quinta-feira, 25 de agosto de 2011

O impacto da renúncia de Jânio


Mesmo acostumados aos solavancos e revezes de sua acidentada República, foi enorme o susto dos brasileiros na manhã de 25 de agosto de 1961. Era possível esperar tudo, menos a renúncia do presidente Jânio Quadros, que assumira há sete meses, e vinha se importando com coisas que o povo gostava de ver, como proibição de biquinis, rinhas de galo e o slack, horrível uniforme a que estavam sendo obrigados os funcionários de Brasília.
Manhã de festa militar do Dia do Soldado, Jânio se submete às honrar de estilo, e logo depois manda seu secretário Pedroso Horta levar ao Congresso a carta-renúncia. Quando, às 10h30m, o Noticiarista T-9 da Rádio Industrial soltou a bomba pelo alto-falante que dava para a Halfeld, a primeira reação de quem estava no que hoje é o Calçadão foi não acreditar. Mas logo acreditaria, quando policiais subiram as escadas que davam para a emissora, onde houve uma censura branca: o locutor, que hoje redige esta nota, pôde divulgar todos os “telegramas” das agências de notícias, desde que assumisse responsabilidade pessoal pelo que transmitia. Esse controle refletia o temor das forças de segurança quanto a uma impossível reação popular. Mas a cidade era apenas perplexidade, sem saber exatamente o que estava acontecendo.
A Rua Halfeld parada, algumas lojas ameaçando descer as portas, temendo tumulto. A União Democrática Nacional, que apoiava o presidente, pretendeu reunião extraordinária, sugestão de José Teixeira Brandão e Olinto Alvim, mas logo desistiu. Reunião para quê ? A mesma conclusão foi de outros partidos da base, como o PDC de Adhemar Andrade e o PL de Amauri Caldas. O PTB também se preservou, mas por outro motivo: chegaria ao poder, porque o vice que assumiria, João Goulart, era o chefe do partido. Ainda não se fazia ideia da reação contrária dos militares.
Diante da possibilidade do agravamento da crise, o que não aconteceu, mantiveram-se de prontidão a Quarta Região Militar e as Polícias Civil e Militar. Seu trabalho foi apenas a vigilância discreta dos “ agitadores” de sempre, jovens jornalistas sempre prontos a contestar, os comunistas de carteirinha e Níason Campos Mota, que criava colagens críticas e caricaturas de políticos para afixar nos postes da Rua Halfeld. E, ainda, a Ação Nacionalista, que se reunia na Galeria Azarias Vilela. Acaba que ninguém foi preso, ninguém morreu.

O que não é mais mistério


Meio século depois, a História já pôde remover algumas dúvidas em relação ao gesto de Jânio Quadros:

1 – Sua decisão, oito dias antes, de condecorar Che Guevara com a Ordem do Cruzeiro do Sul não significou adesão ao regime de Fidel Castro, com quem realmente não simpatizava. O que Jânio pretendeu foi abrir diálogo com Cuba para salvar opositores e liberdade para a Igreja Católica na Ilha.

2 - O que Jânio chamou de “as forças ocultas”, que teriam inviabilizado seu governo, eram, na verdade, pretexto para obter autorização do Congresso e governar com autonomia, tipo Mendes-France na França ou Gamal Nasser, do Egito, a quem admirava. Perto de morrer, ele confessou a um neto que esse foi realmente seu objetivo.

3 – O objetivo secreto da carta-renúncia do dia 25 era ser recusada pelo Congresso, que, então daria grandes poderes ao presidente para governar. Ele não contava com a esperteza do opositor José Maria Alkmin, ao recomendar que a renúncia não fosse objeto de discussão, por se tratar de um ato unilateral.

((publicado também na edição de hoje do TER NOTICIAS ))

Nenhum comentário:

Postar um comentário