Os ausentes de maio

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

O presidente Lula estranhou a frieza da manifestação do Dia do Trabalho, em S.Paulo, decepcionando-se, com razão, porque o fracasso acabaria, como acabou, debitado à incapacidade de mobilização do governo e das federações sindicais, estas que dele sempre se aproveitaram. Mas, por extensão, além dos culpados de plantão, poderia ter deplorado, igualmente, a ausência dos partidos políticos, principalmente da base de apoio, ou, pelo menos, os que trazem, em suas siglas, expressões ligadas às causas do trabalhismo. É o mínimo que seria justo esperar. A queixa teria sentido se também contemplasse o PT, que é da copa e da cozinha do poder, mas revelou total desânimo para ajudar a festa a ganhar o brilho que, afinal, não aconteceu.
Serviu, portanto, aquela reduzida e pálida manifestação para colocar na berlinda os partidos, tenham ou não compromissos com o atual governo. Era a oportunidade para renovar velhas reivindicações. Contudo, descansados, pobres de ideias e de ações, eles preferem continuar mostrando a necessidade de mergulhar em reforma estruturante corajosa, tendo, como passo inicial, uma drástica redução das siglas, limitando-as a cinco ou seis, número suficiente para o acolhimento de todas as militâncias e suas propostas programáticas. Não há necessidade de tanta fartura para abrigar os diversos sentimentos políticos e ideológicos do país. Se o desejado enxugamento é desafio que ainda não ocupou as preocupações do presidente, a empobrecida plateia do dia Primeiro contribuiu para recomendar uma reflexão.

Hoje, os partidos não existem como condutores de ideias e propostas, e demonstram isso de maneira cristalina, toda vez que impõem o remédio amargo e pragmático das negociações que o governo tem de tomar, goela abaixo, em penitentes concessões ao Centrão, que se tornou espécie de partidão, sem outras obrigações, que não cobrar caro os votos de plenário. O Centrão atraiu e substituiu aquelas organizações políticas funcionais, criadas, fundidas ou extintas de acordo com interesses imediatos; e, por isso, nada tinham a ver com o dia festivo dos trabalhadores.

Como toque de ironia, cabe lembrar que, dos 29 que hoje estão inscritos no Tribunal Superior Eleitoral, cinco têm trabalhismo ou trabalhadores no nome. Coincidentemente, raríssimas são as vezes em que se preocupam com o destino do operariado brasileiro.

                                                        x  x  x                                                                                          . . .

A novidade mais recente é que, ampliando o clube dessas siglas, pretende-se, agora, exumar do passado o Partido Trabalhista Brasileiro, que a ditadura extinguiu pelo Ato Institucional 2, em 1965, mas logo depois recriado, para experimentar, sob a liderança da deputada Ivete Vargas, o papel de força auxiliar da direita. Não deu certo, e acabou morrendo de novo, em humilhante fusão. Pois está em curso o esforço para ressuscitá-lo, obra que tem sido atribuída a veteranos brizolistas. Dizem tratar-se do resgate da memória do ex-governador Leonel, mas, para o registro e a homenagem, ainda dependem da adesão de 591.148 integrantes dos colégios eleitorais, distribuídos pelas diferentes regiões do país, segundo determina legislação pertinente.
O Brasil não precisa de novos partidos, como tem sido demonstrado em inúmeras oportunidades nas experiências contemporâneas da política nacional. Mais ainda quando se sente certo apego a velhos modelos. O PTB, cuja glória maior prosperou com o getulismo, carrega o peso de três vertentes, nenhuma delas adequada para o presente momento da política brasileira; e para tal insuficiência precisam estar atentos os que hoje propugnam por sua volta ao cenário. A primeira foi a vertente do personalismo, para muitos chamada de caudilhesca, com Getúlio Vargas, João Goulart e Leonel Brizola. A segunda foi a vertente do socialismo de Alberto Paschoalini e Fernando Ferrari; e, como terceira, a do fisiologismo, que teve seu ponto alto no sindicalismo de Goulart. Pois, por onde desejar trilhar, o PTB renovado terá de submeter-se a uma vigorosa atualização. É uma exigência da história.