Conversa com os evangélicos
(( Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))
O presidente Lula entrou, com disposição, no projeto de atrair a simpatia de setores evangélicos que têm se manifestado arredios em relação ao governo. Parece que seu plano é envolver, na busca desse objetivo, tantos ministérios quantos forem necessários; e é tarefa a ser cumprida de imediato, porque as eleições municipais aproximam-se, e, de certa forma, vão traçar o destino do próprio governo para 2026. Lula não é novato nessa preocupação. Na verdade, não é a primeira vez que a política tenta atrair favores e simpatias das camadas religiosas, embora, em tempos passados, muito mais que hoje, o prestígio de padres e pastores convertia-se, com facilidade, em votos decisivos.
Em Minas, onde os políticos nunca desprezaram a ajuda da Igreja, quando chegava a eleição, o velho Bias Fortes ensinava que “é preciso ter apoio do padre, que consegue o voto; do juiz, que proclama o eleito; do soldado, que garante a posse”… Hoje, já não é o mesmo aquele poder de definir votos e as preferências por candidatos. Na interior, ainda pesa alguma orientação, principalmente quando procede dos segmentos religiosos que adotam interpretação fundamentalista das Sagradas Escrituras.
Mas, voltando ao esforço do presidente Lula. Diz ele que não pretende incursão no campo das crenças e da fé. Cada qual com as suas, longe de serem utilizadas para o exercício de uma teocracia tupiniquim inimaginável. Ele sabe disso, e quer apenas atrair a massa evangélica para a base de apoio popular ao governo, principalmente agora, quando pesquisas realizadas para aferir a popularidade recomendam luz amarela. Para tanto, a receita presidencial acena com obras e serviços, além da promessa, ainda não detalhada, de melhoria dos índices de desenvolvimento social, de forma que esse bem estenda-se ao maior número possível de brasileiros crentes. Promete-se.
Tomando-se por base que a comunicação não está entre as prendas da equipe que o cerca, o primeiro detalhe a estudar e considerar é descobrir o discurso ideal para atingir o fim colimado. O que falar e como falar aos evangélicos?, já se sabendo ser perda de tempo esperar que a bancada deles no Congresso mobilize os templos e casas de oração. A bancada enfrenta problemas demais para sobreviver, constantemente na dependência de aportes, sem ânimo e tempo para cair em campo e levantar a bandeira do governo. Restaria ao presidente, como acaba de fazer em Pernambuco, mergulhar no Velho Testamento, cantar hosanas e glórias a Deus. Mas também aí os resultados poderão estar longe do desejável.
As assessorias que têm como atribuição abrir caminhos para o presidente prosperar, politicamente, usando bem a comunicação, e, assim, chegar aos grupos religiosos hostis, deviam perceber, também confessar, que o atual governo, desde a primeira hora, promove um combate feroz ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que, queiram ou não, é a referência política dos evangélicos. Quando Lula e o PT batem nele, as antipatias sobem nos púlpitos e vão aos altares. Se criticam, na maioria das vezes, com acidez, o antecessor, estão, por via indireta, contribuindo para blindar o bolsonarismo. A evidência está aí para ser avaliada. Eis o calcanhar de aquiles da questão.
Não há caso antecedente na República em que um ex-presidente, derrotado em eleição, tenha conquistado tamanho estrelato, por obra e graça dos próprios adversários. Por causa dessa estranha psicose, o governo e seu partido não deixam Bolsonaro descer do palanque, que reage aos ataques amparado pelas mesmas lideranças religiosas, que Lula quer atrair.
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