terça-feira, 25 de junho de 2024

 



Solidariedade e imprudência


((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil"))

O temor de que sejam ofendidos os sentimentos de solidariedade humana impede, nas relações internacionais, uma discussão mais objetiva, menos sentimental, do problema dos refugiados. O que, vale dizer, tem trazido repercussões e consequências imensas para os países acolhedores, sobretudo na Europa, onde a França, na concessão desordenada de refúgio aos estrangeiros, viu-se, em pouco tempo, habitada por multidões que chegaram, e continuam chegando, sem qualquer compromisso com os bens culturais e os hábitos locais. Hoje, os parisienses são obrigados a interromper o trânsito para que os muçulmanos façam suas cinco orações diárias, um direito que tem de ser respeitado, desde que, para tanto, a vida e as outras crenças não se prejudiquem. O continente europeu, de milenar vocação cristã, vê-se obrigado a remover a cruz da parede das escolas, porque isso não é do agrado dos estudantes maometanos.
No dia 20 passado, que a Organização das Nações Unidas dedicou às migrações fugitivas, o Papa Francisco voltou a pedir ampla abertura nos países livres para receber os que fogem da fome, das guerras, das perseguições políticas; mas podia ter usado seu prestígio para defender, na indispensável contrapartida, que os países hospitaleiros não sejam ofendidos em seus costumes. Os franceses, seus vizinhos, são a principal vítima da ausência de reciprocidades mínimas; e não há voz no mundo que saia em seu socorro, mesmo que sua maravilhosa cultura não pertença apenas a eles, mas à Humanidade inteira, por ser uma das maiores riquezas colhidas pelo engenho humano. O pontífice prestará bom serviço a uma causa justa se advertir sobre deveres mínimos que cabem às multidões recolhidas no mar, doentes, salvas horas antes de morrer de fome ou naufragadas. Talvez fizesse melhor ainda se voltasse seu apelo de fraternidade aos governantes das nações identificadas com o modo de viver dos que fogem.
Os árabes, por exemplo, certamente ficariam melhor convivendo com a raça árabe. Sempre foi objeto de estranheza o fato de esses refugiados não serem atraídos pelos países da mesma língua, dos mesmos hábitos, dos jeitos de viver semelhantes, se não mesmo idênticos. No contraste, constata-se que os maiores exportadores de desterrados da África, em sua quase totalidade muçulmanos, não mandam os povos insatisfeitos para países que rezam pelo mesmo deus. Preferem Alemanha, Bélgica e França, onde, exatamente por essa razão, nas últimas décadas aumentou em 300% o número de mesquitas. O Papa Francisco e outros líderes religiosos do Ocidente ainda não perguntaram ao rei da Arábia a razão de não podem instalar templos cristãos naquele país.
Esse lado da questão é, geralmente, esquecido ou, pior, maldosamente creditado a setores acusados de insensibilidade diante de um problema cuja gravidade, não há negar, está à vista de todos. Mas é a maneira simplista de desviar o tema da realidade. Observemos, por exemplo, um outro aspecto, relegado de tal forma, que sobre isso raramente se fala: as ditaduras, os governos intolerantes, que não gostam de ser contrariados, têm se beneficiado largamente com essas levas de desvalidos que saem em busca de outros lares. Tanto se beneficiam, que os ditadores não se incomodam, não procuram evitar as evasões, se para impedi-las ou controlá-las bastariam simples operações policiais nos portos e nas fronteiras. Mas não; deixam partir indesejáveis famintos e doentes. Longe os populachos, menos problemas internos para nove governos da África, quatro do Oriente Médio e três da Ásia, que são os maiores exportadores das misérias de que querem se livrar.
Para não sair de nossas fronteiras, temos o caso da Venezuela, em permanente crise de alimentos, remédios, empregos e energia. Ora, por que o presidente Maduro cuidaria de impedir que 37 mil venezuelanos cruzassem a fronteira com o Brasil? Exportou para Roraima uma aflição social que vinha batendo à porta de seu palácio. O pitoresco ditador fica devendo ao Brasil a gentileza de assumir um problema que ele próprio teria de resolver; ou apenas permitir que se agravasse, bem ao seu estilo.
É muito pouco tentar reduzir um gravíssimo desafio humanitário ao simples acolhimento de populações condenadas ao naufrágio. Solidariedade, de fato, é ir fundo no problema.

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