terça-feira, 28 de outubro de 2025

 



Clamor contra emendas

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Ao avaliar o momento nacional e os muitos problemas nele vividos, veterano político adverte que, tirantes naturais antipatias em relação ao ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal, não seria possível negar-lhe adesão quando deixa claro que são fundadas as suspeitas de graves irregularidades no destino de emendas parlamentares, seja por se tornarem via expressa para a corrupção, seja por se prestarem a financiar coisas que nada têm a ver com reais interesses das comunidades; sobretudo naquelas onde falta tudo e sobram carências na saúde, educação e equipamentos urbanos. Sem discordância com o ministro, pois a coisa, de tão esticadas tolerâncias, acabou se tornando escândalo nacional. É preciso, pois, insistir em esclarecimentos sobre o objetivo fim das emendas, ainda que isso perturbe o sono de deputados e de seus projetos eleitorais. Como lembrou, recentemente, o ex-deputado mineiro Custódio Mattos, a prática das emendas vem permitindo algo semelhante ao coronelismo que prosperava no final do século 19 e primeiras décadas do século seguinte, com a diferença de que, se antes, as verbas corriam dos chefes políticos para os coronéis e fazendeiros donos dos currais de votos, agora elas vão para os prefeitos. Muitos ex-deputados dizem o mesmo, por ouvirem dizer ou por experiência própria.

(Matéria deste jornal, dias passados, juntou-se a várias outras que advertem sobre o desvirtuamento de finalidades. É o caso em que o dinheiro, tão logo colocado à disposição dos prefeitos, para nada mais ter servido além de patrocinar milionários shows sertanejos, quase todos de discutível valor cultural. Cabendo lembrar, sem risco de equívoco, que as prefeituras que se dispõem a isso são exatamente as que mais têm a fazer no campo dos serviços essenciais. E não fazem).

Para o desencanto geral, observe-se que um basta à orgia não se pode esperar que saia do ministro, nem do seu tribunal; muito menos da Presidência da República, que faz dessas emendas convincente moeda de troca de apoio parlamentar. O que pode conter o progressivo escândalo, em cada orçamento da União engordado com milhões e milhões de reais, não é outra coisa se não o clamor das ruas e das praças, como se deu, há pouco, com a PEC da blindagem, que pretendeu oferecer aos deputados escudo impermeável que lhes permitisse salvo-conduto para impunidades. Perplexa, a opinião pública fez chegar aos senadores que o arquivamento da matéria era questão de honradez. Pois não seria exagero afirmar que, em matéria de afronta à nação, essas emendas, do jeito como são distribuídas e consumidas, pouco diferenciam daquela malfadada PEC, que os senadores sepultaram. Uma nova reação popular faz sentido.

Mas o mal tem mais tentáculos, gera outros prejuízos para a ordem política. As emendas afetam mortalmente a desejada renovação da Câmara, porque jogam o poder do dinheiro e do convencimento para a reeleição dos doadores. Os candidatos de primeira campanha caem pobres e derrotados. O presidente Lula dá testemunho, quando se queixa da modesta qualidade da Câmara. Dizia que, sem o forro das emendas, a reeleição do deputado é uma jornada árdua, pior ainda para os candidatos de primeira viagem. Ele bem sabe disso, porque é o dono do cofre.

quinta-feira, 23 de outubro de 2025

 


A Pauta é Política

24 outubro 2025


FALTA ALINHAR


O presidente Lula chamou a esquerda às falas, cobrando ânimo para uma participação mais produtiva no quadro político nacional, depois de queixar-se de uma situação que lhe parece grave: ”nós nos distanciamos do povo”. Na verdade, o que ele sente é uma realidade que pode levar prejuízos para a campanha eleitoral do PT, isto é, as divergências internas.

Se o presidente cobra alinhamento das lideranças da esquerda e da militância, situação semelhante viveria a direita, onde a ala mais forte não perde de vista a liderança de Bolsonaro, que deve ser mantida e preservada a qualquer custo, embora para outros, é preciso jogar com a realidade: o ex-presidente está fora do jogo, por conta de condenação e prisão, acusado de tentativa de golpe de estado. Os direitistas têm mais um problema para resolver: sabem que a melhor chance de retomar a Presidência da República está diretamente vinculada à candidatura de Tarcísio Freitas, que, contudo, insiste em manter o projeto de um segundo mandato como governador de São Paulo.

A menos de um ano da eleição, todos precisam alinhar os projetos.


PONTO DE PARTIDA


É da tradição da política mineira: quando se trata de pensar em eleição, o primeiro passo há de ser o posicionamento do governo estadual; do governador, pessoalmente. Entendem alguns observadores que, na semana passada, aconteceu esse primeiro passo, quando o virtual candidato governista, o vice Mateus Simões, decidiu filiar-se ao PSD, o que acontecerá oficialmente neste fim de semana. Fica, portanto, definida a posição do governador Romeu Zema, o mais forte e influente eleitor do Estado, como também sente-se estar decretada morte do Novo, que sobrevive na sombra de Zema. Minas é o único estado em que o partido comanda o Executivo.

O PSD vinha cozinhando a candidatura de Rodrigo Pacheco, estimulado pelo desejo do presidente de fazê-lo candidato.

Outra peça, entre as muitas que se seguem ao posicionamento do governo estadual, é o PDT, que nunca teve força própria para aspirar ao Palácio da Liberdade, está filiando o ex-prefeito de BH Alexandre Kalil. Quer entrar na disputa mineira.



ALGO IMPOSSÍVEL


O jovem deputado estadual Tadeu Leite, presidente da Assembleia, não pode ser ingênuo, pois descende de político experiente do qual herdou o nome. E, se chegou à presidência da Casa, é porque possui capacidade de articulação política. Pois, ao defender a privatização da Copasa, prometendo tarifa justa e serviço de qualidade para todos os municípios, ele faz discurso inconsistente. A empresa privada trabalha com a lógica do lucro, e não fará serviços que tragam prejuízos. Não existe lei que obrigue o setor privado a realizar um serviço deficitário. Muitas experiências de privatização demonstram que, quando percebem que fizeram negócio ruim, os empresários devolvem o serviço. Como exemplo de insucessos, basta lembrar as concessões de rodovias e aeroportos. E as reclamações de usuários de serviços ruins de água, saneamento básico e energia elétrica em São Paulo. Por fim, nada assegura que um empresário vai realizar determinado serviço que dá prejuízo. Quando isto acontece ele rompe o contrato e devolve o serviço para o setor público.



FALA JF


Até a próxima quarta-feira a Câmara Municipal realiza o projeto Fala JF. Pretende, com isso, consultar a população quanto ao futuro da cidade, opinando sobre prioridades, o que será importante na elaboração do Plano Plurianual 2026-2029 e a Lei Orçamentária Anual 2026. Entrevistadores vão visitar as diversas regiões da cidade e a zona rural.

É oportuna a iniciativa, pois contribui para atualizar demandas da cidade que precisam ser implementadas. Os recursos orçamentários são escassos, mas, interagindo com aqueles que precisam do serviço público, boas iniciativas podem surgir.


quarta-feira, 22 de outubro de 2025

 Tempo frio na Malásia

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))
Até que ponto, pergunta-se, as boas relações entre a Casa Branca e o presidente brasileiro ajudariam a robustecer o discurso de Lula, como candidato a um novo mandato? Ajudariam em nada, mas com certeza complicariam sua imagem junto às esquerdas, que aqui, mais que em qualquer outro lugar, contestam tudo que Trump fala e faz. O que permite supor, na avaliação pragmática de quem vai correr atrás de votos, que melhor para a campanha é manter as distâncias em nome de patriótica autonomia; e o anunciado encontro na exótica Malásia ficaria por conta de protocolos, formalidades e suaves tapinhas nas costas. Na essência, poucos proveitos.

Candidato estimulado pelas pesquisas, que o têm na conta de competitivo, o que Lula deseja e precisa é consolidar as forças que define como progressistas e antiamericanistas, objetivo que se torna mais evidente, quando o quadro eleitoral vem se construindo em bases cada vez mais intolerantes e radicalizadas. Se a candidatura dependesse da direita, e dela está longe, os afagos de Trump teriam grande utilidade. Mas não é o caso.

Uma certa dúvida quanto à badalada “química” bilateral e as reais expectativas desse próximo encontro justifica-se no desinteresse de Brasília em aplainar os caminhos ideológicos que levam a Washington, o que seria útil para ampliar espaço a um diálogo produtivo. Pois bem, no momento em que o chanceler brasileiro Mauro Vieira enfrentava a franqueza fria do colega Marco Rubio, nos quinze minutos de conversa no Departamento de Estado, Lula discursava no congresso do Partido Comunista, onde execrou as atuais ameaças dos Estados Unidos sobre a Venezuela, e proclamou a América Latina como terra impermeável a impertinências de “presidentes de fora”. Palco e plateia comunistas para um recado que não podia ter endereço mais claro. Em Caracas, o ditador Maduro celebrou a reação brasileira como apoio político e estratégico, o que o habilita a contar com outros gestos simpáticos, caso as coisas se compliquem. Certamente haveriam de se complicar também para nós.

Mais que sabido, o abismo nas relações ampliou-se com a sobretaxação com que o presidente americano castigou as exportações brasileiras, sem esconder que se tratava de uma ação política, depois que o Departamento de Estado considerou que vivemos sob ditadura disfarçada, na qual Executivo e Judiciário se consorciaram contra o Congresso. Não é só. Quando chegar o momento do tête-à-tête na Malásia, se chegar, os dois presidentes terão antiga pauta a distanciá-los, não só a Venezuela, mas também Israel, Irã e Ucrânia, além dessa tese que tanto nos interessa: a sobretaxas escandalosa tem tudo a ver com política. Visto assim, uma dose de otimismo para o encontro Trump-Lula parece coisa muito minguada.
( Melhor é manter essa reunião em fogo brando. Surgiram indícios de que o governo americano prepara uma nova carga de restrições, o que incluiria aplicar sanções a ministros e personalidades influentes de Brasília. Se tais incursões, como se teme, afetarem as funções da embaixada, a conversa fica muito difícil; talvez nem possa se realizar).



sexta-feira, 17 de outubro de 2025

 A Pauta é Política

17 outubro 2025

VEREADORES

Vereadores à Câmara Municipal preparam-se para as eleições de 2026. Um terço da composição do Legislativo será candidato a deputado federal ou estadual. Há quem considere a possível candidatura do presidente da Câmara, vereador José Márcio Garotinho, a uma vaga na Assembleia Legislativa.
Nem todos os vereadores têm acesso aos caciques partidários para conseguir vaga e disputar o apoio financeiro do fundo de financiamento eleitoral. Alguns até conseguem a vaga, mas não os recursos, forçados a captá-los em campanha com doações de apoiadores. Mas, mesmo assim, se entram na disputa, é vantajoso, pois já fazem pré-campanha para 2028, quando ocorrerão as eleições municipais. A vantagem é para aquele que vai disputar tendo apoio financeiro do fundo.
Por falar em fundo eleitoral, há uma proposta na Câmara dos Deputados de reservar cerca de 5 bilhões do orçamento da União de 2026 para o financiamento público eleitoral. Proposta considerada indecorosa por boa parte dos observadores políticos. Afinal, para garantir esse escândalo é preciso promover cortes em recursos para as políticas sociais.

DESEMBARQUE

Notícia que surpreendeu os políticos na semana passada, ainda não totalmente digerida, deu conta de que o ex-deputado Eduardo Cunha, uma das mais complicadas biografias da Lava Jato, escolheu Minas, e depois Juiz de Fora, para retomar a vida política. Já desembarcou aqui para os primeiros contatos. Teria estado com Alberto Bejani. Se ambos não dispõem de votos, não se sabe o que Cunha pode esperar do ex-prefeito, e o ex-prefeito esperar dele. Em Leopoldina, Cunha já tem negócios comerciais.

CARGO ALUGADO

A construção de uma bancada governista no Congresso, aritmeticamente suficiente para facilitar tramitações, continua levando a implicações e complicações: a oferta de cargos em troca de votos, velho modelo de barganhas, não raro, resulta em desacertos. Costuma que, na contingência do desenlace, todos saiam chamuscados, como no recente episódio envolvendo os ministros Celso Sabino, do Turismo, e André Fufuca, dos Esportes, quando os partidos fizeram soar a campainha, dão por terminada a temporada de apoio ao governo Lula, exigem que os ministros renunciem, e os colocaram sob ameaça de expulsão. Sob esse clima, a pasta confiada a Sabino ganhou maior expressão no presente momento, em que se ultimam preparativos para a Cop30, em novembro. O encontro terá enfoque nas políticas climáticas, traz ao Brasil centenas de autoridades e especialistas, que, trabalhando ou não, serão ilustres visitantes e turistas, algo que guindou o titular a uma linha de responsabilidades no êxito do evento. Não é de hoje: afeiçoados aos cargos, neles projetando aspirações eleitorais imediatas, os que se hospedam no primeiro escalão resistem em cumprir ordem partidária para entregar cadeiras, gavetas e mordomias.


O VICE DETONI

No domingo, dia 12, dedicado à padroeira do Brasil, estavam juntos o padre Pierre Maurício, o vice-prefeito Marcelo e o vereador Garotinho, presidente da Câmara. De helicóptero, sobrevoaram a cidade com a imagem de Nossa Senhora Aparecida, pedindo bênçãos para todos os fiéis, para a cidade, para o país. É como descreveu o vereador.
Comentaram os observadores, nas rodas de conversa durante a semana, após o evento, que àquele episódio somaram-se outros, já registrados, onde a visibilidade do vice-prefeito é uma evidência de que há com ele um projeto político para futuro próximo. Na política, os símbolos no cenário revelam intenções. O vice, desde o início do mandato, em janeiro, tem se mostrado onipresente nos atos do governo municipal.

SUCESSÃO MINEIRA

Para as próximas eleições são conhecidas as preliminares, já agora. Sobre a disputa para governador há uma variedade de pré-candidatos. O deputado federal Nikolas Ferreira (PL) tanto pode ser candidato à reeleição como entrar na disputa pelo governo de Minas. O senador Cleitinho Azevedo (Republicanos) lidera as pesquisas para o governo estadual desde o início do ano. O Senador Rodrigo Pacheco (PSD), se quiser ser o candidato, com apoio de Lula, deverá ir para o PSB, do vice-presidente Geraldo Alckmin. E o vice-governador Mateus Simões (Novo), também pretendente ao Palácio Tiradentes, recebeu convite do presidente do PSD, Gilberto Kassab, para se filiar ao partido, e ser o candidato. Agora, surge no conturbado cenário a filiação do ex-prefeito de BH Alexandre Kalil ao PDT com vistas à disputa do governo estadual. Caso as pré-candidaturas citadas se mantenham, teremos em Minas uma disputa acirrada, fora da polarização política nacional.


terça-feira, 14 de outubro de 2025

 


Razões e contradições
((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil"))


A construção de uma bancada governista no Congresso, aritmeticamente suficiente para facilitar tramitações, continua levando a implicações e complicações: a oferta de cargos em troca de votos, velho modelo de barganhas, não raro, resulta em desacertos. Costuma que, na contingência do desenlace, todos saiam chamuscados, como no recente episódio envolvendo os ministros Celso Sabino, do Turismo, e André Fufuca, dos Esportes, quando os partidos fizeram soar a campainha, dão por terminada a temporada de apoio ao governo Lula, exigem que os ministros renunciem, e os colocam sob ameaça de expulsão. Sob esse clima, a pasta confiada a Sabino ganhou maior expressão no presente momento, em que se ultimam preparativos para a Cop30, em novembro. O encontro terá enfoque nas políticas climáticas, traz ao Brasil centenas de autoridades e especialistas, que trabalhando ou não, serão ilustres visitantes e turistas, algo que guindou o titular a uma linha de responsabilidades no êxito do evento. Não é de hoje: afeiçoados aos cargos, neles projetando aspirações eleitorais imediatas, os que se hospedam no primeiro escalão resistem em cumprir ordem partidária para entregar cadeiras, gavetas e mordomias.

Quando o governo é parte de um presidencialismo de resultados, como o que temos hoje, se chegam os planos para a eleição que se avizinha, é natural que a base parlamentar se considere dispensada da coalizão. Se preciso, entra em colisão, para ter liberdade de adotar novas opções. Outro não seria o destino do União Brasil e do Progressistas, que exigiram a renúncia de seus ministros. Não há quem diga que são cobranças cobertas de razão, pois aproveitaram bem do poder, quando este lhes foi propício. Protagonizando opereta de conveniências, baixaram a cortina e saíram de cena, no aguardo de novo espetáculo em que tenham papel a desempenhar.

Diferente rota para refletir sobre o episódio sugere que os ministros tinham motivo para negar imediata desocupação do cargo, como exigiram seus partidos, porque, afinal, sob sua orientação pessoal, desenvolvem-se providências que podem estar associadas ao êxito da discussão climática; e aí eles e o Brasil têm imensa responsabilidade. Afora que na passagem pelo poder acabaram apaixonados pela cadeira e pelo momento. Mas alguma razão também não faltaria aos dois partidos, porque são deles os cargos no ministério, fruto da troca de interesses. Regras de um jogo que todos aceitaram jogar. Cria-se, então, o embaraço, porque a razão ficou dividida, em cotas iguais, entre os síndicos e o condomínio. Os ministros carregam o dever de lealdade ao governo, sobretudo num momento importante, mas se os partidos se retiram da base, não há mais como estar ali representados. Validade vencida. O que havia para se aproveitar já não é mais visível na prateleira. Preferível afirmar que ninguém sai absolvido nesse enredo.

Situações assim, com a marca da fragilidade, tendem a aumentar, se as peças de apoio circunstancial percebem insegurança e acenos no processo eleitoral que vai chegando. Os partidos, não apenas o União Brasil e o Progressistas se recolhem, porque ainda não sabem de onde virão os dias mais propícios. Nada de novo nos governos de alianças, que delas não escapam, porque não têm como escapar, se estão sem maioria parlamentar.

terça-feira, 7 de outubro de 2025

 

Um novo eleitor

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil"  ))

Os partidos e seus chefes acham que, mesmo faltando um ano para a sucessão do presidente Lula, já é tempo de aprofundar discussões em torno desse obscuro 2026. Não se pode dizer que estejam apressados, ainda mais quando se sente o campo político minado e movediço. E, exatamente por isso, vem a certeza de temporada de altas complexidades a absorvê-los. Outra coisa não se tem visto nos arraiais da esquerda, onde a interrogação é tentar esticar o tempo de Lula ou enfrentar a penumbra da falta de opção. E a direita mergulhada no desafio instigante: continuar apostando todas as fichas em Bolsonaro, manietado por uma pena de prisão doméstica, ou roçar novos rumos. Os direitistas têm forças para o embate, mas sentem dificuldade para conciliar o desejável e o possível nos resultados eleitorais.
Seja qual for o destino dos partidos e dos candidatos, o que se pretende, nestas breves linhas, é chamar atenção para outro aspecto na rota da sucessão, que cabe avaliar desde já. Não convém ignorar novos fatores capazes de exercer influência decisiva sobre o colégio eleitoral, que vai se formando com uma composição diferente das que tivemos em pleitos passados. Os eleitores de 2026 já não serão de maioria branca e masculina. O IBGE mandou dizer que mulheres, negros e pardos são em maior número, espalhados por todo o Brasil. Se quiserem, se conscientizados, se forem orientados para tanto, podem determinar o norte das urnas. Os partidos e os grupos que ensaiam entrar na luta têm de pensar nisso. Ou, se já pensam, guardam segredo.
E os jovens? O que dizer, o que acenar para eles? Em determinadas circunstâncias, pode sensibilizar aos novos eleitores a idade de um candidato à Presidência da República. Os mais jovens que passaram pela História foram Nilo Peçanha e Fernando Collor, que chegaram ao poder quando tinham 40 anos. Getúlio tinha 47.

Defesa sucateada

O que estava faltando - se é que algo faltasse – acabou ocorrendo com o testemunho pessoal do presidente da República. Na semana passada, viu-se forçado a trocar de aeronave das Forças Armadas em que viajava pela região Norte, quando o aparelho apresentou defeito técnico, com ameaça de incêndio. Ele próprio deu a explicação, com certo constrangimento, ainda que com humor. Foi um caso grave, mas, por segurança, preferiu ir à igreja da Senhora de Nazaré para agradecer a vida preservada.
Tirante o susto, diga-se que foi o testemunho de quem está mais que credenciado para confessar o estado crítico dos equipamentos de segurança colocados à disposição da população. Se um avião militar que transporta o presidente é inseguro, é de se imaginar a precariedade em que têm vivido quartéis, portos e hangares deste Brasil afora.
O episódio fez lembrar recente visita ao Congresso Nacional do ministro da Defesa, José Múcio, onde deixou um depoimento altamente preocupante, depois de confessar que, se temos tanques, caminhões e aviões, nada deles se pode esperar, porque falta combustível para colocá-los em operação. Espanta saber que o Congresso ouviu esse relato desanimador sem se deixar dominar pelo pânico, o que seria justo esperar que acontecesse de imediato. Nem seria para menos, porque a autoridade maior da Defesa acabava de denunciar que somos um país vulnerável. Deixou claro que não há como confiar às Forças Armadas a integridade territorial. Gravíssimo o flagelo exposto pelo ministro Múcio.
O que esperar mais para cuidar dessa crise com a devida prioridade? Aguardar outro susto presidencial?