Federações empobrecidas
((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" )
Ao se esgotar, nesta terça-feira, o prazo para que se organizem e se registrem as federações partidárias, afora pouco prováveis iniciativas de última hora, fica demostrado que não foram elas o caminho adotado pela grande maioria das legendas: das 33 que temos registradas no Tribunal Superior Eleitoral, apenas sete se aventuram; e os menores participantes talvez ambicionando, num primeiro momento, passar por cima das exigências do desempenho mínimo. É a conclusão que se toma da análise de vários observadores. Então, entram em cena apenas três organizações federalizadas: PT, PCdoB e Verde; PSDB e Cidadania e, por fim, Psol e Rede.
Quis a maioria caminhar com as próprias sandálias, talvez por avaliar que a federação compromete a identidade de cada qual, ou, ainda, por entender perigoso o dispositivo que obriga tais acordos a vigerem, no mínimo, por quatro anos, o que pode inibir projetos para a eleição municipal que virá dentro de 24 meses. É sabido que os pleitos municipais diferem em questões pontuais dos cenários nacionais, como o que temos hoje. Têm a defini-los poderosos interesses localizados. Além de tudo, faz parte de nossas experiências que acordos e leis eleitorais primam pelas circunstâncias, pelo momentâneo. Com essa tradição, como honrar compromissos com validade de quatro anos? O próprio legislador não cuidou de deixar suficientemente claros e eficazes os instrumentos que permitam cobrar o cumprimento do prazo de validade dessa novidade. Portanto, não há quem seja capaz de apostar na sobrevivência das federações.
Diz-se, contudo, que elas têm o condão de estimular fusões em futuro próximo. O que seria bom, porque a fartura de partidos, longe de abrigar com nitidez as correntes do pensamento político, fragmentam a representação parlamentar, que, enfraquecida, torna-se presa fácil para as pressões em troca de favores. Se federados, encontrando razões para se juntarem em definitivo, podem prestar um bom serviço.
Polarização estimulada
Quatro meses na discussão de nomes para a Presidência da República; outros tantos meses restantes para a ida às urnas, assistiu-se, e ainda se assiste, a dois fenômenos capazes de se explicarem entre si, simultaneamente. O primeiro é a consolidação da polarização entre dois candidatos; o segundo fenômeno é a quase rendida capacidade de se viabilizar uma terceira via, que seja capaz de chegar atrelada a alguma chance de disputar na primeira linha.
A polarização socorre, em primeiro lugar, ao interesse dos dois que lideram as tendências dos votos, porque com ela se sentem bem no muito em que contrastam; e, de tal forma, que um abriga e alimenta as correntes descontentes do lado oposto. Na verdade, Lula e Bolsonaro necessitam um do outro, reciprocamente. Detalhe importante é que, em meio a essa reciprocidade entre inimigos, eles vêm contando com a simpatia e o estímulo latente de lideranças políticas e financeiras, que já acumularam experiências que lhes garantem convivência harmoniosa com ambos. Podem conviver facilmente com quem desse páreo se sair melhor. Os banqueiros, por exemplo, sinalizando que podem se dar bem com qualquer dos dois da dianteira, são suficientemente pragmáticos para dispensar a novidade de outra candidatura. Pelo certo pelo duvidoso, vota-se na repetição.
Desse cenário extrai-se a dificuldade para se construir a alternativa eleitoral; um nome com expressão suficiente para fustigar e tentar romper as trincheiras de Lula e Bolsonaro. Na última semana, ao despontar de injunções, a senadora Simone Tebet não teve de esperar muito tempo para perceber que nos mesmos partidos que a apoiam há correntes empenhadas em esvaziar seu projeto, pretextando argumentos que não escondem o namoro com acenos lulistas e bolsonaristas.
Na política sem desistir
Recuando sua pré-candidatura à Presidência da República, que, na verdade, foi uma defenestração patrocinada pelo PSDB, o ex-governador paulista João Dória diz que a decisão não significa retirar-se da política. O mesmo deverão dizer, em futuro próximo, todos os que não conseguirem viabilizar suas candidaturas. Se por nenhuma outra razão, pelo menos porque a experiência adquirida na primeira fase do embate não deixa de ser um patrimônio que se agrega ao currículo político dos atores. Demais, observa-se uma coisa interessante: do rescaldo dos projetos eleitorais mal sucedidos resta, sempre, a cinza das esperanças. Da próxima vez pode ser melhor, porque a política tem capacidade de gerar surpresas que até a Deus surpreendem.
Luiz Inácio persistiu quatro vezes até chegar à Presidência, e acaba que aprendeu o caminho das pedras para voltar. Ciro Gomes é outro exemplo de persistência, embora nenhum deles possa se comparar a José Maria Eymael, veterano postulante, que vai entrar em cena pela sexta vez na corrida presidencial.
Depois de passar pelas experiências de fel e mel nessa arena, não se desiste facilmente. O poeta mexicano Amado Nervo dizia, há quase 100 anos, que é mais fácil encontrar uma mulher resignada a envelhecer do que um político a sair de cena, confirmando não ser aconselhável esperar que os navegantes da política desistam facilmente das longas viagens que alimentam sonhos. Porque não é a fome, nem mesmo o desejo, mas a sede de poder o demônio que toma conta do homem, ensinou Nietzsche, que via na política a melhor fonte de onde brota o poder. E, na aventura para conquistá-lo, segundo a imagem de Ulysses Guimarães, o homem público torna-se, a um só tempo, caçador de nuvens caçado por tempestades. O advogado mineiro Dario de Almeida Magalhães foi além: “o poder vicia e cria dependência escravizadora, como os tóxicos”.
Por tudo isso, entende-se que o destino de João Dória não o deixa peregrinar por outros caminhos, que não sejam os caminhos dos embates políticos.
Fumo no brasão
Entidades e autoridades sanitárias, que no passado lutaram contra o tabagismo, incomodavam-se com a presença de um ramo florido de fumo no brasão oficial da República, ao lado do ramo inofensivo de café. Não fica bem para a marca oficial da República, obrigatória em todas as repartições públicas, expor planta tão nociva à saúde. É provável que poucos deem conta disso hoje, Dia Mundial sem Tabaco, data sempre ignorada no Brasil.
Mas vale registrar que a remoção do fumo no brasão foi proposta, em maio de 2005, pelo senador Valmir Amaral (PMDB-DF), que pretendia substituí-lo pela cana-de-açúcar. Foi demovido dessa ideia pelo colega de partido, o goiano Maguito Vilela, alegando que da cana saem a cachaça e males muito mais maléficos que os cigarros... O assunto morreu aí, e o brasão continuou se orgulhando de coisa que faz mal.
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