A Pauta é Política
Sobre Tarcísio
A importância de Tarcísio Delgado na história política de Juiz de Fora, morto na semana passada, não se restringe aos três mandatos como prefeito, que o colocaram à frente do município durante 14 anos, jornada de tanto tempo que, antes, só ocorrera no século 19, com o prefeito José Procópio Teixeira. Tarcísio também foi um marco na renovação de lideranças, como bem lembrou, durante o velório, o ex-prefeito Custódio Mattos, que, como Marcus Pestana e Margarida, começou na política pelas mãos dele.
Seus primeiros tempos na vida pública, meados da década 60, haviam sido resultado de muitas reuniões em que se discutia o futuro da cidade. Era no escritório de advocacia de seu mentor, José de Castro Ferreira, também frequentado por Roberto Medeiros, Ivo Jacques de Melo, Amílcar Padovani, entre outros. Uma sala do quarto andar do edifício Clube Juiz de Fora. Desse grupo, o primeiro a disputar a prefeitura foi Wandenkolk Moreira. Tarcísio era um dos nomes cogitados para a Câmara Municipal. Prevaleceu o dele, recém-saído da Faculdade de Direito, além de contar com testado prestígio em Torreões, de onde viera ainda adolescente. As previsões estavam corretas, pois foi o mais votado em 66. Desde então, sua carreira poder ser definida com um característico jeito de ser, segundo palavras de Ulysses Guimarães, com quem conviveu n Câmara: “franco, direto, objetivo, sem subterfúgios”.
Há muita coisa a recordar. Lembro-me do dia 30 de junho de 2015, quando ele e eu fomos convidados, pelo colégio Stela Matutina, a participar de um simpósio sobre Redemocratização. Tomei nota de sua intervenção: “um dos males da ditadura foi a fragilização dos partidos e o desprezo pelos políticos”. Depois, no mesmo encontro, deu testemunho das divergências pontuais de FHC com o ministro Murílio Hingel. O presidente pretendia um Plano Real sem compromissos imediatos com a Educação, e foi advertido que, se insistisse, o Congresso reagiria.
Neste breve registro cabe, ainda, uma sugestão. Trata-se da preservação do acervo da Casa de Memórias, onde ficou guardada farta documentação sobre essa vida quase nonagenária (faltaram poucos dias, porque aniversaria em 4 de outubro). A prefeitura podia ter um espaço adequado
para a guarda do material, destinado a futuras consultas. Há documentos importantes sobre a experiência que ele teve como vereador, presidente da Câmara, prefeito, deputado estadual e federal, diretor do antigo DNER no governo Fernando Henrique. Há, também, registros que falam de sua passagem por um dos momentos mais graves da política nacional, quando das tentativas de retomada da democracia, banida em 64. Como deputado, era integrante do grupo chamado Autêntico, que se jactava de não dar tréguas à ditadura.
Caso a prefeitura não assuma o acervo, hoje guardado num casarão amarelo do Granbery, a missão certamente caberia ao MDB, partido que ele ajudou a fundar em Juiz de Fora, e onde permaneceu por muito tempo.