quinta-feira, 9 de junho de 2016






DOIS FOGOS


Sob um clima político em que disputam primazia as tensões provocadas pelos inquéritos e as expectativas geradas pela ânsia da retomada do desenvolvimento, o presidente Michel Temer situa-se em posição delicada. Ele tem de dar atenção aos setores produtivos, que pedem ações rápidas de uma gestão definitiva, e, ao mesmo tempo, tem de ouvir segmentos políticos que pedem paz nas relações institucionais, longe da Polícia Federal e da Justiça. Os partidos da base, que dão apoio parlamentar para a aprovação das medidas que seu governo julga mediatas e imediatas, acham que a caça aos corruptos, ainda que justificável, vem pecando nos atropelos, gerando intranquilidade e desânimo.

Entre dois, ou talvez mais fogos, Temer deve temer produzir desagrados incontornáveis, o que o submete ao exercício do contorcionismo a que temos assistido. No caso da Operação Lava Jato, para citar um exemplo, ele não pode ferir o desejo do grande público em ver condenações e prisões, mas sem desconhecer que vão se afastando dele os investigados e eventuais suspeitos. Um vácuo nas relações com o Congresso.

Quanto aos setores produtivos o detalhe importante é que as lideranças empresariais querem apressar medidas severas na área econômica que geram problemas nas relações do governo com a sociedade. É o caso da Previdência, que precisa ser reformulada, mas é inevitável que produzirá dores e descontentamentos.

Onde quer que pise, o presidente está enfrentando areia movediça. Herança que lhe deixou a antecessora, que com ele venceu a eleição com uma chapa construída em cima de confianças mútuas.



TEMPOS DE JÂNIO


Em suas memórias o ex-deputado mineiro e ex-ministro Paulo Pinheiro Chagas deixou o registro de dificuldades e consequências das primeiras semanas de um presidente da República. Trata do brevíssimo e conturbado governo Jânio Quadros em 1961. Só se falava em comissões de inquérito, prisões, sindicâncias, exclusão de servidores, a polícia atrás de muitos.

A preocupação de Chagas naquela época, recentemente eleito para integrar a bancada de Minas, era o risco da supremacia do poder policial sobre o poder político. E lamentou em discurso que a vida nacional ficasse reduzida aos aparatos policiais.  “Não se pode despir a vida pública brasileira daquele sentido ético que era outrora o seu pudor, reduzindo-a aos estreitos horizontes policiais dos inquéritos nem  mergulhar a Nação na delação erigida em sistema e a suspeita transformada em crime”.


O VELHO MONSTRO


Nos dias atuais, essa caça aos corruptos, absolutamente necessária e que já tardava, pode estar servindo também de trampolim político para futuros candidatos, e é preciso estar atento a isso. Sejam delegados, promotores, procuradores ou mesmo deputados e senadores desejosos de eliminar possíveis concorrentes em futuro próximo. Querem se aproveitar da onda moralizadora. Vejamos o caso recente do policial “Japonês”, que a televisão celebrou  como preênsil, e acaba de ser detido por causa de irregularidades no serviço.

Os cortesãos da popularidade bem cedo caem sob o cutelo. A popularidade é um monstro que não perdoa, ou aplaude ou devora.






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