quarta-feira, 30 de abril de 2025

 


A gente não desce do palanque

(Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" )

Coisa igual não é fácil encontrar em outros países, por mais fervorosos que encenem os embates políticos. Pois, aqui, quando estamos a 18 meses das eleições, e tantas coisas ainda faltando para acontecer, as candidaturas vão se precipitando, notadamente com os sonhos de postulantes à governadoria dos estados de maior expressão. Até o presidente Lula, que vinha se revelando comedido nesse campo, acaba de dizer-se viril e animado para enfrentar nova jornada. Três eleições já não lhe bastam.

Mas ainda não é chegada a hora de considerar pretensões pessoais. Valeria debater, desde já, sobre a desejada unificação das datas de eleições, tema de um sem-número de projetos guardados no Congresso Nacional. Entre deputados e senadores pode-se perceber o escasso ânimo para fazer a matéria avançar. Arriscando um dado, diria que em dez anos foram quase duas dezenas de inciativas frustradas, entre as mais recentes o projeto do então deputado Eduardo Azeredo, que pretendeu a unificação.

Às muitas razões para o enxugamento do calendário eleitoral soma-se a constatação de que o Brasil continua condenado a não descansar das campanhas, não tem direito de descer dos palanques eletrônicos, porque, quando se encerra um processo eleitoral, já se sabe que outro ocorrerá em dois anos. Desde então as atenções e os interesses convergem para a montagem de novos esquemas. Não é outra coisa o que se tem visto. A gente não desce dos palanques, e os prejuízos para o país são enormes.

(Há um argumento, fragilíssimo, insistentemente repetido pelos defensores da prática de eleições de dois em dois anos. Dizem que, sendo assim, o brasileiro exercita a democracia e permite o aperfeiçoamento do voto. Convém sair à procura de outra razão. A realidade mostra que, quanto mais vamos à urna, mais temos deteriorado a grandeza do voto. Veja-se o nível e a qualidade dos políticos eleitos, sem que para isso tenhamos de sair das divisas do Rio de Janeiro, onde os eleitos têm frequentado, alternadamente, palácios e prisões).

Sabemos que as consequências proporcionadas por tão curto tempo entre uma eleição e outra agravaram-se com um fenômeno ao mesmo tempo benéfico e nefasto. Trata-se das redes sociais, que, bem avaliadas, prestam grandes serviços, mas tornaram-se milhões de palanques eleitorais permanentemente montados. Não dão tréguas ao debate político, porque são multidões os debatedores que querem antecipar ideias e preferências.


2 - Essa nova dolorosa quadra de corrupção que grassa Brasil afora, como febre incontrolável, faz lembrar a veia irônica de Stanislaw Ponte Preta. Se é cada vez mais difícil a restauração da moralidade, então que nos locupletemos todos, como forma de democratizar os frutos do enriquecimento ilícito. Adquire-se o direito de roubar, se antes todos chegaram com o mesmo propósito criminoso. Generalizaram-se os assaltos, o que nos arrasta a um singular estado cleptocrático. Nada mais apropriado para a falência da sociedade.

Esse recente caso doloroso do INSS, onde foram desviados 6,3 bilhões de aposentados e pensionistas, em forma de descontos não autorizados, trouxe uma nova e cruel versão do lendário Robin Hood. Na Idade Média, ele roubava dos ricos para dar aos pobres. No Brasil, os donos da Previdência roubavam dos pobres para dar aos ricos…

Então, chegamos a outra realidade, totalmente sem graça. A quem recorrer para que se espere alguma justiça em meio ao caos febril? Em que portas vão bater os fracos e deserdados? O que se diz é que as esperanças deviam caminhar naturalmente para a Justiça, mas ela, desgastada, perdeu totalmente o ânimo para prestar socorro; e muita gente que opera em nome dela está comprometida.

Na verdade, olhando para esses tribunais, quem, com altivez e saem culpas, pode lançar a primeira pedra nos corruptos?

Se fosse possível tomar de Diógenes emprestada a velha lanterna com que procurava o homem honrado nas ruas de Atenas, com ela andaríamos hoje pela praça dos Três Poderes. Noite e dia.
Pobres Diógenes e brasileiros.

quinta-feira, 24 de abril de 2025

 


A Pauta é Política
25 abril 2025


EM MEMÓRIA

Diz o deputado Aécio Neves que o PSDB fecha o mês definindo sua fusão com Podemos, o que, no seu entendimento, é passo concreto para a rearrumação das forças políticas de centro e, com elas, entrar firme nas eleições de 2026. Pode parecer projeto ousado, mas é a primeira tentativa de instalar uma cunha na polarização, que vai se consolidando pelo caminhar das divergências entre lulistas e bolsonaristas.

Os tucanos têm, ao menos, uma história de três décadas de prestígio político em Juiz de Fora e, por duas vezes, comandaram a prefeitura, com as mãos de Custódio Mattos. Parte deles veio do velho MDB, enquanto outros, em menor número, optaram pelo PT. Fato é que os tucanos têm muito a contar sobre sua passagem e experiência pela política local, começando por tomar o depoimento do ex-prefeito. A hora é esta, antes que a fusão apague a memória.


NOVO TEMPO

O vereador Maurício Delgado (REDE) que andou desiludido com o mandato de vereador, quase não foi candidato à reeleição. Acabou convencido por seu grupo político a tentar mais um mandato à Câmara. Inviabilizada sua candidatura à prefeitura, quando o primo Júlio se lançou, tomou caminho livre para se tornar herdeiro da família Delgado. Campo aberto para novos projetos.

A possibilidade de ascensão da suplente Heloísa Helena (REDE) à Câmara Federal, caso seja cassado o mandato de Glauber Braga (PSOL-RJ), conforme parecer aprovado pelo Conselho de Ética, fortalece a posição político-partidária do vereador, porque desde 2022 os dois partidos formam federação partidária.

Se for candidato e se se eleger deputado, em 2026, a suplente Tallia Sobral (PSOL), que teve mais de 4.000 votos em 2024 reassumiria a cadeira na Câmara Municipal.


TANCREDO

Quatro décadas são tempo ideal para traçar o perfil de um político influente, como Tancredo Neves, morto em 1985. Época ideal, porque jazem as divergências e ressentimentos, e a própria história cuidou de exumar, de suas entranhas, outros velhos rancores, que hoje nada mais são que recordações só lembradas para retaliações. É preciso estudar mais a vida desse político habilíssimo, que construiu a transição da ditadura para a democracia, sem acidentes e incidentes.

Sem que esqueçamos o peculiar jeito de Tancredo na hora de lidar com situações confusas. Conta-se que seu raciocínio se aprofundava no momento em que economizava palavras, e passava a esfregar a gravada na ponta do nariz, mania que vinha dos tempos em que advogava no fórum de São João Del Rei.

UMA SUPOSIÇÃO

A prefeita Margarida tem intensa presença nas inaugurações e lançamento de planos relativos aos 100 dias do segundo governo, deixando os observadores imaginando que ela já tem projeto eleitoral em curso, como sua possível candidatura a cargo majoritário. Para reforçar especulação, a onipresença do vice Marcelo Detoni ao lado dela em todos atos públicos expressivos.


O CANDIDATO

Quem vive o drama de escolher candidato competitivo ao governo de Minas é o PT. A experiência desastrosa da gestão Fernando Pimentel (2015/2018) deixou sequelas no imaginário do funcionalismo público, prefeitos e fornecedores de bens e serviços do governo estadual. O governador Zema repetidamente, em seus discursos, relembra os exemplos de mal feito do governo petista. Em 2026 a cantilena de opositores voltará aos palanques antipetistas.

À direita do espectro político emergem nomes do senador Cleitinho (Republicanos) e do deputado federal Nikolas (PL). Ao centro, ventilados os nomes do senador Rodrigo Pacheco, do ministro Alexandre da Silveira e do ex-prefeito de BH Alexandre Kalil ( que foi candidato a governador em 2022). Na esquerda é lembrado o nome da petista Marília Campos, prefeita de Contagem, no quarto mandato.

Lula quer que o senador Rodrigo Pacheco (PSD)seja o candidato, com apoio do PT. Mas tem, como plano B, o ministro Alexandre da Silveira (PSD). Silveira conquistou a amizade de Lula, que demonstra publicamente apreço a esse político mineiro.

Parece que, em termos de partidos, o PSD deverá encabeçar a chapa de centro-esquerda em Minas, com Rodrigo Pacheco ou Alexandre da Silveira. Uma das vagas para o Senado deverá ser reservada para um candidato petista.

MUDANÇAS NO PSB

Na próxima quarta-feira, quando se instala o congresso mineiro do PSB, seu presidente, deputado Noraldino Jr, deve passar o comando estadual para Otacílio Neto, prefeito de Conceição do Mato Dentro. Não se pode garantir que Noraldino permanecerá por muito tempo no partido, mas optando por outra filiação, quando a “janela” partidária abrir espaço em 2026.

É preciso estar atento para as repercussões e consequências na cidade, onde o vice-prefeito Marcelo Detoni é historicamente ligado a Noraldino.

terça-feira, 22 de abril de 2025

 


As lições da travessia

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Ontem, quando se passaram 40 anos da morte de Tancredo de Almeida Neves, foram muitas as relembranças sobre sua intimidade com a história política do Brasil, onde figurou, simultaneamente, como agente privilegiado ou espectador nos momentos graves. De forma que, no curso de meio século acidentado, poucas águas correram neste país sem que por elas não tenha velejado. Fossem agora menos tensos os dias que correm, com vagar para avaliar e apreender lições passadas, talvez seriam mais profundos os estudos sobre esse mineiro ilustre, colecionador de mandatos parlamentares, que, desempenhados com sabedoria, haveriam de consagrá-lo como exímio articulador, dono de imensa competência para superar problemas e divergências no campo das instituições. E com o mínimo possível de incidentes, como se deu – muitos ainda recordam – na engenharia política que desenvolveu para a retomada da democracia, depois de vinte anos de ditadura, sem que para tanto fosse necessário o enfrentamento das armas, algo que a maioria dos povos não teria conseguido. Soube removeu velhos rancores, juntou os contrários para chegar ao propósito comum de 1985, fazendo que se sentassem à mesa, lado a lado, pacifistas, radicais de direita e de esquerda e líderes de segmentos sociais diversos. Fez-se a transição, sua maior obra, condenada a subiu a rampa do Planalto sem ele, que só a escalou deitado em silencioso féretro.

Resta algo a estudar na biografia tancrediana, certas sutilezas, como a contingência de abraçar publicamente a bandeira das Diretas Já, campanha que dominava totalmente a emoção das ruas, e, ao mesmo tempo, articular nos bastidores o colégio eleitoral, porque só ali teria como vencer Ulysses Guimarães, inconteste líder da oposição ao regime, pronto para ser presidente. Mais que isso, fez com que Ulysses cedesse ao bruxo indomável da hora, e advogasse a causa maior.

Assim, abriu-se caminho para a passagem, a páscoa da democracia. Travessia. Aquele colégio, formado por deputados, senadores e seis delegados de cada Assembleia Legislativa, foi palco e capítulo final de uma exuberante jornada de composições políticas, como nunca fora visto e nunca mais se viu, além de conversas tranquilizadoras junto aos gabinetes castrenses mais temerosos. Parecia que Tancredo não saíra das montanhas, mas da corte de um Luís XIV, como fidalgo com lenço de renda nos punhos… Irresistível.

Muito ainda precisamos saber sobre aquelas manobras, como também a custosa aritmética dos votos – 480 contra 180 – generosos mas suados na disputa com Paulo Maluf, seu adversário, além de ter superado a hostilidade do PT, que boicotou o colégio. Há, pois, nuances a pesquisar e registrar, além das que já guardamos na memória. Por falar nelas, conveniente também ouvir depoimento do jornalista Mauro Santayana, a quem coube a responsabilidade de escrever os discursos mais importantes que Tancredo pronunciou.

Quatro décadas são tempo ideal para traçar o perfil de um político influente. Jazem as divergências e ressentimentos, e a própria história cuidou de exumar, de suas entranhas, outros velhos rancores, que hoje nada mais são que recordações só lembradas para retaliações.

(Em tudo, o peculiar jeito de Tancredo na hora de lidar com situações confusas. Contava-se, em Minas, à sombra daquelas montanhas de ferro, que o raciocínio dele se aprofundava no momento em que economizava palavras, e passava a esfregar a gravada na ponta do nariz, mania que vinha dos tempos em que advogava no fórum de São João Del Rei. ).

Oportuno também seria considerar um detalhe que, lamentavelmente, tem passado à margem da pauta dos historiadores. É a presença dele como primeiro-ministro na brevíssima experiência do parlamentarismo mais ou menos híbrido de 1961. Não por ter assumido a missão de instalar o Gabinete, avesso a um sentimento francamente simpático ao presidencialismo, logo confirmado em plebiscito que não deixou dúvidas quanto à preferência popular. O que precisamos estudar, analisar com interesse, é que ele trabalhava para mostrar que João Goulart podia ter à mão os principais poderes como presidente, sem temer o parlamentarismo como garote ou feitor escravagista. Estava a caminho de convencê-lo. O presidente poderia governar sem temer o estorvo do primeiro-ministro, sendo Tancredo ou os que haveriam de sucedê-lo, Brochado da Rocha e Hermes Lima. Pode ser que alguém desconfie da importância desse detalhe, mas não se deve desconsiderar que, sobrevivente o parlamentarismo em paz, dificilmente teríamos a tragédia de 64. O Gabinete, bem ao estilo do parlamentar mineiro, tinha tudo para administrar dois fenômenos que foram decisivos para a ruptura da democracia naquele ano: os temores dos militares, inflados pelos Estados Unidos, que viam o comunismo prosperando; e, ao mesmo tempo, as reformas de base, propostas com atropelos e descuidos políticos, acossando e desafiando velhas estruturas da sociedade.

Estudemos mais o fenômeno Tancredo e as lições que deixou da transição para a democracia.


terça-feira, 15 de abril de 2025

 


Dois testes para a articulação

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Intensificam-se, nesta semana, dois exercícios para a articulação político-parlamentar do governo, e testar seu ânimo e capacidade de paciência frente a desafios importantes, ambos sem tempo para poderem ceder a novos adiamentos estratégicos. O primeiro é o trato a ser dado pelos governistas à campanha que vai empurrando o Congresso para o benefício da anistia aos que foram acusados de tramar golpe de estado em janeiro de 2023, com pedido de discussão e votação urgentes. O segundo desafio, não menos delicado, é fazer passar a PEC que reorganiza a política de segurança pública. Observadas as duas questões, cabe registrar que elas não vão apenas medir a capacidade de superar interesses conflitantes, que são muitos, mas também saber até onde vai o poder das pressões, que procedem de vertentes várias.

Sobre a capacidade de Lula pressionar, com base em ameaçadoras listas de deputados simpáticos à anistia, isso não funciona, porque o governo pode até castigar desobedientes e recalcitrantes, mas na hora de votar projetos polêmicos nas comissões e em plenário vai precisar deles. Governo que não goza da tranquilidade de maioria parlamentar não pode se dar ao luxo de ter o chicote à mão.

O caso da anistia, importante teste para os articuladores, colocou contra a parede o presidente da Câmara, Hugo Motta, tão recentemente eleito, e já condenado a produzir muitos desagrados, pautando ou não a delicada matéria. Seria antipático ao Palácio do Planalto, se ceder espaço ao projeto, tido e havido como inspiração da direita; o que de fato é, embora com todas as evidências de ter apoio de outros segmentos políticos. Hugo também será contestado, se fizer ouvidos de mercador, desconhecendo o clamor pelo perdão, desejado pelos oposicionistas.

É mais um problema que peca para ideologização, levantado tanto pela direita como pela esquerda, numa refrega em que nem é mais importante o destino dos acusados de preparar o golpe. Guerreando “comunistas” e “nazistas” de laboratório, fato é que a nação não pode continuar sob o clima tenso provocado pela insegurança de centenas de acusados, alguns culpados, outros nem tanto.

(A bandeira bolsonarista realmente apropriou-se da campanha, que, ao fim e ao cabo, quer mesmo é salvar a pele do ex-presidente tornado inelegível. Mas, fora isso, há outros mastros a sustentá-la, o que inclui até discretas figuras do próprio governo, que consideram rigoroso demais o tratamento dado aos depredadores de janeiro de 23, como também discordam da complacência do Supremo com certos militares envolvidos, ativos ou passivos, destacadamente o ex-vice-presidente e hoje senador Hamilton Mourão. Sente-se que, se pudesse escapar da fogueira inquisitória que arde em Brasília, bom para Lula seria aceitar que fossem pra casa os manifestantes de segundo e terceiro graus, num gesto de “piedosa tolerância”, condenando apenas quem oferece visibilidade, a começar por Bolsonaro. Mas nesse caso o presidente ficaria contra o seu PT, que está com sangue nas pupilas).

O que a inteligência recomenda a quem cabe dialogar em nome do governo é aceitar, sem alarde, sem festa, o esvaziamento do projeto de anistia, com imediata atenuação das penas aos menos culpados. Estaria mutilando a pretensão dos direitistas, que almejam aliviar a carga das culpas. Mas, ao dialogar, nos momentos mais vulneráveis, precisa ter cuidado, porque nem sempre os encarregados revelam bom desempenho, esbarram em detalhes e acabam tumultuando. Na semana passada, a voz principal da articulação, dona Gleisi Hoffmann, confundiu-se e complicou ao tentar desviar as pressões que chegam à mesa da Câmara. Retratou-se.

2 - A segunda questão, outra poderosa consumidora de salivas para quem vai falar em nome do governo, a PEC da Segurança Pública não precisaria de novas resistências para garantir difícil tramitação no Congresso. Olhando-se a Presidência da República, além de se tratar de matéria que conquistou espaço entre as questões básicas do terceiro mandato, tornou-se a proposta que diz respeito à permanência de Ricardo Lewandowski no ministério. Sendo o mais ardoroso defensor da novidade, estaria em situação delicada se o projeto afundar no mar das muitas resistências, entre as quais persiste o olhar desconfiado dos governadores, que enxergam um risco para a autonomia dos estados no campo da segurança. Lula teria como convencê-los? Há quem avança nos temores, preocupando mais a direita: a PEC seria passo seguro rumo ao modelo socialista do agrado dos governistas…As incursões contestatórias que tentam conter tão grave suspeita ainda não surtiram efeito. Já havíamos falado que estamos num tempo em que tudo acaba resvalando para a ideologia.

Na atual quadra, quando se trata de novo esforço para abrir espaço no Congresso, além de tentar remover temores que persistem na área da autonomia estadual, outro teste para os articuladores
do governo é convencer que já não presta para os nossos dias a Lei 13.675, que instituiu o Sistema Único de Segurança Pública sete anos atrás. Mas, sobretudo, convencer senadores e deputados que é preciso mexer na Constituição para se alcançar bom resultado na integração de inteligência entre todas as polícias e, com isso, chegar ao monitoramento das grandes quadrilhas, constatado que o crime organizado já não apenas opera, mas governa. Vê-se, não são poucos os desafios.

Há, entre os críticos, um argumento objetivo, que o governo não consegue derrubar: o que pode conter o crime é a gestão, sem necessidade de emendar o texto constitucional.

sexta-feira, 11 de abril de 2025

 

A Pauta é Política


11 de abril 2025


EIS UM JABUTI


Como é sabido, a Câmara Municipal aprovou a concessão de vale-alimentação de R$ 1.200,00 mensais para os vereadores, benefício concedido por meio da inclusão de um artigo em projeto de lei que alterava um anexo do plano de cargos, carreira e vencimentos dos servidores. A disponibilidade do vale-alimentação já entrou em vigência.

Por ter sido feito sorrateiramente, indica que sabiam da inoportuna dessa verba indenizatória, que é oferecida aos servidores que têm jornada de trabalho diário. Mas os vereadores têm seções a partir de 17 horas!, esperando-se que, como qualquer pessoa, vão ao trabalho já alimentados…

No jargão político, os vereadores colocaram um jabuti num projeto, em benefício próprio, e vai custar R$ 330 mil anuais aos contribuintes.

Esse vale-alimentação, fora de lugar e fora de hora, já foi tentado em outros lugares, sempre com resistência, quando submetidos à Justiça. Vale conferir ementas dos tribunais de Roraima, Rio Grande do Norte, e. mais recentemente em Pernambuco, onde a Câmara de Caruaru pretendeu apoderar-se de idêntica gentileza.


SEM SOLUÇÃO


A cidade tem algumas bombas-relógio para enfrentar, as soluções custam muito dinheiro e há dificuldades diversas, segundo o presidente da Câmara, José Márcio Garotinho, em palestra, na noite de terça-feira, no Instituto Santo Tomás de Aquino. Há tempos, dizia ele, quando se conversava com a população, as preocupações estavam centradas na saúde, educação e transportes. Hoje, com outras que entraram no cotidiano, está a população de rua. Sem solução, porque, se antes eram apenas os mendigos que a constituíam, agora predominam os dependentes de drogas, com todos os caminhos abertos para o crime. Têm um outro perfil. Não adianta buscar antigas soluções, o problema persiste, agrava-se e não sabemos como enfrentá-lo.


A segurança, constata o vereador, escapa do controle, porque o crime se organizou e, em Juiz de Fora, também age com as milícias, que lamentavelmente importamos do Rio. Há casos, com o bairro Santo Antônio, em que pessoas envolvidas em problemas da comunidade são instadas a discuti-los diretamente com representes do crime. Não há solução à vista. Em contrapartida, claros os sinais de agravamento.


Tenta-se buscar melhores condições para o Pronto Socorro, que hoje funciona em prédio inadequado. Talvez fosse melhor transferi-lo para o local do prometido Hospital Regional, que há anos está amarrado. Estado e prefeitura acusam-se mutuamente. E ninguém sabe dizer como se investiram ali R$ 150 milhões. O vereador acha que seria uma solução a pensar, mesmo com dificuldades. Pensou-se também em transferi-lo para o João Penido, mas fora de mão para os usuários.


Em torno de tudo isso, a cidade padece da ausência do Plano Diretor, que há sete anos adormece na prefeitura, à espera de uma revisão que alguns técnicos julgam necessária. Enquanto isso, a ameaça resultante dos adensamentos, e os desafios para os quatro itens do saneamento: esgoto, água potável, águas pluviais e coleta de lixo. Tome-se por base sete entre os maiores bairros da cidade: todos com a mesma estruturas há décadas, como Santa Luzia, que praticamente se afunda em tardes de temporal. Para o presidente da Câmara, a zona urbana tem de crescer, não há como evitar, mas sem amontoar as construções. O serviço do lixo ainda pode ser considerado o menos preocupante, principalmente porque vai se dar um passo para a coleta seletiva. O que seria muito bom.



ESPERANÇA


Numa campanha que pretende medir força com o governador Zema, de quem encontra-se distanciado, o presidente Lula desembarcou três vezes em Minas, no período de um mês, mais recentemente em Montes Claros, onde anunciou investimento de R$ 6,4 bilhões na Novo Nordisk na planta da cidade, para produzir medicamentos da linha Ozempic. Nessa fase generosa com o Estado, o PT de Juiz de Fora pode se sentir à vontade para reclamar atenções do presidente para empreendimentos no município, onde seu partido é majoritário.



EM CAMPANHA


Analistas de plantão lembram que os políticos já pensam na campanha da eleição geral de 2026. E é verdade. Mas vale perceber que o modelo de eleições de dois em dois anos faz com que, quando se encerra uma campanha, já no dia seguinte as atenções se voltam para o pleito seguinte. Não há intervalo.


Ainda sobre o presidente em Minas. Disse ele, em passado recente, que seu candidato a governador é o senador Rodrigo Pacheco (PSD), pois o PT não tem nome com capacidade eleitoral para tanto. Pacheco continua reticente. Pode ser por pura mineirice, mas pode ser também que o governo do Estado realmente não lhe interessa. Melhor seria uma toga no Supremo.



MUITAS TENSÕES


Na terça-feira, o Jornal do Brasil comentou, e reproduzo:


Todo dia o país anoitece e amanhece com diálogos exacerbados, desconfianças generalizadas, condenações precipitadas. E, em quase tudo, forte conteúdo ideológico, que tem servido para que esquerdistas definam como nazistas seus adversários, e os direitistas opondo-se aos que identificam como comunistas de ocasião. A esse figurino simplório, mais ativo nos últimos dois anos, alimentado por divergências crescentes, soma-se o duelo entre os grupos de Lula e Bolsonaro, o que até serve para manter os dois litigantes em destaque na mídia, mas acaba entorpecendo a nação, que se embebeda nos conflitos, vive em cabeçadas e escorregões. E o Brasil vai tropeçando. Parece claro que as questões entre o atual presidente e o ex agravam-se com o prestimoso auxílio de setores políticos que se beneficiam disso, nada preocupados em esfriar os ânimos, mas manter aceso o calor que sopra das velhas brasas eleitorais”.


SECRETÁRIA


A prefeita Margarida foi eleita, na segunda-feira, secretária-geral da Frente Nacional de Prefeitos, entidade que reúne dirigentes municipais de todo o país. Eleita durante a 87a Reunião Geral da FNP, na mesma chapa em que o prefeito do Rio, Eduardo Paes, assumia a presidência.


Na secretária-geral da Frente, ela assume função em nível nacional de um organismo que pretende influir nas políticas públicas que atendam os municípios. O federalismo brasileiro anda prejudicado pelo centralismo da União, por um lado, e, por outro, dependente de emendas parlamentares ao orçamento da União.



O NOVO


O partido NOVO ainda não conseguiu chegar à Câmara de Vereadores. Com representação constituída, há pelo menos dois pleitos municipais, nem atingiu o quociente eleitoral, mesmo tendo Romeu Zema governando Minas há seis anos.


Sua iniciativa de questionar, na Justiça, a redução da jornada dos servidores deve fazer parte da estratégia partidária de demonstrar oposição ao PT em todos os níveis.


Observador da política local comentou: "Margarida, se perder na justiça, ganha, pois, fica bem com os servidores e com os cofres públicos; se ganhar, ganha três vezes: fica bem com o pessoal da prefeitura, na justiça e na política. O Novo, se perder, perde de tudo que é jeito; se ganhar, perde política e eleitoralmente."







terça-feira, 8 de abril de 2025

 


Tensões que crescem

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Nem é necessário dizer que fatos e conjunturas vão se associando, muitas vezes entrelaçados, para elaborar a expectativa de que temos caminhado, a passos largos, para um ano eleitoral infestado de tensões, muitas das quais já visíveis no cotidiano. Por exemplo, fato mais recente, o debate que se trava em relação à anistia aos que tiveram participação, direta ou indireta, nos acontecimentos de janeiro de 23, é uma das sinalizações a preocupar, com agravante de ser conduto para acentuar desacordos entre Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional, que divergem quanto a alguns limites definidos pela Constituição, para não se falar na caça togada aos maus caminhos das emendas parlamentares. Também nesse particular ministros e deputados não se banham nas mesmas águas. Conflitam.

Todo dia o país anoitece e amanhece com diálogos exacerbados, desconfianças generalizadas, condenações precipitadas. E, em quase tudo, forte conteúdo ideológico, que tem servido para que esquerdistas definam como nazistas seus adversários, e os direitistas opondo-se aos que identificam como comunistas de ocasião. A esse figurino simplório, mais ativo nos últimos dois anos, alimentado por divergências crescentes, soma-se o duelo entre os grupos de Lula e Bolsonaro, o que até serve para manter os dois litigantes em destaque na mídia, mas acaba entorpecendo a nação, que se embebeda nos conflitos, vive em cabeçadas e escorregões. E o Brasil vai tropeçando. Parece claro que as questões entre o atual presidente e o ex agravam-se com o prestimoso auxílio de setores políticos que se beneficiam disso, nada preocupados em esfriar os ânimos, mas manter aceso o calor que sopra das velhas brasas eleitorais.

E a temperatura subindo, para infelicidade geral. Tudo se somando, por acréscimo, para pintar novas nuvens neste céu nublado que a gente está sentindo.

Não menos expressivo e instigante é o protagonismo político que o Supremo Tribunal Federal decidiu instalar entre suas responsabilidades constitucionais, além do pêndulo de suas nítidas simpatias em relação ao Executivo; e nisso às vezes até excede. Rigorosa, com razão, frente às malandragens acobertadas pelas emendas parlamentares, a mais alta corte finge não ver estrepolias de alguns de seus membros, como também prefere adotar olhares de paisagem quanto aos deslizes de ministérios e da Presidência da República. Seja como for, a toga tem algo a ver com essas tensões.

Vem, então, a indagação pertinente. Se a superação do atual estado de coisas fala diretamente aos interesse da nação, fazer o quê?

Pois, se cada qual tem sua parcela nas responsabilidades, parece lógico admitir que devem ser comuns e solidários os esforços para a superação desse mal; o mal das tensões crescentes. De fato, se não há como discordar que os conflitos procedem de terrenos vários, a pacificação haverá de ser obra de competência geral e irrestrita. Começando pelo Executivo, onde está o presidente, em quem o declínio de popularidade é mais que advertência, mas uma convocação a cuidar do que anda torto em seu governo. Tornou-se necessário que, além de promessas, ele explique, num jogo de puras verdades, porque não consegue a redução drástica nos gastos oficiais. E, tanto como na economia nos gastos, também precisa economizar nas palavras, que ele emprega sem temer repercussões. Microfones e câmeras de televisão, que ele não despreza, geralmente aquecem as crises.

( O velho deputado Elías Murad ( 1924-2013) preocupava-se com duas coisas: a escassez de medidas contra as drogas, e os excessos verbais dos políticos, sobretudo quando saíam da boca dos presidentes. Dizia que palavra de presidente só faz sentido quando segue o modelo da minissaia: suficientemente curta para manter o interesse, suficientemente longa para cobrir o assunto…)

Voltamos a outro polo, o Supremo Tribunal, que seguramente ajudaria, e muito, se promovesse filtragem no polêmico processo da tentativa de golpe de estado, onde faltaram tanques e soldados, mas sobraram mais de 1.500 depredadores das instalações do Congresso. Estamos diante de um processo político, e, como tal, deve ser tratado. Invertida a ordem das instâncias, abusado das medidas cautelares, limitado o direito de defesa dos acusados, que os depredadores, confirmada a culpa, sejam condenados pelo delito praticado, mas sob os critérios da dosimetria. O que pouparia a corte do desgaste de mandar pra casa uma costureira, depois de condená-la a 14 anos de prisão, cujo crime foi pichar o bem público, com batom, a arma de que dispunha na bolsa.

Nada mais propício ao clima de inquietações da atualidade que as baralhadas suspeitas que o ministro Alexandre impôs ao Supremo.

Por fim, traçado o roteiro das tensões, que prometem crescer na vizinhança da eleição, não se concebe atuação menos grave no poder Legislativo. Subjugado demais a interesses muitas vezes distantes das aspirações da população, avança com desenvoltura sobre fundos eleitorais, verbas e emendas parlamentares, que se tornam instrumento criminoso quando condenadas à missão de cabos eleitorais pelo interior. Se cede aos propósitos do governo, não o faz sem farta distribuição de favores. O Congresso tem sabido como exacerbar. A opinião pública não gosta, trata deputados e senadores como gente inútil e cara aos cofres. O descrédito também é parte do desassossego em que vivemos.

O quadro é preocupante, na medida em que não se dá conta de inciativas verdadeiramente empenhadas em pacificar o país, desejoso de sair desse enredo confuso, mas sem saber por onde começar, e sob que lideranças para acudi-lo.