quinta-feira, 31 de outubro de 2024

 


A pauta é política


O CICLO QUE SE FECHA

À medida em que se assentam os pós da eleição da prefeita, decidida em um único turno, o que rompeu a tradição, pois, aqui, só chegava ao Paço quem vencesse no segundo turno, é hora de começar a pensar no futuro, com base nas experiências. Os políticos, agora, sentem-se mais à vontade para medir os reflexos das urnas, seus números e as consequências, imediatas ou distantes.

1 - Um dado visível, que salta logo, é que a eleição deste ano testou e construiu um projeto político, liderado pelo deputado Noraldino Júnior, que levou seu PSB a ganhar a vice-prefeitura na chapa do PT, atropelando metade dos petistas, que repudiavam e contestavam, publicamente, a aliança. Em seguida, o partido elegeu o vereador mais votado da história municipal, que entrou em cena sem qualquer lastro político-partidário, sob o mérito de dar socorro aos cachorrinhos que caíram na orfandade. Noraldino ainda dá sinais de um diálogo proveitoso com o presidente da Câmara, José Márcio Garotinho, a ser reeleito. Piedosos, foram, juntos, a Aparecida agradecer.

2 - Todos negam, a começar pela prefeita, que essa aliança lhe custaria metade do mandato, destinando-se dois anos de poder ao vice Detoni, o que, em compensação, garantiria a ela o apoio do PSB mineiro para disputar cadeira no Senado, com força suficiente para se impor ao PT. Se a prefeita cumpre o que está solenemente prometido, isto é, permanecer nos quatro anos, também aí o projeto dos socialistas pode ganhar espaço na aliança, por carência de aliados. Quando chegar 2028 o PT teria de indicar um candidato. Quem? Hoje não há quem possa responder a essa pergunta. Havendo o vácuo, os socialistas já teriam duas alternativas, o vice e o próprio Noraldino.

3 - Outro dado para os próximos lances é que à prefeita Margarida, não podendo disputar um terceiro mandado, caberá fechar o ciclo das veteranas lideranças políticas da cidade. Basta conferir. Dois ex-prefeitos, Bejani e Tarcísio, despediram-se, sem poderem eleger os filhos, que disputavam, respectivamente, como vereador e prefeito. Custódio Mattos já havia se ausentado, também sem sucessor, e Bruno Siqueira garante que agora só tem ânimo para atividades empresariais. Fecha-se o ciclo veterano, com reflexos poderosos sobre seus partidos. O PSDB associou-se ao MDB, deu a candidata a vice, quase ausente, contribuiu modestamente. Ambos os partidos, de passados gloriosos, estão sem destino definido, sem chefes e sem votos. Além disso, derrotados, ambos devem sofrer futuros desembarques, sob o aceno de legendas mais promissoras.


FEDERAÇÃO PARTIDÁRIA

Após o primeiro turno, a crônica política começou a fazer análise sobre os resultados para prefeitura e Câmara Municipal. Nesta eleição 2024 as federações partidárias foram testadas pela primeira vez. Surgiram em 2022, com mandato de quatro anos.

A eleição de vereadores, com os dados consolidados dos milhares de municípios brasileiros, aponta que partidos hoje federados tiveram menos eleitos em 2024, em comparação com o que tiveram, em separado, em 2020. A exceção foi o PT. Em JF, os resultados são semelhantes ao panorama nacional.

A Federação PT, PC do B e PV ficou com 6 vereadores: o PT com uma cadeira a mais, elege Letícia Delgado, e reelege os três vereadores Cida Oliveira, Juraci Scheffer, Laiz Perrut. O PC do B conquistou uma cadeira, com a reeleição de Cido Reis, neo-comunista, que migrou para este partido. E o PV manteve uma cadeira, com a eleição de Negro Bússola, uma vez que Garotinho saiu para o PDT, deixando o partido, e se reelegeu.

A federação Rede-Psol tinha uma vereadora eleita no Psol, Tallia Sobral, que não se reelegeu. Mas a Rede conquistou uma vaga, com a reeleição de Maurício Delgado.

A federação PSDB-Cidadania tinha um vereador, Tiago Bonecão (Cidadania), que migrou para o PSD, onde se reelege.

Importante lembrar que houve aumento de quatro vagas na Câmara, o que pode ter corroborado para os resultados obtidos pelos partidos a partir de janeiro de 2025.

terça-feira, 29 de outubro de 2024

 


Olho no abstencionismo

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil ")) 

Interessante observar que, ao largo da campanha eleitoral, no seu derradeiro estágio, na cidade mais importante do país, o reconduzido prefeito de S.Paulo, Ricardo Nunes, cuidou de privilegiar um tema que, de ano para ano, vem recomendando cuidadosa reflexão. O abstencionismo. Dias antes, a presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, já qualificava o problema como preocupante; com razão, pois, feito o balanço do primeiro turno, constatou-se a não participação de 21,7%, apenas dois pontos abaixo dos números de 2020, quando, em plena epidemia, era aceitável a justificativa dos que temiam o contágio e a disseminação da peste. No domingo passado, conferidos os resultados em grandes cidades, o quadro não foi menos infeliz.

Ausência do cidadão na hora de decidir os destinos de sua comunidade, se em tempos de paz, é algo que faz mal à saúde da democracia, começando por gerar limitada autenticidade dos agentes escolhidos. Figura neste caso o que ocorreu, por exemplo, em Belo Horizonte, onde, somados à ausência os votos nulos e brancos, 42% da população apta a votar deixou de influir no destino das urnas. Nulos e brancos foram mais numerosos que a soma da performance dos nove vereadores mais votados.

Bom que as preocupações não se esgotem, quando não houver mais campanhas e votos a perseguir. Vale lembrar, porque temos o costume de esquecer logo os problemas que incomodam. Quanto ao caso em tela, é gravíssimo, embora possa parecer certo exagero nessa constatação. Um povo indiferente a um processo eleitoral é aquele que perdeu a esperança e o respeito por seus representantes. Tanto faz, como tanto fez. Não importa se o poder cair na mão de probos, corruptos ou incompetentes.

( Diante disto, nem pensar em avançar para o voto facultativo, não obrigatório, como em outros países. Seria o enterro de uma política indigente ).

Não há novidade alguma em afirmar que a primeira responsabilidade pesa sobre os partidos, bastando lembrar que, no dia 6 último, primeiro turno eleitoral, a legenda mais contemplada, o PSD, não foi além da preferência de 15% dos municípios. Um vexame, que se estende aos menos votados, os que agasalham governistas e oposicionistas. As instituições partidárias – todas, sem exceção - estão obrigadas ao exercício de piedosa autocrítica, sob pena de perder o que lhes resta de expressão. Têm de buscar a maneira de estimular o eleitorado, convocando-o à participação. E o primeiro a se fazer é corrigir erros e deficiências; facilmente perceptíveis, até porque a sociedade brasileira já os identificou e os denuncia com frequência. E protesta, com raiva, mandando as urnas às favas.

Uma cota, no painel das responsabilidades, cai sobre o Congresso Nacional. Já não se dirá em relação aos partidos, quase todos ali representados. O que precisa ser feito, deve ser feito com a necessária urgência, para o aperfeiçoamento do sistema eleitoral, de forma a preservá-lo de dúvidas quanto à legitimidade de seus mapas e relatórios. É muito fácil remeter as dúvidas a grupos descontentes com os resultados. Isso é insuficiente.

( Sobre as urnas eletrônicas, como a mulher de César, não basta serem virtuosas; é preciso parecer que sejam, com comprovação impressa ).

Devemos estudar bem o abstencionismo. Gianfranco Pasquino, que tem um ensaio sobre esse fenômeno, publicado pela Universidade Nacional de Brasília, mostra que o estudo a respeito não é obra custosa. “Pode-se dizer que os abstencionistas têm, do ponto de vista sociológico, características relativamente definidas”. Neste particular, as fortes diferenças programáticas até contribuem para diminuir o abstencionismo, um ótimo dado para que sobre ele estejam debruçados os artífices dos programas partidários, onde, em geral, promete-se o que não vai ser feito… Outra observação conclusiva de Pasquino, que se ajusta nesse monte de Ps que temos, mais de 30: “a explicação talvez mais convincente é que, onde os partidos estão mais organizados, capilarmente presentes e muito ativos, a taxa de abstencionismo mantém-se moderada”.

É ainda a esse autor que vou recorrer, para encerrar. As eleições, no Brasil, podem correr o risco de caírem num “abstencionismo crônico”.O que seria péssimo.

terça-feira, 22 de outubro de 2024

 



Pisando em ovos

(Wilson Cid, hoje no "Jornal do Brasil" ))

O presidente Lula está se vendo obrigado a pisar entre ovos nessa questão, cada vez mais delicada, que são as relações do governo com a Venezuela, e, em decorrência, a convivência com os países aos quais não agradam nossas simpatias com o regime de Maduro. Um quadro complicado, porque, se o presidente não tem como desembarcar de seus afetos com Caracas, agora, num ato descabido, é acusado de desempenhar papel de fantoche dos Estados Unidos. Nada mais improcedente. E, como nada é tão complicado que não possa complicar mais um pouco, veio essa nota oficial do PT, partido da base do governo, que, precipitando-se, anunciou reconhecimento da vitória eleitoral de Maduro, sem embargo de, nesse passo, os petistas estarem na contramão do mundo. Um novo complicador para Lula, sobre quem paira uma indagação: vai se curvar aos companheiros ou tentar demovê-los da aventura bolivariana? Ou, então, assumindo a prerrogativa de chefe, chamar o partido às falas, pela inoportunidade da manifestação, não por discordar dela, porque, no íntimo, Lula aprecia o colega vizinho, e, também nisto, batendo de frente com boa parte do mundo civilizado. É questão do fora de hora.
Há uma instigação paralela para mexer hoje com a criatividade presidencial, mesmo com a cabeça ferida, depois de acidente familiar. É o choque entre o partido do governo e a chancelaria. As luzes e os aromas que os petistas veem e aspiram na ditadura de Caracas não são os mesmos da percepção da diplomacia; e o Itamaraty tem responsabilidades nas relações externas, onde o clima é de preocupação ante a tardança de uma posição séria e clara sobre as coisas que acontecem na Venezuela. Como a base política do governo pensa diferentemente do que propõe a diplomacia, há aí um desencontro complicado. Quanto à demora por definições claras, o PT também intervém e critica a posição do Planalto, definido como uma casa confusa. E, de fato, costuma ser.

Prioridade relegada

Dentro de alguns dias começa a tomar forma o painel das possibilidades na disputa pela presidência da Câmara dos Deputados, o que parece, hoje, estar mais na dependência do êxito das articulações do grupo de Artur Lira, empenhado em manter o máximo possível de suas forças e prestígio. Na linha das dependências, também caberia medir o interesse do governo em interferir nesse delicado processo. Lula já prometeu equidistância na disputa, o que, certamente, não vai além de uma disposição pessoal, porque ao Executivo, como um todo, impessoal e coletivo, é sempre importante conversar e acertar planos com a mesa da Câmara.
Mas, o que tem chamado atenção no noticiário sobre o novo presidente, a se empossar em fevereiro, é que nada se fala sobre o que, com toda certeza, devia ser prioridade para quem assumir a importante função, além de ser o segundo sucessor a presidir o país, no caso de impedimento do chefe do governo. Essa prioridade, que tem tudo para superar quaisquer outras, é o imenso trabalho que se espera do Congresso para ajustar as relações entre os poderes, deterioradas, mais ainda, quando se trata de Legislativo e Judiciário. Há muito o que fazer nesse campo, embora na intensa campanha pelos votos de parlamentares o que mais se conversa são emendas orçamentárias, tê-las totalmente à mercê dos autores, o que tem resultado em desagrado para os ministros do Supremo. Antes disso e acima disso, as candidaturas à cadeira de Lira deviam mostrar o que podem fazer para o ajuste das relações entre os que legislam os que, na mais alta corte de Justiça, querem conter abusos nas emendas, recheadas com dinheiro do povo. Em tal episódio, cada parte tem um pouco de razão, não totalmente. Portanto, é preciso conversar.

terça-feira, 15 de outubro de 2024

 



Os partidos nas urnas

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Lições mescladas em advertências, insinuações e silenciosas ameaças é que não faltam no respaldo das urnas do dia 6, além de sua missão precípua de criar ou confirmar lideranças municipais. Comecemos por lembrar - já se dissera antes - que delas o governo precisa tirar inspiração para reorganizar as bases da ação política na segunda e derradeira metade de sua gestão; e este é, seguramente, o primeiro desdobramento a considerar. Não foi outra coisa que se extraiu do recente processo eleitoral, com a evidência de que o partido da base governista ficou em nono lugar na disputa das grandes e médias prefeituras. Com apenas duas dentre uma centena das mais importantes. O presidente Lula já havia sentido, e deve sentir agora, mais ainda, que correrá sério risco se continuar insistindo em destinar ao PT a principal alavanca de seus projetos. Os petistas ficaram com 248 prefeituras, enquanto a principal sigla adversária, o PL, abocanhou 509. É uma advertência séria para os planos palacianos de 2026, mesmo depois da confusão de que resultaram comentários ambíguos do presidente: primeiro foi à televisão para atribuir à eleição um teste de prestígio para o governo, mas mudou de ideia ao ser derrotado, minimizando a influência dos novos prefeitos. Passo seguinte, convocou os companheiros petistas a uma imediata autocrática, porque teimam em não se modernizar. Acrescente-se outra avaliação, de clareza imediata, quando se tem que o centro-direita elegeu mais prefeitos que as bandeiras de esquerda, sustentadas pelo PT, PSB e PDT.

Mas não ficam por aí, nem se resumem aos interesses do poder central, os números que vieram casados com os votos. Todas as lideranças políticas têm de pensar ou repensar seu papel frente ao desafio da sobrevivência; todas, mesmo as que saíram momentaneamente fortalecidas e prestigiadas do embate.

Tomemos, como dado de análise, a diversidade dos partidos, a necessária decantação de vários deles, uns dez, ou menos, com real capacidade de se manterem de pé. Para exemplo, num pedaço de contradições, cabe considerar que o PSD, líder do ranking de 2024, conquistou apenas 15% das 5.570 prefeituras. Se o maioral assim andou, intui-se que, entre os incapazes de respirar com forças próprias, o remédio poderá estar em novas federações partidárias ou fusões, porque sem os ajuntamentos já nem teriam como garantir desempenho acessório na próxima eleição presidencial. Tal observação parece claramente autorizada pelo perfil do eleitorado que temos à mão.

Outra coisa. Antes do banquete comemorativo, os partidos, em penitência, têm de reconhecer que estão entre os principais responsáveis pelo abstencionismo que acabamos de ver: 21.78% dos brasileiros viraram as costas para as urnas. Portanto, em 156 milhões de eleitores, 34 milhões preferiram não votar. É muito grave.

Em cada rodada eleitoral, não apenas a última, tão próxima e ainda longe de acomodar todos os atores, clama-se por uma reforma capaz de reduzir o número de partidos; reforma que tenha, como primeiro sinal de eficiência, a superação de muitos acordos inconvenientes, como alianças fajutas e circunstanciais, ou de propósitos inconfessáveis. Cinco ou seis, não mais que isso, bastariam para acolher todas as correntes do pensamento político, sem que, diminuídos, comprometessem o exercício democrático dos direitos políticos.

No dia 6, essa reforma se fez sentir, com os sinais de exaustão de várias siglas, que continuam incapazes de conquistar a confiança popular. Falta-lhes autenticidade programática, seriedade de propósitos e clara reação aos vícios e à corrupção, que insistem em não deixar o cenário.

terça-feira, 8 de outubro de 2024

 



Rumo ao segundo tempo

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Compreensível que o governo aguarde a análise da eleição do segundo turno, em alguns dos principais centros da política brasileira, para começar a pensar certos ajustes nos seus escalões, considerando-se que nem todos os partidos de sua base parlamentar saíram suficientemente fortalecidos no embate das urnas; pelo menos, com números robustos que justifiquem sua permanência em ministérios e outras altas posições do poder. Como também têm de ser avaliadas as influências na definição da presidência da Câmara. São componentes de um balanço que ajudarão a pesar a capacidade do Centrão de continuar em posição confortável para negociar o destino dos projetos do Executivo; ou, ainda, sem sair da avaliação do processo eleitoral, identificar onde se localizam os pontos frágeis da oposição. O mapeamento das forças políticas a serem reveladas neste outubro vai trazer, igualmente, o perfil do pensamento brasileiro sobre tendências ideológicas, algo excitante, depois que recente pesquisa da DataSenado indicou que quase metade do eleitorado não se dispõe a influenciar-se por correntes de esquerda, direita ou centro. Qual seria o tamanho desse desinteresse, de forma a orientar as rotas do governo?
É um ponto basilar de que não terá como escapar o gabinete do presidente Lula, quando ele se aproxima da segunda e última fase de sua gestão; o segundo tempo do jogo, ainda com enormes desafios pela frente. Até onde essas urnas darão a ele confiança para jogar mais à esquerda, ou, em situação diversa, continuar abrindo picadas nos terrenos mais conservadores?
Há outra questão essencial, onde o governo vem praticando cabeçadas. E, para sentir isso, nem necessário seria esperar e ouvir a voz das urnas. Trata-se da acidentada, às vezes pitoresca, incursão nas questões internacionais, em particular as conflituosas, o que vem contribuindo, sensivelmente, para ampliar o descrédito da diplomacia brasileira, em outros tempos celebrada pela capacidade de seus funcionários de encontrar soluções, contornar crises e jamais insuflar divergências entre os povos. Não precisamos esperar o resultado das eleições nos grandes centros para promover o reordenamento das invectivas que o presidente gosta de espalhar nas generosas viagens que promove pelo mundo. Um primeiro passo seria o reexame corajoso de certas condutas, que vão nos deixando de mal a pior, como a tentativa, já sem subterfúgios, de dar ao ditador da Venezuela tempo para sarar as feridas de uma reeleição viciosa. O Brasil vai engolindo a desculpa do aguardo de atas que inexistem ou se corromperam.
Graças à festiva palavrosidade presidencial, acabamos em umas ciladas que cabe considerar. A começar pelo fato – reconheçamos - de o Brasil ter sido maldosamente empurrado para se meter no conflito da Ucrânia. E o presidente piorou, quando sugeriu ao colega ucraniano tornar-se “esperto” na condescendência com o invasor russo. Se o estupro foi inevitável, relaxa e goza, teria, em outras palavras, reeditado a velha e malfeliz lição de sua ex-ministra Marta Suplicy… No Oriente Médio, o país se permitiu a um papel de visível simpatia aos terroristas, quando devia, simplesmente condenar as violências de todos, partam de onde partirem.
É urgente, com urna ou sem urna, repensar a política externa, já arranhada junto a alguns centros ocidentais influentes, depois que o governo consagrou o papel de tutor de ditadores, pecha que não cabe nas tradições do Itamaraty. Em nosso lugar, mais cuidadoso, embora também rompante, vai se impondo o argentino Xavier Millei, o que se sentiu, com facilidade, na comparação dos discursos das Nações Unidas. Estamos em situações delicadas em vários pontos da América, dado que, por si só, seria bastante para uma reflexão sobre nós e o continente.

segunda-feira, 7 de outubro de 2024

 

Eleição 2024 em pauta ( LXXXIII)


Última página


1 - A não realização do segundo turno para prefeito, o que rompeu com a tradição do eleitorado da cidade, é algo que a gratidão do PT deve, entre outros fatores, à deputada Ione Barbosa, que disputou pelo Avante, e ficou em terceiro lugar. Mesmo com todos os sinais de que vinha trilhando um caminho muito diferente daquele que, há quatro anos, quase a levou à disputa final, a expectativa era de que Ione teria votação muito mais expressiva; talvez pudesse ameaçar os 3% de Margarida, que colocou o PT acima da metade dos votos válidos.


2 - Certamente, grandes mudanças nunca foram da vocação do colégio eleitoral da cidade. A começar pelo fato de aos prefeitos, desde Tarcísio Delgado, sempre se confiou um segundo mandato. Tradição agora confirmada. Um detalhe que, espera-se, não se repita: o segundo mandato sempre foi inferior ao primeiro.


3 – Sobre essa vocação para o continuísmo, observe-se que 75% reelegeram-se para a Câmara Municipal e dois ex-vereadores foram reconduzidos. Não obstante, na eleição proporcional de domingo, 130 mil juiz-foranos abstiveram-se, votaram em branco ou anularam. O Legislativo precisa trabalhar a imagem.

4 – Aumentou, discretamente, a bancada feminina. Três novatas: Kátia Franco, do PSB, Letícia Delgado, do PT, e Roberta Lopes, do PL.


5 - Para os bolsonaristas, os números, se podiam ter sido melhores, deixaram visíveis sinais de que a direita prospera em Juiz de Fora. Colocou Charles Evangelista em segundo lugar entre seis candidatos a prefeito, além de eleger os três vereadores, que somaram 18.924 votos.


6 – É sabido que algumas candidaturas, tidas como inviáveis, serviriam, entretanto, de trampolim para se tentar, dentro de dois anos, uma cadeira na Câmara dos Deputados ou na Assembleia. Mas, para tanto, será preciso mostrar mais fôlego.


7 - Dos seis ex-prefeitos, apenas dois – Tarcísio Delgado e Alberto Bejani – participaram diretamente da campanha, tentando eleger os filhos, a prefeito e a vereador. Sem êxito.

Por fim,


8 - A campanha e a eleição passaram, sem que a maioria não percebesse um detalhe instigador: o papel do deputado Noraldino Júnior, presidente do PSB de Minas. Discreto, com raras aparições, palavras econômicas, ele desempenhou papel muito importante neste 2024. Primeiro, construiu uma difícil aliança com o PT, e, para tanto, teve de vencer a resistência de uma corrente expressiva dos petistas. Em seguida, patrocinou a candidatura de Marcelo Detoni a vice-prefeito de Margarida; e também aí foi outra luta feroz.

O PSB de Noraldino elegeu o mais votado entre os candidatos a vereador, Vitinho, com quase 15 mil votos; e, nas pegadas e sobras dele, mais dois se elegeram. Não é pouco, tratando-se de um partido de reduzida expressão na cidade. Os três novos vereadores, tal como o deputado, sempre trabalham a sensibilidade de uma população que se preocupa com a saúde e a vida dos animais. Kátia Franco dedica-se aos cães. João do Joaninho, o terceiro, já havia se tornado conhecido pela caça às capivaras…

O vice Detoni não deixa de ter ligação com a área animal, não propriamente pela proteção, mas o abate, como dono de frigorífico.



(( Depois de 83 edições semanais, dedicadas às eleições deste ano, a coluna encerra as atividades. Não sem, antes, registrar sua gratidão aos leitores que a acompanharam e aos que, direta ou indiretamente, colaboraram com informações e comentários )).




terça-feira, 1 de outubro de 2024

 


Sobre o segundo turno

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Leio que 130 entre os grandes e médios centros eleitorais do país estão inscritos para viver a experiência da segunda rodada na escolha dos prefeitos, desde que no dia 6 próximo um campeão de votos não consiga a consagração da maioria absoluta. Comparado com o pleito anterior, houve crescimento significativo desses municípios, que podem voltar às urnas por terem chegado a 200 mil eleitores. Neste ano, para a expectativa, além do crescimento do número de cidadãos aptos a votar, contribuiu uma campanha muito aquecida nas divergências entre lideranças, e a fragmentação dos partidos, incapazes de levar ao eleitorado propostas motivadoras, suficientes para consolidar candidaturas vencedoras em uma única votação, dispensando-se o eleitor a uma nova caminhada à urna. Parece façanha difícil para a grande maioria.
Seja como for, a instituição do segundo turno está entre as melhores realizações da legislação eleitoral. É com ele que se confere maioria entre os mais votados, ambos até então sem a maioria de votos. Trata-se do primeiro entre os instrumentos para a governabilidade. E é parte inarredável da democracia representativa, porque não exclui o eleitorado que, antes, optara por concorrentes de votação minoritária. Antes do tira-teima que se reedita no dia 27 o eleitor dos candidatos derrotados seria, com eles, excluído do processo. Relegados ficavam o candidato e seu eleitor. Na segunda chamada, ao contrário, democraticamente, todos são atores participantes.
É uma solução acolhida pela unanimidade dos estudiosos da política, a começar pelo fato de o sistema de duplo escrutínio ter a vantagem de abrigar uma necessidade psicológica das maiorias não bem sucedidas em eleições majoritárias. Já se disse que tem o mérito de desovar os protestos e encoraja a reflexão, como dizem os franceses, geralmente apontados como donos das primeiras experiências nesse campo. O que é válido, mesmo quando se lembra de recente exceção brasileira, quando raivas e ressentimentos instruíram a eleição decisiva da luta pela Presidência da República. Uma exceção a de 2022, que até hoje não permitiu a Lula e Bolsonaro descer do palanque em que ainda se engalfinham.
Ressalvadas as raridades, estamos diante de um caso em que as virtudes sempre sobrepairam nos eventuais defeitos. Nesse sentido, não haveria como discordar dos argumentos que, em defesa do segundo turno, levantava, neste JB, o notável Villas-Bôas Corrêa (1923-2016). Sem isso, “corremos o risco de eleger alguém com, digamos, 20% dos votos, o que é receita certa de crise, de turbulência, desestabilização do governo”. Evita-se, ainda, “a eleição de um candidato carregado numa onda emocional, na crista da vaga de popularidade súbita produzida pelo desempenho feliz num programa de rádio ou televisão”. Há que se registrar: a consolidação desse aperfeiçoamento na legislação ficou devendo muito ao jornalista.
Não se sabe, com garantia, em quantos dos municípios com mais de 200 mil eleitores os cidadãos terão de retornar ao voto no último domingo de outubro. Sejam quantos forem, estarão contribuindo para consolidar essa grande conquista da obra permanente do aperfeiçoamento da democracia representativa no Brasil.