terça-feira, 16 de abril de 2024

 



O que esperar do Senado



((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))




Não foi bom saber que, no silencioso bojo das consultas de gabinete sobre reforma eleitoral, em tramitação no Congresso, há senadores postulando investida na moralidade, numa tentativa de ampliar de oito para 10 anos a duração dos mandatos – os seus e dos que ainda estão por vir nas eleições posteriores. Estranho que sejam raras as reações a esse atentado; na verdade, tratando-se de comentaristas políticos, ouviu-se apenas o protesto, bem fundamentado, do jornalista Cláudio Humberto, na Bandnews. Pelo menos que seja do conhecimento, não houve outros. A estranheza diante desse plano é ainda maior, quando disputa acolhida na mesma reforma a iniciativa do representante cearense Eduardo Girão (Novo), que não amplia, mas reduz o mandato para cinco anos; o que, aliás, conviria a todos que se elegem pelo voto popular, tanto nos pleitos majoritários como proporcionais. Os partidos políticos, igualmente silentes, o que não é objeto de surpresa.


Pensando bem, a salvo o caso de algumas instâncias do Judiciário, 60 meses corridos são suficientes para o desempenho da função pública. Notadamente, os ungidos pelo voto popular.


Nada justifica dar uma década de mandato a um representante público; mais ainda em nosso tempo, quando a sociedade experimenta mudanças rápidas e profundas. Durante períodos mais longos, as coisas se modificam, como também as leis, as esperanças, as aspirações coletivas. Está fartamente demonstrado, para quem elege ou é eleito, que a mentalidade e a visão dos problemas sociais e políticos também se modificam. Diga-se de passagem, são raros os países em que se concede mandato de oito anos.


Convém lembrar que o mais importante na função senatória é seu significado perante a Federação. Por isso, respeita-se a igualdade da representação – sempre três para cada estado -, independentemente do tamanho de cada um deles. Esse número está entre as mais antigas tradições parlamentares do país. Já o definia a Primeira Constituição republicana, em 1891, quando o mandato foi fixado em nove anos. Quando veio a Constituição de 34 a duração caiu para oito anos, e assim permanece até hoje. Foi o golpe definitivo contra a vitaliciedade dos senadores contemplados pelo Império.


Cerca de trinta anos atrás, Lúcio Alcântara (PSDB-CE) quis reduzir o mandato pela metade, mas enfrentou as mesmas resistências que, hoje, deve enfrentar seu conterrâneo Girão.


Questões realmente importantes pelejam por espaço nas agendas do Congresso Nacional. Quanto ao Senado, pesa sobre suas responsabilidades, talvez pelo encargo federativo, empenhar-se, com mais coragem, em defesa de suas atribuições originais, para conter os avanços que sobre ele tem praticado o Supremo Tribunal Federal, que costuma legislar acima do Legislativo. Isso é mais importante que propor o prêmio de mandatos esticados.



Um mundo de tensões


Das vagas reflexões de fim de noite de domingo não puderam escapar os intensos noticiários sobre a perigosa progressão das crises no Oriente, agora agravadas com o ataque do Irã a Israel; e os temores de uma possível retaliação desmedida. A maioria dos países civilizados parece entender isso. O governo brasileiro optou por ajudar a esvaziar as novas tensões em um mundo já com muitos problemas; de forma que a intensificação de guerra, presente ou latente, é tudo de que não precisamos.

Tem razões especiais para medir sua intromissão no caso. Não se sente à vontade para condenar, abertamente, o ato dos iranianos, limitando-se a uma nota insossa, onde se lê que acompanha com “grave preocupação” o clima que acaba de se criar na região oriental. Talvez não devesse, mesmo, posicionar-se claramente. Por dupla razão: a primeira é que já se conhece a simpatia do governo Lula pelo Irã; a segunda razão, porque é antipático a Israel, um dos protagonistas.


Sem ter demonstrado, até agora, muito tato para lidar com as relações internacionais, criando alguns atropelos, o Planalto tem, para recomendar prudência em novas iniciativas, o fato de ser contemporâneo de um dos momentos mais delicados do mundo. Momento que exige altas competências, o que não tem muito a ver conosco.


Os cuidados e dúvidas se somam diante de outra constatação, com tudo para preocupar. Dá-se a clara impressão de que os países do Oriente conseguiram, à custa de secular beligerância, conviver com uma indispensável estrutura econômica, social e política instruída por permanentes tensões. Não conseguem caminhar sem isso, porque a guerra pode estar na esquina mais próxima, e bombas explodem com fartura. Tensão é preciso, e o governo Natanayahu é bem o exemplo clássico: a guerra com o Hamas é que mantém seu governo de pé; já teria caído há meses. Os fundamentalistas muçulmanos do Irá, aprovados por apenas 20% da população, mantêm-se, igualmente, pelos temores com vizinhos adversos.


É o que torna difícil qualquer propósito pacifista. Porque no Oriente Médio guerrear é preciso. Seu doloroso destino.


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