terça-feira, 26 de agosto de 2025

 



Desafios da COP30
((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil"))

Ideal seria contar com a participação pessoal do presidente dos Estados Unidos na Cop30, em novembro, no Pará, centro e coração da Amazônia dilacerada e incendiada, onde avulta um dos maiores desafios ambientais dos últimos tempos. Participação indispensável, não apenas por ser o primeiro representante de um país que detém imensa capacidade de gerar influências; mas, também, por governar um território que figura entre os maiores causadores de agressões ao clima, indesejável peso que até há pouco dividia com a China. Não mais agora, porque Pequim vai assumindo sua cota de responsabilidade, avançando significativamente para energias alternativas. O presidente Trump, convidado, recusou-se estar presente, o que não causou surpresa, porque não é de hoje sua convicção de que os caprichos naturais são excessivos e românticos, não podem impor limites à produção industrial, sendo ela poluente ou não. Para sua ausência certamente contribui o desejo de não prestigiar o colega brasileiro, anfitrião do encontro, com quem vem divergindo sobre assuntos gerais. Constatar essa ausência é pena, porque a adesão americana a uma questão de inegável prioridade para o bem geral, ajudaria o mundo a refletir, dando-lhe devida prioridade.

Sem o presidente e sem funcionários credenciados a assumir compromissos e novos passos rumo à política ambiental, lamenta-se também o fato de, logo agora, a paisagem da Amazônia e vizinhanças estar contemplada com o aparato bélico dos Estados Unidos, na caça ao venezuelano Maduro e aos narcotraficantes, que operam com desenvoltura na região. Criou-se um clima tenso, ao contrário do clima ameno para acolher a conferência.

Há outras preocupações que vêm se alinhando para desafiar amplo êxito da Conference of the Parties. Por exemplo, as delegações que cancelaram inscrição, por causa do assalto que os hotéis paraenses tentam praticar contra os visitantes, cobrando valores exagerados para hospedagem. Mas esta não é razão de se ausentarem de evento de tal magnitude.

( Tentando uma explicação para tal volúpia, parece que os hoteleiros de Belém deixaram-se contaminar pela história de nababescas viagens oficiais do Brasil. Seguem o mau exemplo, e ficam com uma cota das culpas que comprometerem a Cop30).
Sem exageros e lamúrias, nem excessivo pessimismo, digamos apenas que, além dos desafios que são inevitáveis quando se tenta promover encontro internacional de políticos, cientistas e estudiosos, interessados em salvar o clima do mundo, há que se observar, igualmente, como particularidade sentida, certo desânimo da parte de lideranças nacionais. A começar por alguns governadores. Os estados integrantes da Federação, independentemente do que vai chegar de outras partes do mundo, têm razões próprias e de sobra para contribuir com propostas objetivas, colhidas em experiências climáticas acumuladas. Se há uma preocupação quanto ao que podemos respirar, a reavaliação da qualidade dos recursos ambientais no Brasil tem muito que debater. E fazer. Vem logo à memória a necessidade de o Congresso sanear dezenas de velhos projetos ambientais dispensáveis, a fim de que todos os esforços se concentrem no fundamental e de rápida tramitação.

Não precisamos importar tragédias, porque já sofremos bastante com desastres locais, resultantes do clima desordenado. Que o digam os gaúchos, afogados em temporais, ou nordestinos assolados pelas secas.

Exatamente pela importância do evento de novembro sente-se que não são poucos os entraves destinados a esvaziá-lo. Porque falar em meio ambiente assusta as engrenagens econômicas, mais poderosas e influentes nos lugares de grandes produções. Mas certo que chegará o dia em que o mundo, para não morrer asfixiado, terá de avançar em novas políticas ambientais. A par disso, não será ousaria ou romantismo vulgar afirmar que os cuidados com o clima, por terem parte comum com todos os povos, são também o melhor caminho para se construir a paz universal. Não de imediato, mas o dia chegará. Sem dúvida

terça-feira, 19 de agosto de 2025

 


A corda vai esticando

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil"))

Se, com todas as evidências de deterioração, as relações Brasil-Estados Unidos caminham mal, o problema se acentua por causa dos limitados caminhos disponíveis para que os dois países retomem o diálogo. Caminhos que vão se estreitando, com a contribuição de setores políticos ou ideológicos, interessados no distanciamento. Em cada gesto, de onde quer que parta; as promessas de retaliação ao vento; as más-vontades recíprocas, tudo estreitando espaços para futuras negociações produtivas. O que, neste momento, faz supor que nunca preocupou tanto uma convivência de dois séculos, algumas vezes com acidentes superáveis, outras nem tanto, como a ostensiva contribuição de Washington para o golpe de 64, que machucou nossa democracia e deixou sequelas.
(As grandes crises entre países, mesmo distantes das armas, guardam uma semelhança estratégica com as guerras: elas eclodem por causa de detalhes, mas é sempre muito difícil sair delas. Como dar um capítulo final nessa batalha que travamos com Trump?)
A Casa Branca encontrou na perseguição do Judiciário ao ex-presidente Jair Bolsonaro o mote para as desavenças, ao mesmo tempo em que concede ao filho dele, Eduardo, o papel de embaixador com credencial unilateral, direito a tomar parte em reuniões e decisões de Washington. Influi no alvo americano de dupla face: esvaziar a autoridade do Supremo Tribunal e demolir o governo Lula, o que, hoje, parece ser uma questão de honra para o chefe dos americanos do norte. A propósito já é conhecida a faceta de sua personalidade, confessamente vingativo com os desafetos, entre os quais o colega brasileiro passou a ocupar lugar de destaque. Já não é pouco.
Estamos diante em um cenário que se agrava com o calor dos discursos.

2 - Nem precisaria do concurso de outros componentes que vão chegando, com tudo para aprofundar as feridas, os dois digladiam com palavras, e aprofundam o fosso, que já vai fundo.
Setores competentes e hábeis, no lugar deles, poderiam contribuir para o restabelecimento do ânimo de convivência, mas estão afastados. De fato, nesse episódio, profissionais da diplomacia e do diálogo foram removidos. Ninguém explica isso, convincentemente, se a hora é grave.
Washington e Brasília passaram a admitir que melhor é apostar na corda bem esticada. Nesse particular, não deixam dúvidas. Da parte ianque, o primeiro sinal, exatamente o mais delicado, foi conferir à sua embaixada em Brasília o nível de encarregada de negócios. Sinal claro de desapreço diplomático, agravado, concomitantemente, ao condenar a embaixadora brasileira a flanar nos corredores do Departamento de Estado. Diferentemente do deputado Eduardo Bolsonaro, que fala pela oposição brasileira, dispõe de trânsito livre e acessos credenciados, tratamento diferenciado, sem prévios agendamentos.

3 - Quais outros sinais seriam necessários?, depois de ser desenterrado o Mais Médico, aquela experiência maluca com Cuba, agora pretexto para impedir visto de viagem a familiares de ministro.
Em atitude recente, com caráter desafiador, já arranhando princípios básicos da cortesia diplomática, Washington celebrou, com o governo do Paraguai, um acordo de combate ao terrorismo do Hesbollah, na tríplice fronteira, sem a gentileza de um comunicado formal, tratando-se de um território onde o Brasil é parte, tem um pedaço. Mais ainda, porque esse convênio prevê a presença de representação militar estrangeira. A estranheza brasileira, claro, não significa negar um direito legítimo da política externa guarani.

Corda cada vez mais esticada. Quase num tempo único, o secretário Marco Rubio anunciava que as forças militares dos Estados Unidos estão autorizadas, na América Latina, a abater aviões colocados a serviço do narcotráfico, já denunciando Maduro como um dos chefes desse crime. Vale dizer que o avião dele é um dos objetivos. O presidente vizinho passou a ser procurado como bandido do velho Oeste, cabeça a prêmio, supervalorizada em U$ 50 milhões, o que a coloca em risco, porque milhares de venezuelanos gostariam de se tornar milionários, e depois saltar a fronteira do Brasil… Uma eventual perseguição aérea pode se estender sobre o nosso território, o que levaria a um incidente ou indesejável constrangimento.
Nada mais cristalino. Os Estados Unidos vão apertando o cerco sobre o canto sul da América, com inevitável risco para maiores tensões. O xerife dá sinais de que é capaz de jogar tudo nesse projeto. Lula, não é caçado, mas avisa que tem coragem para brigar. Coisa que diz ter trazido na mochila, quando foi exportado pelo Pernambuco…


segunda-feira, 18 de agosto de 2025

 

A Pauta é Política
18 agosto 2025

ZEMA EM CENA
O Novo sabe que ter o governador de um estado importante, como Minas Gerais, está longe de ser o suficiente, pois antes mesmo de se definir quanto à sucessão mineira e à Presidência da República, pretende cuidar, com muito interesse, da eleição de uma bancada expressiva para a Câmara dos Deputados. E aí quer destinar um papel importante ao governador, ao mesmo tempo em que ele procura situar-se no quadro político nacional, possivelmente como um nome para a vice numa chapa majoritária.
Interessante perceber que, antes mesmo de cuidar da sucessão de Lula, as atenções se voltam para o Congresso. Os bolsonalistas, por exemplo, não escondem seu fascínio por uma bela bancada de senadores.

ZEMA EM CENA (II)
Mas o governador aposta seu futuro político nas eleições de 2026 como candidato à Presidência da República. Em 2018 se apresentou como candidato a governador, e teve sucesso como outsider na política mineira, derrotando nomes e partidos consolidados no Estado.
Analistas políticos acham que nessa iniciativa eleitoral para presidente não terá êxito, pois os tempos são outros, e, embora bem avaliado no segundo colégio eleitoral brasileiro, faltam-lhe popularidade, prestígio e sorte para projeto de tal envergadura. Talvez lhe sobre um convite para vice.

SOCIALISMO
Quem ouviu o presidente Lula afirmar, num recente encontro partidário, que o melhor para o país é caminhar rumo ao socialismo, deve saber que também aí reside enorme dificuldade. Com que socialistas espera contar para a grande reviravolta? O partido que levanta essa bandeira, PSB, com raros idealistas sinceros, tem sua expressão maior no ministro Geraldo Alckmin. Mas não há alquimia capaz de transformá-lo em vigoroso defensor da quebra das estruturas capitalistas, nas quais, certamente, repousam suas convicções. Melhor seria o presidente não enveredar mais profundamente nesse propósito. Se não por outros motivos, para não acentuar as atuais divergências políticas, econômicas e ideológicas com o governo dos Estados Unidos e seus aliados, que não querem saber de socialismo; e geralmente declaram como adversários os que pensam diferentemente.

COMO SEMPRE
As pessoas que apreciam criticar a vereança, pelo que faz ou deixa de fazer, certamente ainda não travou conhecimento com os relatórios do fiscal municipal José Cândido, que em 1861 acusava os vereadores de passar por cima do Código de Posturas. Eram os primeiros a desrespeitá-lo. Desrespeitavam o que criavam…
Nessa época, vereador, além de nada ganhar, pagava multa de 4 mil réis por ausência não justificada nas reuniões.

SOBRE KASSAB
A capacidade de articulação de Gilberto Kassab, do PSD, é coisa que os políticos conhecem de sobra. Ligado, por razões diversas ao governo federal, transita com igual desenvoltura na oposição. Muito influente no governo paulista de Tarcísio Freitas, para quem trabalha, diz que seu partido só não disputa a sucessão de Lula com candidato próprio, em 2026, se Tarcísio for candidato.
Quanto a Minas, onde a política é sempre manhosa, ele afirma que a candidatura de Rodrigo
Pacheco é para ser considerada, mas não disse se tem disposição de apoiá-la.

EM COGITAÇÃO
O atual secretário de Meio Ambiente da prefeitura de Belo Horizonte, o juiz-forano João Paulo Mena Barreto de Castro Ferreira, figura entre os nomes cogitados para disputar uma cadeira na Assembleia Legislativa. Resultado do bom trabalho que realiza na capital mineira, depois de ter participado da diretoria da Cemig. João Paulo é filho do ex-deputado José de Castro Ferreira, que, nos anos 60, teve em Juiz de Fora seu principal reduto eleitoral.

SEM PACHECO
Os mais recentes acontecimentos em Brasília permitem admitir que Minas vai superando a possibilidade de ter o senador Rodrigo Pacheco como candidato a governador em 2026. Mesmo figurando, há meses, como favorito de Lula, o senador evoluiu como o nome mais cotado no Planalto para ir ao Supremo Tribunal, na vaga de Luiz Roberto Barroso, que decidiu antecipar aposentadoria. Sairia ainda neste ano. Com isso, os projetos lulistas dos mineiros deslocam-se para Alexandre Silveira, ministro das Minas.
Mas esse é um quadro que ainda depende de outros componentes.

A LICITAÇÃO
O jornal O Pharol aponta a contratação, pela prefeitura, do serviço de carro que circularia pelos bairros registrando imagens de obras necessárias, como algo irregular, por inexigibilidade de licitação. A administração municipal deve saber, pois tem assessoria técnica para instruir os atos da prefeita. Mas, a contratação direta de uma empresa, mesmo que com tecnologia de ponta, deve ter o cuidado de saber sua vida pregressa. No caso da citada, conforme a matéria aponta, ela já foi motivo de questionamento judicial do Ministério Público do Tocantins, com decisão favorável da Justiça daquele estado, em 2023, com suspensão de contrato com a prefeitura de Palmas.
Seria oportuno a Câmara se manifestar, pois tem competência e dever de fiscalizar.

PRIVILÉGIO

O deputado Aécio Neves levantou-se contra a proposta do fim do foro privilegiado para parlamentares, tema que ganhou dimensão quando ele presidiu a Câmara. Mas houve uma nova mudança de entendimento no STF. Em 11 de março último, a corte decidiu que as investigações iniciadas ali, e que tenham relação com o mandato ou a função do político, devem continuar sob sua análise, mesmo depois do fim do mandato.
A decisão recebeu críticas dos congressistas da oposição, uma vez que manteve os processos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Supremo.
No início deste mês, o debate ficou intensificado na Câmara, po

terça-feira, 12 de agosto de 2025

 



A ficção partidária

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil"))

Na mesma direção do que pensam pessoas responsáveis, o presidente Lula desencantou-se com os partidos, teoricamente definidos como organizações de representação política. Foi o que deixou claro em recente pronunciamento na capital peruana. Já não servem para nada. Uma queixa, apenas com roupagem de desabafo, porque ele não tem o que fazer para desanuviar esse cenário, que há muito passou a ser preocupação dos estudiosos da política, que sabem, ante numerosos exemplos, que as legendas acabaram reduzidas a grupos de interesses ou motivações nem sempre recomendáveis. Perderam o significado e o significante, abandonaram compromissos mínimos quanto ao conteúdo e à capacidade de levantar ideias e propor as coisas que a sociedade deles espera.

A decepção presidencial faz sentido, porque, logo após, ficou sabendo que algumas parcelas da base de apoio ao seu governo já avaliam o momento mais adequado, ou menos impróprio, para se despedirem da fidelidade. Outra coisa não foi o que se ouviu de expressões parlamentares do União Brasil, que tem participação expressiva no governo, detendo três ministérios. Se a questão limita-se a saber qual o momento propício para o desembarque, demonstrado fica que o apoio da bancada no Congresso, quando oferecido – nunca completo e incondicional – nada mais terá sido que uma adesão ocasional. E, se vai chegando a hora de o governo se testar, tentando a reeleição do presidente, todas as conversas e acordos anteriores vão para as calendas, mesmo que o noticiário dê conta de que a ideia do abandono não goza de unanimidade naquele e em outros grupos, animados com a busca de novos rumos.

Fica o presidente com dificuldade para recompor a base de apoio, pois quem permanecer e os que vão chegar têm a mesma voracidade. Nada mais almejam que não um poderoso escudo para enfrentar as urnas de 26. Também acenam com vida efêmera, venham de onde vier. Para Lula, chegada a campanha eleitoral, sua ou de outro candidato que o represente, as legendas podem condená-lo a esse problema, que já tirou o sono de muitos de seus antecessores, mas nenhum deles com envergadura para mudar o rumo dessa lamentável história de permuta de conveniências. Até mesmo no partido in pectore, PT, ele sabe que há colaboradores que se mantêm nos postos por amor orgânico e sobrevivência.

2 – Quem o ouviu afirmar, num recente encontro partidário, que o melhor para o país é caminhar rumo ao socialismo, deve saber que também aí reside enorme dificuldade. Com que socialistas Lula espera contar para a grande reviravolta? O partido que levanta essa bandeira, PSB, com raros idealistas sinceros, tem sua expressão maior no ministro Geraldo Alckmin. Mas não há alquimia capaz de transformá-lo em vigoroso defensor da quebra das estruturas capitalistas, nas quais, certamente, repousam suas convicções. Melhor seria o presidente não enveredar mais profundamente nesse propósito. Se não por outros motivos, para não acentuar as atuais divergências políticas, econômicas e ideológicas com o governo dos Estados Unidos e seus aliados, que não querem saber de socialismo; e geralmente declaram como adversários os que pensam diferentemente.

Na atualidade, os partidos são isso. Total inautenticidade, sem programas bem definidos. Os nomes que adotam, se tanto, apenas pretendem atrair simpatias populares.

3 - Nas eleições processadas a partir de 2022, vários deles se voltaram para a novidade das federações, que se inspirariam no desejo de fortalecer os programas. Uma balela, quando se sabe que o real objetivo era, e é, salvar da decapitação as legendas nanicas, esquálidas, oportunistas de época de eleição, quando alugam ou vendem seus preciosos segundos de propaganda na televisão.

Na semana passada, uma das sessões plenárias do Supremo Tribunal Federal cuidou dessas federações, as existentes e as que almejam organizar-se, todas já com apetite para bons acordos no ano eleitoral. Saíram abençoadas rumo à proliferação. Só não se deu por unanimidade, por causa do voto virtual discordante do ministro Toffoli. Todos ficaram devendo argumentos sólidos para que os brasileiros possam ver nessas federações um ânimo novo na estrutura partidária, cada vez mais repleta de defeitos e vícios, envelhecidos do berço do bipartidarismo, que já não funcionava a contento.

4 - Se o presidente tem dificuldades para se cercar de partidos que pensem no governo, antes de pensar apenas nos planos eleitorais, fato constatável é que não está sozinho ante tal desafio. Porque outras lideranças, governistas e oposicionistas, trabalham num campo de ficções. Os nossos dias comprovam que são uma ficção. Navegam com as velas pandas de interesses ocasionais ou circunstanciais. Nessa aventura, Lula não escapa de conviver com falsas alianças, porque, sabe muito bem, ruim com elas, pior sem elas.

sábado, 9 de agosto de 2025

 


A Pauta é Política

8 agosto 2025


RETROCESSO


Se voltar, agora, a discutir mudanças no código eleitoral, o Congresso devia conter alguns parlamentares, entusiasmados com o voto on-line, novidade para ser adotada proximamente. A pretensão de se dar um avanço no processo, com apoio de recurso da tecnologia, pode, na verdade, converter-se em retrocesso, grande perigo para a lisura dos pleitos seguintes. O desembargador mineiro Dorgal Borges de Andrada preocupa-se com a possibilidade de a votação ser feita pelo celular ou computador, longe da fiscalização dos partidos, distante da Justiça Eleitoral. Retrocesso, adverte Andrada, porque os cuidados com a legitimação do processo eleitoral começam por ser praticado em local público, em urnas sob custódia, longe de pressões.


Cabe lembrar: No passado da República, um expediente a facilitar a corrupção era exatamente o eleitor sair de casa com os votos prontos, envelopados sob as vistas dos chefes políticos. Era o chamado “voto marmita”. Já saía pronto. O voto on-line poderia servir para reeditar o crime.



MÃO E CONTRAMÃO


O veterano vereador Juraci Scheffer (PT) propõe moção de apoio ao ministro Alexandre de Moraes, hoje alvo principal da crítica dos defensores das liberdades e do direito de manifestação. Foi o que colocou o plenário da Câmara em clima de polarização, tendo em vista que a vereadora Roberta Lopes (PL) faz proposta contrária, isto é, moção de repúdio ao mesmo ministro do Supremo Tribunal. Caminham em direções totalmente diferentes.


Têm sido frequente os embates ideológicos entre petistas e bolsonaristas na Câmara Municipal. Cada segmento quer mostrar serviços aos seguidores. A pergunta que fica é a seguinte: O que JF ganha com isto?



O DE SEMPRE

Recebo cópia de um pronunciamento do deputado Amílcar Padovani, na Assembleia, 32 anos atrás, em que revelava sua preocupação com os rumos da violência em Juiz de Fora. “É preciso achar um caminho, fazer alguma coisa. O que não se pode mais é ficar de braços cruzados”, disse ele.


Outro dado, com rigorosa atualidade. Padovani reconhecia que uma parte considerável dos atos de violência procede das estruturas sociais. “Mas não tenho dúvida de que a tolerância com que se tem tratados os bandidos é que incentiva a criminalidade”.



TARIFAÇO DIVIDE


O tarifaço de Donald Trump gerou demandas para os políticos mineiros. O governador Zema, aliado do ex-presidente Bolsonaro, segue a diretriz de responsabilizar o governo Lula pelas sanções sofridas pela economia. O ministro Alexandre da Silveira, para defender o governo de que participa, precisa cooperar com empresários atingidos, sobretudo os ligados à sua pasta. Já o Senador Rodrigo Pacheco está mais do que demandado, pois é pré-candidato ao governo de Minas, aliado do governo Federal, e como ex-presidente do Senado (duas vezes), dele se espera cacife para resolver os problemas advindos das sanções.


DESPRESTÍGIO GERAL

Se a validade das pesquisas eleitorais é colocada sob reserva, quando ainda se tem pela frente um longo tempo para correrem muitas águas, o mesmo não se poderia dizer dessas que revelaram, nas últimas semanas, o desencanto em que se misturam, diante da opinião pública, os três poderes constituídos. Quando se fala nas maiores preocupações da população, constata-se que 50% dos consultados decepcionam-se com o desempenho do Legislativo, Executivo e Judiciário, colocados na mesma vala de desprestígio.


O detalhe, nada auspicioso, é o fato de, a um só tempo, os poderes caírem na desconfiança de metade da população, que, com razão, fica sem norte, sem saber a qual deles recorrer na tarefa de botar a casa em ordem.



EM FAMÍLIA


Como em política nada é impossível sabe-se, agora, que o deputado estadual Arlen Santiago (Avante), pretende, além de disputar novo mandato, que seria o oitavo, lançar também, em disputa de uma cadeira na Assembleia, sua filha, a pastora Laís Santiago. Na última eleição, ele teve 107 mil votos. A aritmética sugere que são votos suficientes para dividir com a filha. Mas não deixa de ser arriscado, e nenhum dos dois se eleger.






terça-feira, 5 de agosto de 2025

 


Brasil para principiantes


((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" )) 

O Brasil não é para principiantes, como se tem dito toda vez que esbarramos com complicadas questões internas e externas. Nas últimas semanas a advertência, meio jocosa, mas com alguma verdade, voltou a provocar os analistas, às voltas com o desafio de como haveremos de sair das dificuldades em que foram precipitadas as relações com os Estados Unidos, o que tem ensejado as mais variadas opiniões, nem todas com seriedade na avaliação dos reais interesses do país. Há dias que procuro ler e ouvir tudo a respeito. O que se escreve, o que se fala sobre questão tão momentosa.
Uma opinião a mais não vai fazer diferença.
O que parece melhor identificado com aqueles interesses, os de hoje e os que virão amanhã, é o governo e seus representantes autorizados não perderem a linha do diálogo, libertar-se da provocação das paixões. Conversar. Só desistir em casos extremos, como a ofensa aos princípios da autonomia nacional, problema que ainda vagueia numa infinidade de discursos.
O primeiro campo para o diálogo prosperar é a revisão do tarifaço com que nos ameaçou o governo americano. Como estava previsto, e aqui mesmo se comentou a respeito, em véspera de vigerem os pesados 50% sobre nossos produtos, Trump fez conosco o que costuma fazer nas incursões comerciais sobre outros países. Abriu exceção para alguns produtos, ao mesmo em que concedeu uma semana a mais para negociações. Pode ser que tenha escondidas reais intenções nesses gestos, mas não se pode negar alguma abertura para conversar sobre objetivos que não são apenas nossos, mas também dos importadores compatriotas de Trump, aqueles que precisam comprar o que temos para vender. Atingido esse estágio, nada mais improdutivo e irracional que pensar em retaliações e reciprocidades negativas, que devem ser guardadas para o momento em que, ante geral decepção, o entendimento não tenha como prevalecer.

2 – Se for possível chegar-se a bom termo no item das exportações, agora ante a justificável expectativa de que a lista dos produtos não sacrificados pode se ampliar consideravelmente, e que os onerados com os 50% iniciais caiam para uns 30% ou algo semelhante, resta o aspecto político para que, em futuro próximo, se dissipe o grande imbróglio de julho. Este há de ser o tema seguinte para que os porta-vozes dos dois governos se sentem à mesa. Será a fase mais delicada, porque, entrando na questão política, a Casa Branca continuará advogando o abrandamento das pressões sobre Jair Bolsonaro. No mínimo, deseja que, sendo alvo de suspeitas quanto à ordem e às instituições, ele seja julgado em primeira instância, como cabe a um ex-presidente da República, e como reclamam os juristas. Também desejam os americanos que o destino de Bolsonaro escape de sentença a ser prolatada pelo ministro Alexandre de Moraes, já eleito como persona non grata nos Estados Unidos.
Bem, este é o ponto mais sensível a ser tratado, pois é, em si mesmo, um poderoso impasse, principalmente depois que o governo Lula encampou, publicamente, a autonomia e intangibilidade do Supremo Tribunal. Já não tem como retroceder. Mas, se não houver disposição para o Executivo negociar o abrandamento, conseguindo os bons préstimos e a condescendência do Judiciário, em nome das relações com Washington, o presidente Trump vai se sentir mais à vontade para propagar, pelos quatro cantos do mundo, onde tiver aliados, que o Brasil sucumbiu, sufocado pela ditadura da toga. O que, aliás, ele e seus colaboradores já têm feito, embora com certo comedimento.
O caminho a seguir, menos pedregoso, é devolver a autonomia da diplomacia, hoje relegada pela política de gabinete. Eis o ponto capital. Começando por eliminar discursos façanhudos, impróprios para as negociações que tenham como meio e fim os interesses maiores do Brasil. Impõe-se convocar os diplomatas, que a atual crise condenou ao silêncio. Precisamos remover o modelo de pronunciamentos superados. Em se tratando de Washington, o governo tem se revelado analógico em tempo digital...

Outra prioridade

As prioridades da segunda quinzena de julho – primeiro, a batalha entre os poderes em nome do IOF, depois a guerra do tarifaço de Trump – forçaram o adiamento de temas que vinham pautado há meses. Caíram para o depois, dependendo de como as coisas vão andar em agosto, mês que costuma não se dar bem com a política. Entre as questões a serem necessariamente cuidadas neste segundo semestre figuram os retoques reclamados pelo código eleitoral; não sem tempo, porque o que se pretender modificar ou aperfeiçoar não pode ir além da primeira semana de outubro, de forma que se dê obediência a dispositivo legal. Se desejado para as eleições de 2026, o código tem de viger com um ano de antecedência.

Em particular, há que se garantir que o voto, por ser secreto, dê ao eleitor a certeza de estar protegido contra influências em sua decisão. O que faz oportuno desestimular setores de alguns partidos, entusiasmados com o voto on-line, novidade para ser adotada proximamente. A pretensão de se dar um avanço no processo, com apoio de recurso da tecnologia, pode, na verdade, converter-se em retrocesso, grande perigo para a lisura dos pleitos seguintes. Nesse sentido, acabo de ler um estudo do desembargador Dorgal Borges de Andrada, também preocupado com a possibilidade de a votação ser feita pelo celular ou computador, longe da fiscalização dos partidos, distante da Justiça Eleitoral.

Retrocesso, adverte Andrada, porque os cuidados com a legitimação do processo eleitoral começam por ser praticado em local público, em urnas sob custódia, longe de pressões.

( No passado da República, um expediente a facilitar a corrupção era exatamente o eleitor sair de casa com os votos prontos, envelopados sob as vistas dos chefes políticos. Era o chamado “voto marmita”. Já saía pronto. O voto on-line poderia servir para reeditar o crime).