terça-feira, 9 de julho de 2024

 



Palavras e promessas

(( Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Observa o presidente Lula que o discurso da campanha eleitoral deste ano haverá de se restringir a questões localizadas, do interesse imediato e direto das comunidades. É provável que tenha razão no que se refere, ao menos, aos pequenos municípios, porque, ali, o eleitor está frente a frente com o prefeito, que cuida do calçamento da rua, da água encanada, do posto de saúde, nomeia os amigos e demite os adversários. E conversam na farmácia e na festa de qualquer batizado.
Tal, contudo, certamente pode não valer para os grandes centros e metrópoles, onde se torna inevitável a abordagem dos temas nacionais, para tanto contribuindo o fato singular de os atores da grande disputa de 2022 ainda não terem desmontado seus palanques; pelo contrário, lulistas e bolsonaristas continuam sob relações ferocíssimas, que têm tudo para se projetarem na campanha que vai começar. Pessoalmente, presidente e ex-presidente têm se empenhado, com vigor, para manter vivos os embates nacionais, como se levassem em conta que, para seus projetos, ideal é que as próximas urnas se manifestem plebiscitariamente.
Sobre as pequenas cidades, além das observações já citadas, resta uma dúvida, considerando-se que têm prosperado dois temas polêmicos no país - aborto e descriminalização de drogas –, que são capazes de reunir, num púlpito comum, padres e pastores evangélicos. Se divergem em muitos pontos, não naquelas questões. Portanto, se quiserem, podem influir em comunidades do interior.
Sobre o discurso político. Para que o eleitor não se deixe enganar, conveniente é ter em mente que o pronunciamento de candidato sempre foi, e sempre será, uma proposta de ideal, do desejável. Muitas vezes o intangível, pouco a ver com o real. Ele fala em coisas com que sonha e com que sonham os eleitores. A propósito, cabe, por oportuno, uma palavra em defesa do presidente, sempre criticado nas redes sociais, porque, em campanha, propôs, para todos os brasileiros, “uma picanha passada na farinha, com uma cervejinha gelada no fim de semana”. Idiota foi quem acreditou nisso, porque Lula apenas prometia o ideal; e o ideal não tem compromisso íntimo com a realidade. Aqui e em qualquer lugar do mundo. De Gaulle, por exemplo, advertia que promessa de campanha só compromete a quem ouve.
De longa data, os candidatos sabem que o eleitor, principalmente o de limitadas instruções políticas, prefere ouvir só coisas agradáveis. Por que não pensar na picanha suculenta, em lugar das enchentes no Sul?. Demais, mensagens mais suaves têm a ver com esperança; a tal que é a última que morre. Por isso, ousar, numa campanha, abordar temas abomináveis é receita certa para perder votos.
Raríssimos os casos em que, na disputa pelo poder, alguém suba ao palanque para praticar um exercício de franqueza, como o caso citado pelo jornalista Sebastião Nery na sua Bahia. Coronel e vereador Nei Ferreira, candidato à reeleição em Vitória da Conquista:
“Eu sei que aqui tem 1.500 eleitores, que já prometeram votar em mim neste bairro. Mas, como eleitor é um animal muito safado, eu aceito a metade: 750 votos” …

Aos paulistas
O movimento Constitucionalista de 1932, cujo aniversário hoje se celebra, não teve o êxito esperado, mas deixou, como legado, o eterno ideal de uma Carta Magna séria e democrática, além da luta pelos direitos essenciais das unidades federativas. Exatamente o que todo o Brasil queria, mas sem a coragem dos paulistas, que foram às armas. A eles o país ficou devendo, igualmente, o reparo pela infâmia de terem sido acusados de levantar bandeira separatista, falso pretexto para abafar uma esperança nacional que prosperava; tanto prosperava, que Vargas confessou a Assis Chateaubriand a disposição de se suicidar, se a vitória da Revolução sorrisse para São Paulo. Essa mesma disposição sinistra ele repetiria para o general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, a quem chegou a mostrar o revólver com que cumpriria a ameaça do autoextermínio, cometido 22 anos depois.


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