério.

Outra indagação diz respeito ao papel dos partidos, quando estão a um mês da eleição. Um dado curioso, sem necessidade de citar outras incongruências, está refletido na campanha da senadora Simone Tebet. Ela disputa a Presidência da República, oficialmente apoiada por dois dos três maiores partidos do Brasil, MDB e PSDB. E nem por isso consegue romper a linha dos dois dígitos. Que mistério é esse?

Salvação em Minas

Alguém conseguiu colocar na cabeça do presidente Bolsonaro que a melhor garantia de êxito na reeleição está na capacidade de reverter quadro desfavorável em Minas, embora seus números não sejam, hoje, tão sombrios como os que se podia ler em semanas passadas. Confiante no poder dessa decisão, foi o que o levou a um fervoroso apelo, na última quarta-feira, quando disse aos mineiros que conta com seus votos para vencer no primeiro turno. Ali as pesquisas não lhe andavam favoráveis, apesar de uma camuflada e discreta simpatia do governador Romeu Zema, que, contudo, promete escancarar o apoio num eventual segundo turno.

(Valeria registar uma observação recorrente e lúcida de Vittorio Mediolli, prefeito de Betim, sobre os votos discretos dos mineiros, assim mantidos até o instante final: na última eleição, a pouco mais de um mês, o governador Romeu Zema tinha 3% nas pesquisas, mas ganhou de Antônio Anastasia com 72%).

Em relação a Minas, há uma crença quase folclórica de que o eleitor realmente esconde sua preferência enquanto o tempo lhe permite, o que a muitos pode significar insegurança. Na verdade, a própria posição do estado, como segundo maior colégio eleitoral, encostado entre os dois outros maiores, São Paulo e Rio, faz com que se deixe assumir um papel pendular, sob influências vizinhas. Talvez também possa concorrer para isso, entre outros fatores, estarem aquelas montanhas, como definia Tancredo Neves, no meio do caminho entre as riquezas do Sul e a pobreza do Nordeste. Atropelada pelas diferenças, a política dos mineiros seria mais cuidadosa para se posicionar. Portanto, o fiel de balança a atrair o interesse do presidente.

Em 1989 ocorreu um fato que ajudou a consolidar a crença de que em Minas que as coisas custam influir, e é preciso garimpá-las, como os antigos faiscadores de ouro. Foi o ano em que Leonel Brizola não acreditou nessa fama, dispensou Hélio Garcia para compor a chapa presidencial, preferindo busca um companheiro em Pernambuco. Perdeu para Lula por menos de 2%, diferença que os mineiros cobririam com facilidade, se um dos seus compusesse a chapa. Fernando Collor preferiu não arriscar. Buscou Itamar Franco e venceu.

O primeiro debate

O debate entre os “presidenciáveis”, na tela da Band, domingo à noite, confirmou que precisamos aprofundar o discurso sobre um verdadeiro projeto para o Brasil. Via de regra, os candidatos empurraram os telespectadores para o campo das boas intenções ou das fantasias; ou, no caso dos dois que lideram as pesquisas, mais preocupados com o que já fizeram, um mergulho no passado, como se os desafios do futuro fossem mera ficção.

Repetiu-se o que em comentários anteriores aqui se lamentou sobre o formato desses debates televisivos: as perguntas que trocavam entre si preocupavam-se, antes de tudo, em deixar envergonhados ou constrangidos os opositores. Cobranças e ciladas.

Mirando agora o segundo turno, que parece menos improvável, ficou claro que apenas o candidato do Novo, Felipe D’Ávila, saiu de cena em situação confortável para aderir a um dos dois candidatos que estarão em confronto no último domingo de outubro. Os demais, tanto se xingaram, tanto se ofenderam, que não terão como convidar seus eleitores a optar. A não ser que enterrem a coerência.

Em certas incursões, tentando se blindar das mazelas, alguns garantiram que seu mundo não é da política. Então, de que mundo sã

terça-feira, 23 de agosto de 2022

 

Desafios da vizinhança



((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil") 

Pois a campanha corre, sem deixar sinais de se concentrar em temas que, de tão relevantes, não podiam passar ao largo, como se diz dos navios que ignoram a presença de melhores portos. O descaso dos discursos talvez possa ser debitado, mesmo que apenas em parte, à polarização entre dois candidatos à presidência da República, porque a polarização é filha primogênita e dileta da radicalização; e esta tem se satisfeito com a troca de críticas e desaforos pessoais. Na campanha o essencial acaba seguindo a rota daqueles navios. Passa ao largo.

A primeira ausência a se lamentar é que a disputa dos votos nega espaço à discussão de um verdadeiro projeto nacional. O único conhecido é de autoria de Ciro Gomes, já lançado há algum tempo. O que queremos para as gerações imediatas? Nossas vocações regionais, um modelo de sociedade preocupado com harmonia minimamente consolidada. O que os políticos dizem sobre isso?

Mas há outras questões de imediato, desafios que nos aguardam, e podem resultar em complicadores. Entre eles, valeria citar um; e quanto a este, mais uma vez a sugestão é mirar o mapa do Brasil e dos nossos vizinhos. Somos hoje uma ilha, grande ilha, mas cercada por um cinturão de governos socialistas e socializantes, realidade que seria imprudente desconhecer. Criou-se uma situação geopolítica que, queiramos ou não, impõe-se. Caso mais que evidente é a Venezuela, país que vive em clima de crise permanente e difusa. Nossa Roraima tornou-se a residência-refúgio de 32 mil venezuelanos. Não há como escapar dos compromissos humanitários dessa tragédia, pronta a se repetir com outras comunidades próximas, que caminham para enfrentar problemas semelhantes. Ideologicamente, os presidentes latinos são uma lástima: alguns conservadores quanto aos costumes, e déspotas, como convém à extrema direita.

Sobre o próximo governo, esse que vamos constituir em outubro, devem pesar equipamentos diplomáticos e econômicos para que o mundo não nos cobre além do que permitem nossas possibilidades e interesses. Autoriza e avulta tal preocupação, que devia tomar parte na pauta dos candidatos, é que, em breve, o Brasil pode se ver sob grandes pressões: de um lado, os governos socializantes, tão chegados, a reivindicar respaldos; e, em outra linha, o capitalismo mercantilista dos Estados Unidos e da Europa a nos exigir resistências e desabonos em relação a esses vizinhos, com alguns dos quais guardamos antiga e respeitosa fraternidade. Seria ver o Brasil entre ovos e cristais em salas e cozinhas que não são as nossas.

Um detalhe oportuno a se considerar é que a situação de proximidade com os Estados Unidos pode insinuar aliança em termos de defesa continental, e historicamente os militares seguem diretrizes de Washington.

Não se ouve candidatos tratando do assunto. Podem alegar inconveniência para o momento, mas eles, os partidos e suas alianças não teriam como negar a relevância. O que sentimos é sobre todos exercer um fascínio pelo clima da radicalização, que entre outros defeitos, arrasta o eleitor a se apaixonar por divergências e sentimentos menores.

Bom será se a futura exposição do Brasil a interesses ideológicos de vizinhos e de governos distantes não nos condenar a atuar nos conflitos que são menos nossos que dos outros.

Singularidades e esquisitices

Na contagem regressiva para o 2 de outubro, dia de eleição quase geral do país, só estão fora os vereadores e prefeitos. Tempo para que se registrem algumas particularidades, que convém analisar, a começar pelo fato de agora, como nunca antes, termos tantas pesquisas de opinião eleitoral, às vezes contraditórias em termos de resultados e discrepantes na diferença estatística entre os que lideram a intenção de votos dos entrevistados.

Outra surpresa do processo de escolha são as federações partidárias, já natimortas desde sua estreia. As federações, na verdade, são "gambiarras" do Legislativo, tentando compensar o fim das coligações proporcionais. Não colou. Dificilmente tal dispositivo chegará ao pleito municipal de 2024.

Não menos singular, até mesmo pitoresco neste ano eleitoral, é a volta de políticos condenados devido ao trabalho da Lava Jato. Essa operação não sobreviveu às intempéries do clima político que se respira em Brasília. E, agora, expoentes dela, juiz e o promotor paranaenses entraram para a política, disputando mandatos no Congresso Nacional. Sabem, com certeza, que o poder do mandato é inigualável.

Prosseguindo nos episódios que marcam o jogo eleitoral, vê-se o inusitado debate pré-eleitoral sobre a urna eletrônica, que acabou sendo atriz principal da cena política, considerada de conduta duvidosa na recepção dos votos. A urna eletrônica, antes pouco observada, passou a ser elevada à condição de assunto de relevância nacional. Enquanto isto, os problemas brasileiros tornam-se secundários no debate eleitoral.

Ainda que não seja o epílogo do enredo eleitoral, está o temor de alguns golpe de estado, ruptura democrática diante da possibilidade de resultado eleitoral diferente da reeleição do atual presidente. Isto surge a partir de teoria possivelmente conspiratória. Como consequência, alguns próceres nacionais, como também acadêmicos, artistas, empresários e outros lançam carta em defesa da democracia, que já chegou a mais de um milhão de signatários, em tempo recorde, devido à internet.

Enfim, são fatos que viram roteiro da singular cena eleitoral onde a democracia é visualizada de diferentes formas, dependendo da ótica dos atores envolvidos. Uns, em nome da normalidade democrática, defendem esse valor para o Brasil; mas, em relação a outros países com afinidades ideológicas, flexibilizam os postulados, defendem regimes fechados. Sem que faltem os defensores de total liberdade na economia, mas ditadura na política...

É como vai caminhando nossa política em passos trôpegos.

Cartilha do eleitor

Ao contrário de outros segmentos religiosos, que procuram deixar claras suas preferências por determinados candidatos, a Igreja Católica preferiu não citar nomes, mas opta por orientar os eleitores com sugestões genéricas, como escolher candidatos nunca envolvidos em corrupção, defensores da concepção natural e competentes para lidar com os recursos públicos. É o que se lê na cartilha que acaba de ser lançada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. O documento deixa de nomear os candidatos que são simpáticos aos princípios católicos, o que não impede que alguns de seus celebrantes, principalmente de tendência esquerdista, assumam certas candidaturas. É o que têm feito. Ainda assim, bem mais discretos que os pastores neopentecostais, que denunciam para os crentes os “diabólicos”, que não merecem o voto.

A cartilha também tomou cuidado de recomendar aos católicos que considerem a diferença entre bancada e frente parlamentar, esta com apoio da Igreja: “É uma instituição da Câmara dos Deputados, oficial, regulamentada e reconhecida”, e com ela a CNBB mantém relação de proximidade e diálogo. O documento, referindo-se à próxima eleição de deputados, deixa claro: não deseja uma “bancada” católica na próxima legislatura, tal como a dos ruralistas, “da bala” ou evangélica. Não se mistura.

Os prelados estão lamentando o desinteresse dos jovens pela vida pública. Para romper a indiferença cabe “compreender o verdadeiro significado e a nobreza da política”, começando por procurar diferenciá-la da politicagem, porque é desta que vem a corrupção.

Números que insinuam

Os quadros estatísticos elaborados pelo Tribunal Superior Eleitoral, com base no registro das candidaturas, trouxeram algumas informações importantes, que extrapolam do imediato interesse pelo pleito que se avizinha, mas permitem avaliações sobre a sociedade brasileira que vai se deixando influenciar por novos componentes. O primeiro dado a merecer reflexão é que, pela primeira vez, o eleitorado composto de negros e pardos revela-se superior à participação branca. Enquanto aquele é de 49,49%, os bancos representam 48,3%. Não se trata de uma diferença expressiva, mas é necessário considerar que os votantes negros e pardos sempre crescem dois pontos a cada eleição.

Outra ascensão observada na composição do colégio eleitoral brasileiro é creditada às mulheres, que representam hoje 52%. Subiram mais um pouco.

Evidente que os números insinuam, de imediato, a necessidade de políticas públicas atentas aos setores que mais crescem na população. Números que se recomendam, antes de tudo, aos partidos e candidatos que estão em campanha.

terça-feira, 16 de agosto de 2022

 


Poderes desconfiados


((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" )) 



Como não há antecedente de uma gestão do TSE a enfrentar tantos conflitos com o Executivo, a posse, hoje, do novo presidente do Tribunal permite temer que as divergências possam levar a dificuldades no âmbito da campanha e, mais ainda, do processo de votação. Os ritos de uma eleição sempre enfrentaram algum desencontro nas interpretações, mas, desta vez, o tom se agravou a partir das dúvidas suscitadas quanto à vulnerabilidade das urnas, como insiste alguém que não é apenas o presidente da República, mas igualmente o candidato a um segundo mandato, e sempre indicado entre os favoritos. As opiniões separadas se alastram e apaixonam. Tudo concorrendo para acentuar as tensões que todos já conhecemos.

O TSE é, a partir desta terça-feira, comandado pelo ministro Alexandre de Moraes, cujas relações com o presidente Bolsonaro escorregaram do campo das animosidades para a desafeição. E só se agravaram.

A primeira discórdia, em razões nunca suficientemente demonstradas, mas responsável por encher milhares de páginas, brotou da possibilidade de os votos terem a destinação alterada em 2018; o que deu a Bolsonaro argumento para garantir que sua eleição teria se consagrado no primeiro turno. Fracassou ao buscar apoio do Congresso para a emissão do voto impresso, junto ao eletrônico, como garantia de que a vontade do eleitor é respeitada. Bem pensando, se tamanha celeuma fosse prevista, ideal é que o comprovante impresso fosse mesmo adotado. Teria evitado ameaças de crises geradas no inconformismo.

Moraes, precavendo-se de ataques passados e futuros ao sistema eleitoral que agora vai presidir, dá garantias solenes de um processo limpo, seguro e transparente. Nem todos acreditam nisso. E, entre estes, os que veem o ministro praticando política partidária, alimentando simpatias, das quais Bolsonaro sempre foi excluído. Também justificam dúvidas especialistas no campo da informática, alguns da inteligência das Forças Armadas. Insisto em que o melhor remédio para derrubar a controvérsia, a pá da cal, teria sido o voto impresso, que não pode ser contestado. Vale o que está escrito, como filosofam os habituados à fezinha do jogo do bicho.

Vê-se que a campanha, que hoje abre espaço para a propaganda dos candidatos, caminha em campos minados por desconfianças, com agravante de que a interferência de tribunais superiores em questões políticas tem contribuído para alimentar a argumentação dos que sentem risco de excessos de judicialização no processo e nos resultados das eleições que se aproximam. Uma preocupação que não pode ser acusada de estar eivada de imagens fantasiosas. Para tanto, basta lembrar que, a permanecerem na liderança os dois que lá estão, uma eventual estreita diferença de votos entre eles pode levar a perturbações com suspeitas de fraude.

Desejável é que o novo presidente do TSE saiba vencer dúvidas e superar animosidades, para que o processo eleitoral corra sem incidentes.

Planejar é preciso

Subiu à mesa do presidente da República, no aguardo de validação, a lei que acaba de ser aprovada pelas duas casas do Congresso, estabelecendo normas e limites para a esterilização voluntária, um passo a mais que se dá rumo à organização familiar, tema que, hoje, como haverá de ser sempre, é cercado de dúvidas e preconceitos. Agora, o que se almeja é conferir ao homem ou mulher a limitação da procriação, desde que sejam pais de um mínimo de dois filhos vivos. Uma delicada inovação é que a decisão por esterilizar já não depende mais do duplo assentimento do casal. Basta que seja desejo de um dos cônjuges, o que leva alguns críticos a admitir que, por consequência, dá-se ao marido insatisfeito o direito de buscar com outra mulher o terceiro ou mais filhos que desejar… Como todos os radicais, exageram os que assim opinam.

Cercada de temores religiosos e estratégicos, a concepção controlada, indesejada ou socialmente inoportuna, é matéria que tem fundamentos para garantir que continuará distante de unanimidade. Agora também, porque a esterilização é ideia que desagrada a setores preocupados com segurança nacional, dependente da ocupação dos espaços territoriais; como também tem restrições dos que temem baixa produção de mão de obra... Mas a limitação de trabalhadores não se deixa controlar pela alcova, e sim pelo progresso da tecnologia, que vem mostrando a máquina mais eficiente que o homem.

Quanto à defesa, os avanços tecnológicos também deixam claro que apenas a presença física, ao contrário de agressões passadas, não garante domínio dos espaços, porque podem ser conquistados ou destruídos a distância. Aliás, é o que faz sentido afirmar que um país com defesa precária é o mesmo que ter defesa nenhuma.

Com a aprovação da lei, independentemente de o presidente sancioná-la ou não, a ocasião deve ser aproveitada para aprofundar conhecimentos sobre planejamento familiar, começando por diferenciá-lo de controle populacional. Nada a ver uma coisa com a outra. Porque o desejável é tão somente ajudar o pobre a não ter filhos que não pretende ou não pode ter, e enriquecer populações desvalidas.

A preocupação não é apenas de brasileiros. Na verdade, vem prosperando, principalmente junto aos povos mais pobres; aqueles sem acesso a recursos e métodos anticonceptivos. Para estes, li em algum gerontólogo, o nome não vem à lembrança, que nestes tempos que vivemos, o primeiro filho é amor, o segundo é costume, o terceiro descuido, o quarto loucura, e o quinto irresponsabilidade...

Bens não bem ditos

Numa semana em que o humor entrou em luto, pela morte de um de seus mestres, talvez para homenagear sua memória deu-se a conhecer a declaração de bens dos candidatos. Modestíssimos bens. É de fazer rir. Engraçadíssimo. Não se tratou, propriamente, de declaração de bens, mas apenas de bens declarados. O que é diferente.

Tal como na prestação de contas dos gastos da campanha, quando os relatos sempre coincidem com o que a legislação a permite, os candidatos e partidos fingem que cumpriram a lei e a Justiça Eleitoral finge que creditou.

Dia de duplo desafio

A campanha pela reeleição do presidente Bolsonaro é lançada, oficialmente, na manhã de hoje, em Juiz de Fora. Diz-se lançamento oficial, porque em campanha ele já se lançou há alguns meses. Naquela cidade mineira são duas as razões que justificam a escolha. A primeira é um desafio aos que desejam vê-lo fora da política e da vida, pois quatro anos passados, em 6 de setembro, a poucos metros de onde vai discursar, ele foi atacado e gravemente ferido por um ex-militante do Psol. Se é verdade que quase morreu, não é menos verdadeiro que o atentado resultou em uma onda de solidariedade, que lhe foi favorável.

O segundo desafio para a escolha de Juiz de Fora é que está ali o principal reduto do PT mineiro, que hoje administra 28 dos 853 municípios do Estado.