terça-feira, 6 de setembro de 2022

 

É preciso ouvir o vice



((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" )) 


Já se demonstrou que os debates entre candidatos, independentemente de sua qualidade, e mesmo que pouco esclareçam, são apreciados por milhões de telespectadores, desejosos de conhecer o que pensam e o que querem, nem faltando um certo gosto pelos desaforos trocados entre adversários menos civilizados. É claro, como não podia deixar de ser, as atenções logo se concentram apenas em quem disputa a Presidência da República ou a governadoria dos Estados; mas as emissoras ampliariam sua contribuição se estendessem esses encontros aos candidatos a vice, que se lançam para entrar na história, e, por obra dos caprichos do destino, podem substituir o titular, o que se dá, na maioria das vezes, em momentos graves e delicados para as instituições. Os brasileiros precisam conhecer melhor essas pessoas que se habilitam para o eventual. Quem são elas?, afora serem resultado de acomodações de alianças, como a alquimia de Alkmin na vice do PT. No dia 29, pela primeira vez, vai se realizar um confronto entre eles. Que venham outros.

O vice é um plantonista, pronto a tomar as rédeas do poder, com aquela grave singularidade de assumir o Planalto nas horas críticas. Pois as campanhas, como esta dos nossos dias, desenvolvem-se sem que dele se ouça uma palavra, o que pensa e o que pretende fazer, além da expectativa de que pode chegar o momento de assumir. Em 85, Sarney não pensava que a morte impediria Tancredo de subir a rampa, mas dele herdou mandato de cinco anos, o que lhe vale recorde mundial, ainda não batido, na história dos vices.

É preciso ter em mente, sustentando a necessidade de o eleitor conhecer melhor o companheiro de chapa dos ”presidenciáveis”, que o Brasil tem uma particularidade a nos diferenciar de qualquer outro país: metade da história de nossa República traz a assinatura dos vices, desde a falta de compostura de um Floriano, até as divergências de Vargas com Café Filho, de Collor com Itamar Dilma com Michel Temer. Aliás, esses conflitos acabaram por desautorizar gente importante que, nos anos 60, trabalhou com afinco para que o candidato a presidente e seu companheiro figurassem juntos em uma única chapa. A intenção era evitar que eles brigassem antes, durante e depois…

Prioridade dos eleitos

A preocupação dos partidos em eleger, no dia 2 de outubro, bancadas expressivas para a Câmara Federal é paralela ao desejo de sair vitorioso seu candidato à Presidência da República. Sob certos aspectos, pode se dizer que em relação a bancadas poderosas o interesse até seria maior, porque em plenário o poder de voto e veto não apenas define o destino das leis, como também ganha competência para manietar o Executivo. No caso presente há evidências de que certas candidaturas majoritárias foram concebidas com a missão de catapultar os deputados, sem fugir da lembrança de que, nos primórdios da campanha de Lula, mesmo no seu partido havia quem tivesse como certo que ele seria instrumento para estimular uma robusta bancada de esquerda, capaz de tirar o sono de Bolsonaro, se ocorrer sua reeleição.

Facilmente se nota no cenário dos estados a ação de legendas que se rotulam de Centrão, empenhadas em mandar a Brasília, no primeiro dia de fevereiro, o maior número possível de parlamentares.

Não é fácil o presidente da República, seja ele quem for,  escapar das ciladas urdidas pelas correntes mais representativas que tomam assento na Câmara. E, quando decide resistir, corre o risco de ver o mandato instado a grandes dificuldades. Hoje senador, Fernando Collor sofreu as consequências na pele e nos ossos.

Participando do projeto de maioria parlamentar, sonhando com a conquista do mandato, futuros deputados talvez não percebam que vai cair na conta de suas responsabilidades – deles e dos senadores – restaurar a dignidade do Congresso Nacional e defender seus direitos e deveres, tomados pelo Supremo Tribunal Federal, onde os juízes, por ação ou omissão, avançam sobre as casas legislativas, ignorando que são estas, não outro poder, as representantes legítimas da sociedade. Longe de limitar seus afazeres a guardar e zelar pela Constituição, a corte maior da Justiça, a cada dia, confisca atribuições que cabem ao Legislativo e Executivo.

Os candidatos a deputado precisam atentar para isso. E, se eleitos, assumir corajosamente um dos deveres imediatos do mandato que lhes será confiado dentro de mais alguns dias. Fazer o Congresso levantar a cabeça e endireitar a espinha.

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