ILUSTRES E POUCO CONHECIDOS
O Instituto Histórico, celebra
hoje o 166º aniversário da emancipação política de Juiz de Fora. O que inclui reverenciar a memória de juiz-foranos lustres e pouco conhecidos. Três
dos nossos historiadores, Paulino de Oliveira, Jair Lessa e Sinval Santiago
consideravam que Juiz de Fora faltou com a história e com a justiça por não
exaltarem convenientemente o Barão da Bertioga, pelo muito que fez aqui. Lindolfo
Gomes achava até que a cidade devia, por isso, chamar-se Bertioga, que não
apenas destinou sua imensa fortuna à Santa Casa como inscreveu seu nome em
notáveis realizações.
São muitos os ilustres não
suficientemente conhecidos e homenageados. Começamos por lembrar, pelo
oportuno, que neste fim de maio transcorreu o centenário de nascimento de
Jurandy Noronha, juiz-forano falecido no ano passado, e que se tornou pai da
história cinematográfica do Brasil. Produziu “No tempo da manivela”, com filmes
do período 1889-1930, e criou o Dicionário do Cinema Brasileiro. Ninguém
aqui ficou sabendo de sua morte, como não sabia de sua vida.
Ainda para falar apenas sobre
aqueles de que pouco ou nada a cidade sabe, é mister citar o maestro Francisco
Vale, que nasceu aqui em 1869. Por recomendação pessoal de Dom Pedro II
estudou em Paris, na École Cantorum, aluno do grande César Franck. Elogiado por
Massenet, ouviu do maestro Mancinelli este elogio: “Você está tomado pelo
espírito de Mozart”. Foi autor de fugas, sonatas e “Bailado na Roça”, sua obra
principal. Em 10 de outubro de 1906, depois de pronunciar conferência no Clube
Juiz de Fora, suicidou-se, confiando às águas do Paraibuna a vida, a depressão
e suas obras imortais.
Outro nome é Hélio Lobo, que
nasceu em Juiz de Fora 1883, bacharelando-se no Rio de Janeiro, chegando a
ocupar cadeira na Academia Brasileira de Letras, uma das três que couberam a
juiz-foranos. Nesta cidade escreveu seu primeiro livro, “Sabres e Togas”.
Integrou o Tribunal Arbitral Brasil-Peru antes de assumir várias missões
diplomáticas, algumas delas envolvendo questões sensíveis nas relações entre
povos. Para tais missões esteve na França, Estados Unidos, Holanda, Inglaterra,
Uruguai. Sobre esse juiz-forano disse Otávio Mangabeira: “Um dos melhores
homens que conheci em minha vida”.
Um detalhe que vale registrar:
servindo na Holanda em 1932, recusou-se a dar visto diplomático para o embarque
de armas e munições de que se valeria o governo Vargas para atacar os
constitucionalistas de São Paulo. Não aceitaria, disse ele, contribuir para a
morte de jovens idealistas.
Uma palavra sobre Frederico
Carlos Hohne, que eu diria ser o mais desconhecido entre os juiz-foranos
ilustres de todos os tempos. Viveu e sobreviveu indicado como um das personalidades
da América Latina mais respeitadas no campo da ciência natural. Nasceu aqui em
1882, na Colônia de São Pedro. Menino, já revelando pendores para o universo
das plantas, descia a rua Halfeld vendendo orquídeas, e por isso era por muitos
chamado “o alemãozinho das parasitas”. Depois de estudar no Granbery foi para o
Rio, onde começou chefiando os jardineiros da Quinta da Boa Vista. Cresceu,
mostrou grandes conhecimentos, e com o marechal Rondon embrenhou-se Mato Grosso
e Amazonas a dentro, como primeiro entre os naturalistas da expedição.
Nessas andanças perigosas recolheu para o Museu Nacional as amostras de mais de
duas mil plantas medicinais. Por indicação do Itamaraty, integrou a Expedição
Científica Roosevelt. Valendo-se de seus conhecimentos escreveu vários livros
sobre ciência natural e se tornou professor convidado de 10 academias dos
Estados Unidos e Europa. Em São Paulo, uma pesquisa de jornais o consagrou como
“a pessoa mais notável do Brasil” nos anos 20.
Inesquecível, nesta noite em que
reverenciamos juiz-foranos de prestígio internacional, mas nem por isso
suficientemente celebrados, é José Lemos Monteiro da Silva, que ficou
consagrado como pai da Infectologia na América Latina nos anos 30 e Mártir da
Ciência. Nasceu aqui em 1897 e morreu aos 42 anos, quando se deixou infectar no
Instituto Oswaldo Cruz, durante pesquisas finais com o Richettssia
Brasilieneses, para ampliar os conhecimentos sobre a picada de carrapatos. José
Lemos, mesmo tão prematuramente falecido, deixou estudos fundamentais para o
combate à febre amarela, o tifo e a varíola. Sobre essas enfermidades escreveu
cerca de 70 livros.
De prestígio internacional, este
agora contemporâneo de nosso dias, foi o padre Leopoldo Krieger, cujos
trabalhos no campo da citologia vegetal foram e ainda são citados em todo o
mundo. Doutor pela Universidade de Munsten, na Alemanha, foi aqui, na Academia
de Comércio, que se tornou pioneiro no emprego de microscópio eletrônico para o
estudo das células vegetais, utilizando-se de samambaias. Krieger levantou 25
mil espécies de plantas em Ibitipoca, o que significou o maior trabalho do
mundo nesse gênero em área restrita.
Por fim, e entre tantos, uma
reverência ao juiz-forano Domingos Vidal, nosso homem na Conjuração Mineira.
Nasceu em 1761 na fazenda do juiz de fora, formou-se em Medicina em
Montpelier, especializando-se depois em cirurgia em Bordeaux. Estando de volta,
ele se entusiasmou pelas ideias libertárias; essas mesmas ideias dos amigos de
Tiradentes que os ventos de Vila Rica vinham soprar nas margens do
Paraibuna. Degredado, foi morrer em Cabo Verde, na África, provavelmente de
febre tifóide. No Instituto Histórico de Juiz de Fora, em 1986, quando se
falava sobre o nome da cidade, houve quem sugerisse que ela se chamasse Domingos
Vidal.
Pode-se falar sobre outros
juiz-foranos nascidos ou aqui acolhidos, cujo prestígio e sabedoria avançaram
além dos limites do município. Como o jurista João Luiz Alves, da Academia
Brasileira de Letras; Rocha Lagoa, que chegou à fórmula para a produção do
leite em pó; Hermenegildo Villaça, patrono da cirurgia em Minas; Mauri Pinto de
Oliveira, que colocou sua sala de pesquisas na vanguarda da malacologia e da
vida dos moluscos; Franz Hochleitner, o austríaco que acaba de chegar aos 100
anos, e que fez de Juiz de Fora referência internacional na decifração dos
código dos maias e sua histórica Porta do Sol.
Como disse, inspirou esta breve
reflexão o desejo de reverenciar vultos que pontificaram no passado, foram
ilustríssimos nas atividades a que se dedicaram e levaram alto e longe o nome
da cidade em que nasceram ou que, vindos de outras terras, foram aqui
acolhidos, embora ainda a merecer as homenagens que lhes são devidas.
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