terça-feira, 1 de dezembro de 2020

 


Os partidos estão exaustos


(( Wilson Cid hoje no ”Jornal do Brasil” ))


Sem a pressa e os atropelos sempre comuns, quando se fecham as urnas, melhor é aguardar a melhor interpretação dos cientistas políticos, de forma a termos avaliação objetiva do papel dos partidos que temos hoje, mesmo depois de a acuidade dos estudiosos ter conseguido arrancar, da recente eleição, suficientes dados e consequências, e esperar que tais organizações evoluam para servir à sociedade e à História. Mas talvez seja possível já admitir alguma coisa, antecipando certas conclusões, com base no que evidenciaram as tendências dos eleitores. Parece ter se manifestado claro, sem dúvida, que esgotaram-se em si mesmas, ainda que sobreviventes ou alcançando algum progresso do domingo eleitoral. Estão exaustas no exercício de antigos conflitos internos, sempre com indisposição para conferir vez e oportunidade a questões nacionais pendentes.


Ocupados com interesses imediatos ou envolvidos em disputas domésticas, os partidos têm preferido passar à margem dos graves impasses que rodeiam a sociedade; recusam-se a discuti-los, nem formular alternativas. Vão encolhendo em si mesmos, de ano para ano. Jejunos de ideais e desempenho programático, ao contrário, mostram-se, cada vez mais, entediados frente a questões essenciais. E, muitas vezes, ainda encontram tempo para divagar, superficialmente, em detalhes ideológicos, que não constituem prioridade na pauta dos atuais interesses da gestão municipal. Ainda agora, na segunda votação que se processou, muitos consumiram tempo para pedir aos eleitores (como se fosse algo de grave relevância) um posicionamento entre direita e esquerda; entre socialismo e capitalismo, mesmo sabendo que são opções que não podem resolver problemas momentâneos dos grandes centros urbanos; problemas que nunca deixam de acumular desafios.


Pois, esvaziados em sua essência, vários quiseram deturpar o verdadeiro e salutar objeto do segundo turno, a definição dos prefeitos onde estão os principais colégios eleitorais, e conferir maioria incontestável a quem vai assumir o executivo municipal. Ou trabalharam para que o pleito de domingo ficasse reduzido apenas a um papel plebiscitário. O veto no lugar do veto. Não propriamente votar a favor de alguém, mas contra um outro alguém. Eis outra peça da deturpação.


Certo conteúdo ideológico, reconheça-se, haverá de merecer espaço em eleições gerais, como a de 2022; não nas municipais, como vimos. Agora, a tarefa era cuidar de interesses administrativos das comunidades. Nada mais que isso, porque elas não podem, como nunca puderam, por si sós, alterar as estruturas políticas, econômicas e sociais de um país inteiro. Para missão tão gigantesca, não têm como pretender.


Alinham-se, aqui, nada mais que divagações. Será justo esperar, como se afirmou, a palavra dos cientistas políticos, porque, entre eles, temos vários e ilustres, que podem avaliar o futuro desses partidos, o que deles é justo e oportuno esperar, considerada a responsabilidade que têm na construção da democracia representativa.


Não parece haver dúvida, contudo, quanto a uma evidência que logo se revela mais clara aos especialistas, e para isso talvez até possam dispensar maiores aprofundamentos. Trata-se da certeza de que na proliferação indiscriminada, essas legendas, que pouco ou nada representam, em sua maioria não saberiam explicar a que vieram. Os nanicos invisíveis, ressurgem nas enxurradas de uma campanha eleitoral, para logo se hibernarem, esperando os bons tempos da eleição seguinte. Confundem os eleitores e, não raro, prestam-se a manobras ilícitas, negociam com os concorrentes poderosos a venda de seus minutos de propaganda gratuita. As inserções transformam-se em moeda de troca.


Outra coisa que os analistas não ignoram, mas confirmaram neste mês: entre os partidos que acabam de entrar e sair da disputa, nada menos de quinze nem lograram avançar além dos 2% dos votos nacionais. Algo ilustrativo para recomendar que se extingam ou, na tábua de salvação da sobrevivência, fundam-se.


Não é salutar para a democracia tolerar sobrevida a legendas formadas e enlatadas como presuntada, sem programas definidos, muito menos desejosos de dialogar com a sociedade.


A eleição, principalmente no torneio de domingo, serviu para confirmar o que se sabe, não é de hoje: o Brasil precisa mexer na ordem partidária, tão escassa de legitimidade, repleta de artificialidades, em muitos casos apenas a serviço de seus chefes, nos quais permanece encarnada a síndrome do coronelismo da Velha República.



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