Os partidos nas urnas
((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))
Lições mescladas em advertências, insinuações e silenciosas ameaças é que não faltam no respaldo das urnas do dia 6, além de sua missão precípua de criar ou confirmar lideranças municipais. Comecemos por lembrar - já se dissera antes - que delas o governo precisa tirar inspiração para reorganizar as bases da ação política na segunda e derradeira metade de sua gestão; e este é, seguramente, o primeiro desdobramento a considerar. Não foi outra coisa que se extraiu do recente processo eleitoral, com a evidência de que o partido da base governista ficou em nono lugar na disputa das grandes e médias prefeituras. Com apenas duas dentre uma centena das mais importantes. O presidente Lula já havia sentido, e deve sentir agora, mais ainda, que correrá sério risco se continuar insistindo em destinar ao PT a principal alavanca de seus projetos. Os petistas ficaram com 248 prefeituras, enquanto a principal sigla adversária, o PL, abocanhou 509. É uma advertência séria para os planos palacianos de 2026, mesmo depois da confusão de que resultaram comentários ambíguos do presidente: primeiro foi à televisão para atribuir à eleição um teste de prestígio para o governo, mas mudou de ideia ao ser derrotado, minimizando a influência dos novos prefeitos. Passo seguinte, convocou os companheiros petistas a uma imediata autocrática, porque teimam em não se modernizar. Acrescente-se outra avaliação, de clareza imediata, quando se tem que o centro-direita elegeu mais prefeitos que as bandeiras de esquerda, sustentadas pelo PT, PSB e PDT.
Mas não ficam por aí, nem se resumem aos interesses do poder central, os números que vieram casados com os votos. Todas as lideranças políticas têm de pensar ou repensar seu papel frente ao desafio da sobrevivência; todas, mesmo as que saíram momentaneamente fortalecidas e prestigiadas do embate.
Tomemos, como dado de análise, a diversidade dos partidos, a necessária decantação de vários deles, uns dez, ou menos, com real capacidade de se manterem de pé. Para exemplo, num pedaço de contradições, cabe considerar que o PSD, líder do ranking de 2024, conquistou apenas 15% das 5.570 prefeituras. Se o maioral assim andou, intui-se que, entre os incapazes de respirar com forças próprias, o remédio poderá estar em novas federações partidárias ou fusões, porque sem os ajuntamentos já nem teriam como garantir desempenho acessório na próxima eleição presidencial. Tal observação parece claramente autorizada pelo perfil do eleitorado que temos à mão.
Outra coisa. Antes do banquete comemorativo, os partidos, em penitência, têm de reconhecer que estão entre os principais responsáveis pelo abstencionismo que acabamos de ver: 21.78% dos brasileiros viraram as costas para as urnas. Portanto, em 156 milhões de eleitores, 34 milhões preferiram não votar. É muito grave.
Em cada rodada eleitoral, não apenas a última, tão próxima e ainda longe de acomodar todos os atores, clama-se por uma reforma capaz de reduzir o número de partidos; reforma que tenha, como primeiro sinal de eficiência, a superação de muitos acordos inconvenientes, como alianças fajutas e circunstanciais, ou de propósitos inconfessáveis. Cinco ou seis, não mais que isso, bastariam para acolher todas as correntes do pensamento político, sem que, diminuídos, comprometessem o exercício democrático dos direitos políticos.
No dia 6, essa reforma se fez sentir, com os sinais de exaustão de várias siglas, que continuam incapazes de conquistar a confiança popular. Falta-lhes autenticidade programática, seriedade de propósitos e clara reação aos vícios e à corrupção, que insistem em não deixar o cenário.
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