quinta-feira, 29 de maio de 2025

 

No aniversário, coisas da política


A um leitor que envia mensagem, identificando-se como Nascimento, a proximidade da data do aniversário da cidade, a transcorrer amanhã, ensejaria algumas anotações sobre a importância de Juiz de Fora na política nacional, nas primeiras décadas de sua História, o que, para muitos, seria vagar por fatos isolados, fora de contextualização mais expressiva. Seja como for, alguns fatos merecem registros, e vale repassá-los, à guisa de celebração da data.


Quando se busca o passado, sempre se ouve falar que a expressão da cidade raramente se converteu em poder. O que é fato. Ela influía, muitas vezes ajudou a tomar decisões, mas foram poucos os que daqui saíram para governar Minas e o Brasil. Primeiro exemplo sem sair de Minas: em mais de 150 anos, ao palácio da Liberdade só chegamos cinco vezes, o que contrasta com a importância local, não só na política, como na economia e na cultura.


Começando pelo Estado, com Luiz Eugênio Horta Barbosa ( 1842-1927), que presidiu a província em 1887, por um ano. O que, a bem dizer, não era pouco, porque, naquela época, a alternância se fazia à sombra de fatores diversos e interesses imediatos da corte; tanto assim, que Horta Barbosa também governou Espírito Santo, Piauí e Alagoas, em todos os casos por poucos períodos. Mas mandava pra valer! Foi pecuarista, um dos fundadores da Escola de Direito do Granbery, teve seu nome tristemente ligado à Hospedaria dos Imigrantes Italianos, página terrível de desumanidades. Outra tragédia: com recursos próprios financiou dois pelotões para a Guerra do Paraguai, facilmente derrotados. Nenhum dos nossos heróis voltou vivo.


2 - Em 1926, Antônio Carlos Andrada, vereador e agente executivo em Juiz de Fora, foi eleito presidente de Minas, onde realizaria obra expressiva na educação, além de inovar nas eleições com o voto secreto. Mas logo tornou-se uma expressão nacional. Liderou a Aliança Liberal de 30, e teria sido presidente da República, não fosse a resistência dos paulistas em manter a candidatura de Júlio Prestes. Ministro da Fazenda e deputado federal, dirigia a Câmara, substituindo Getúlio Vargas, quando este viajou para Argentina e Uruguai, de 17 de maio a 8 de julho de 1935. (a Constituição de 34 havia eliminado a figura do vice-presidente da República). Recusou-se a receber “os dias trabalhados”, alegando que seu sonho era estar onde esteve naqueles dias. Portanto, nada a cobrar nem a receber.


3 - O terceiro de Juiz de Fora a governar o Estado foi Nísio Batista de Oliveira. Dirigia o Tribunal de Justiça, quando assumiu, em meio à crise nacional de 1945. Ficou no cargo durante ano e meio, depois que o presidente do Supremo, José Linhares, mandou que se fizesse tudo para tirar as forças de Benedito Valadares. No seu período estava em tela o grave problema do Contestado, terras disputadas por Minas e Espírito Santo, com muitos choques armados e mortes.


Depois, veio João Tavares Corrêa Beraldo, nomeado pelo presidente Dutra. Governou apenas durante seis meses. Terminou seus dias como diretor do Banco de Crédito Real.


Itamar Franco fechou o ciclo dos homens de Juiz de Fora no Palácio da Liberdade. Com um detalhe: mais tarde, ele e Nilo Peçanha, do Rio de Janeiro, foram os únicos que governaram seus estados depois de terem sido presidente da República. Em Brasília, onde chegou como vice de Fernando Collor, e a quem substituiu, o ponto alto de sua biografia seria o Plano Real, que reorganizou a política financeira do país.


Teriam sido seis os governadores conterrâneos, se Lúcio Bittencourt, do PTB, na década de 50 vencesse Bias Fortes (PSD) e Bilac Pinto (UDN ). Interessante sobre Lúcio: na campanha, ele foi a todas as cidades mineiras onde um avião pudesse descer. No dia 9 de setembro de 1955, viajando para Araçuaí, caiu seu Cesna PT-AIF, e ele morreu em Itaobim.


Não há negar a presença da cidade em momentos políticos decisivos, embora, como se disse, nossas lideranças nem sempre souberam reter nas mãos o poder que ajudavam a construir. Uma

rara exceção foi Pedro Marques, que deixou de ser prefeito para se tornar vice na chapa vitoriosa de Olegário Maciel.


4 - Expressivo foi o prestígio dos chefes da cidade no Império, com D Pedro II. Eram 29 os barões e viscondes que aqui residiam, entre eles 10 administraram as províncias. Mas dois que não tinham título nobiliárquico, Halfeld e Mariano, foram os mais influentes.


( Ainda assim, observe-se que em 1860, eleição para Senado e Câmara Federal, votados aqui 113 cidadãos, o poderoso Mariano Procópio ficou em 19º lugar, com 201 votos para deputado. O mais votado foi Capistrano Alkimin, com 641 votos).


Quando caiu o imperador, houve festa dos republicanos, notadamente Constantino Paletta, Fonseca Hermes, João Penido, Luiz Detsi e Fernando Lobo. Mas apenas Fonseca Hermes, na Secretaria-Geral, e Lobo chegariam a compor o primeiro ministério, por algum tempo. Certamente que o “barulho” dos adversários do império estaria por merecer muito mais. A República caminhou, e, de fato, vamos ver que os nossos teriam merecido mais do que receberam.


Com a chegada de Floriano Peixoto ao palácio Itamaraty, sede do governo, os republicanos locais apenas ameaçaram algum voo. Constantino é eleito constituinte federal, Detsi e João Penido deputados federais, e Lobo havia se tornado ministro do Interior. Mas em 1897 Penido (pai) não consegue entrar na lista para o Senado, e se afastou da política. Fernando Lobo também se afasta, ao ser recusado para disputar a vice-presidência da República. Outro revés é que, constituído o Conselho de Intendência, a presidência ficou com Antero Lage Barbosa, que tinha sido conselheiro no Império. Era como emprestar a garrucha ao inimigo…


Interessante, como os mal sucedidos se dispunham a abandonar a política. Estêvam de Oliveira, em livro de 1911, escrevendo sobre a campanha civilista de Ruy, mostra que o deputado Duarte de Abreu, contrariado com a vitória de Hermes da Fonseca, também se retirou.


5 - Mas havia, no começo do século, uma excrescência capaz de justificar o desânimo. Eram as chamadas Comissões Verificadoras, que tinham poder de fulminar candidaturas, desde que considerassem nelas pequenas razões de invalidade. Em 1909 foi proposta a nulidade de 15.000 votos dados a Duarte de Abreu, João Penido e Francisco Bernardino. Votos transferidos para Artur Berrardes. Vitória da fraude. O jornal Pharol definiu como eleitor “fósforo”, o ausente ou morto que “votou”. Antes, 1900, circulava um manifesto, conclamando lideranças descontes com o PRM a ajudar na criação de um novo partido como reação à “farsa ridícula” de eleição dominada por oligarquia. O que não haveria de ser novidade em tempos seguintes.


Um detalhe da política daquele tempo, que merece voltar à lembrança, pois o passar do tempo manteve sua atualidade; pelo contrário, pode confirmá-la. Em 1933 e no ano seguinte, era grande o número de partidos: Republicano Mineiro, Progressista, Trabalhista, Liberal, Economista, Progressista da Juventude, Civilista da Mocidade, Autonomista, e, em formação, Clube Republicano Ditatorial. Diante disso, demos a palavra ao “Correio de Minas”, igualmente atualíssimo: “Trata-se, evidentemente, de inútil dispersão de esforços. Os partidos não se criam por simples vontade de algumas pessoas. Pressupõem a exigência de várias coisas, a começar por eleitores” (edição de 7 janeiro 1933).


6 - Nos anos 30 vieram à cidade Washington Luiz e João Pessoa, para confirmar o prestígio local. Antônio Carlos realmente havia tornado Juiz de Fora o centro das atenções políticas. Sua casa, na rua do Espírito Santo, foi referência para Arthur Bernardes, Venceslau Braz, Afonso Pena Jr, entre outros, no dia em que se selou a Aliança Revolucionária, segundo acordos formados com Vargas e Oswaldo Aranha. Vale lembrar: foi naquela reunião, com a Revolução de Outubro já consagrada, que, pela primeira vez, falou-se em Getúlio para chefe do governo provisório, que estava para nascer. O mais longo “provisório” da História, que duraria 15 anos... Antônio Carlos também tinha seus inimigos nos cafés da rua Halfeld: “Doutor Promessa”, dizia-se.


( A Aliança Liberal obteve grande êxito aqui. Em 1º de março de 1930, a chapa Getúlio-João Pessoa recebeu 3.198 votos, contra 696 da chapa Júlio Prestes-Vital Soares).


A crônica da Revolução de 30 não pode ignorar a figura de Odilon Braga, que a cidade guarda entre as injustiças do esquecimento praticadas contra homens ilustres. Havia sido um dos mais influentes estrategistas daquele movimento, principalmente quanto às armas. Traçou os mapas para aviões e bombas aéreas de 50 quilos. Com o advento do Estado Novo, ditadura de Vargas em 37, tendo ocupado a pasta da Agricultura, foi o único ministro a discordar do golpe, demitindo-se.


(Uma curiosidade raramente citada sobre Odilon. Entre todos os políticos de Juiz de Fora foi o que mais recebeu votos em uma eleição. Em 1950, candidato a vice-presidente da República, teve 2.344.841 votos. Por causa de 176 mil votos perdeu para Café Filho).


                                                               x x x


7 – A eleição de Dilermando Cruz, 1947, para prefeito, foi um marco. O primeiro eleito pelo voto direto na redemocratização. Com ele, a política municipal deselitizou-se, escapando da nobreza. Surge, então, o fenômeno do populismo de Olavo Costa, do velho PSD, que nas duas décadas seguintes ainda haveria de medir forças com os conservadores, representados por Adhemar Andrade. Estava começando um novo tempo. Mas isso é outra conversa, que fica para o aniversário do ano que vem.













terça-feira, 27 de maio de 2025

 Para que federações?


((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

Uma indagação que parece pertinente, diante de evidências, é a razão com que alguns partidos insistem nas chamadas federações, se demostrado está que em nada contribuíram para o aperfeiçoamento da política nacional, nem mesmo para melhorar o nível das atividades parlamentares. Criadas em 2021, para durar, ao menos, quatro anos, já ofereceram denúncia cabal de que a nada mais aspiraram que não os interesses imediatos de suas lideranças, ou para salvar partidos já à beira da morte, incapazes de vencer a Cláusula de Desempenho. Ficamos à espera de contestações ou meras ressalvas para justificá-las. Não as temos. Uma única talvez, para que não se cometa injustiça: as federações, existentes ou em vias de formação, têm servido para antecipar futura e inevitável redução da quantidade de partidos hoje sobreviventes. Pois, exatamente por serem desnecessariamente abundantes, perderam um mínimo de autenticidade. Fora isso, as fusões passam sem o aplauso de quantos desejariam ver essas siglas justificadas em si mesmas.

Vale insistir. A expectativa de alguma virtude nessa inovação está na capacidade de, à luz da experiência, levar ao enxugamento do quadro partidário que temos hoje, pulverizado por trinta siglas, numa mistura de letras que nada dizem, nada propõem.

Nos últimos dias falou-se com frequência de nova ebulição de partidos federados, porque, visivelmente, procuram ampliar suas forças, desde agora, com o objetivo de terem assegurado espaço no grande embate eleitoral que se prenuncia para 2026. Como é escasso o número dos que têm fôlego suficiente para caminhar com pernas próprias, os mais fracos vão se encostando uns nos outros. Também resultado da previsão, que justificadamente fazem, de que a sucessão presidencial tem tudo para reeditar a polarização, quando serão mínimas as chances de os pequenos, isolados, sobreviverem. Precisam se juntar para respirar. Nessas fusões ainda gozam do conforto de não terem de mostrar aos eleitores sua identidade programática ou ideológica.

(Outro atrativo nessas sempre suspeitas associações são os fundos para o financiamento das candidaturas. São bilhões de reais, cada ano mais generosos. Entre suas maldades figura a preferência daqueles recursos à reeleição de deputados e senadores veteranos. Em grande parte comprometendo a indispensável renovação).

2 - A proximidade de 2026 é visível nas preocupações do presidente Lula, em quem muitas responsabilidades pesam, sendo ou não candidato. E começa a trabalhar no fortalecimento e consolidação das correntes de esquerda. Compreende-se. O presidente apreciou os resultados da radicalização das urnas em 2022. Por que não repeti-la?, se do outro lado certamente estarão unidos a direita e os bolsonaristas, conforte o modelo antigo. Pela via das federações partidárias transita o projeto dos direitistas, igualmente empenhados na repetição do cenário, confiantes em que o PT e o governo terão de pagar o ônus da impopularidade.

Por tudo que se viu e ainda se verá, fica a certeza de que essas fusões servem para agasalhar interesses de lideranças calejadas no exercício do poder, servir a projetos imediatos, confundir a sociedade, enganar os eleitores. E só.

Demora e inépcia

As leis, se tardam, por morosidade com que saem dos laboratórios legislativos, muitas vezes comprometem a eficácia das soluções que as inspirou, quando na fase de propositura. É sabido que as gavetas do Congresso são o cemitério de uma infinidade de ideias, muitas delas já clamando por um rigoroso saneador. Tornaram-se peças superadas no tempo.
Não há novidade em dizer isso. Mas o assunto acabou vindo à lembrança, na semana passada, quando o Senado votou o marco legal para licenciamento ambiental, matéria ali adormecida durante quatro anos, que, somados aos 17 por que passou na Câmara, perfaz a maioridade dos 21 anos! Resta outra caminhada, que se presume da mesma longevidade, porque, tendo o texto incorporado alterações substanciais, tem de retornar à Câmara, sem que se saiba quando vencerá os novos trâmites.

O marco trata de ocupações de terras, permite a simplificação e flexibilização de licenças para exploração dos espaços, mas vem encontrar uma realidade inteiramente diferente daquela que então preocupava o parlamento duas décadas atrás. Por mais que tenha sido aperfeiçoada e atualizada, é justo considerar naturais arranhões do tempo. Sabemos todos que, hoje em dia, o que mais assusta nem é exatamente como as coisas mudam, mas a rapidez com que mudam.

No passado, a exploração da terra era uma realidade diversa, a agricultura sob muitos aspectos rudimentar, as ocupações feitas ao leu, o agronegócio, como o que temos hoje, apenas ensaiava sua colossal importância na economia. O mundo e o Brasil eram diferentes.

Mas, se tudo ainda pode ser ajustado e corrigido, o que chama atenção e adverte é a morosidade com que o Congresso geralmente se desobriga de suas responsabilidades. Precisa ser mais ágil, mesmo que sem a ligeireza com que dá trato às emendas parlamentares…



sexta-feira, 23 de maio de 2025

 


A Pauta é Política


23 maio 2025


ZEMA EM CAMPO

O governador Romeu Zema parece decidido a deixar o cargo nas primeiras semanas de 2026, para se dedicar totalmente ao processo eleitoral. Não se trata apenas de um projeto de espectador, porque a intenção é entrar firme como candidato a vice-presidente numa chapa inspirada no centro direita. Cabeça dessa chapa será o governador Tarcísio Freitas, se considerada definitiva a inelegibilidade de Bolsonaro.


REAÇÕES

Prova de que está em curso a montagem do esquema eleitoral é que o palácio da Liberdade vai removendo peças desalinhadas de todos os escalões - primeiro, segundo e terceiro. Não importa se os ocupantes dos cargos têm suficiente força política para preocupar. Saem, substituídos por gente de confiança direta.

No rol das substituições já são conhecidos dois de Juiz de Fora: João Paulo Castro Ferreira, que ocupava assessoria especial na Cemig, e, mais recente, o ex-vereador Rodrigo Mattos, duas vezes presidente da Câmara, que durante quatro meses foi superintendente de Saúde. Atribui-se a mudança à influência do deputado Noraldino Júnior.


Outros virão.


SEM ESPANTO

No começo da semana, dentro e fora do Brasil, surpresa pelo fato de 5,5 milhões de eleitores tenham se ausentado dos três últimos pleitos; estranheza justificada, pelo fato de a legislação brasileira considerar o voto obrigatório. Na verdade, sem razão para espanto, porque o mesmo Tribunal que cobra a frequência do eleitor é o que fixa em R$ 3,10 a multa sobre o faltoso. A Justiça acha que o voto não vale mais que meia lata de cerveja…


OBRA INACABADA

Uma reforma eleitoral definitiva, permanente, sem a necessidade de periódicos consertos e adesivos, é, no Brasil, o que uma antiga lenda portuguesa definia como “obra de Santa Engrácia!”, a que nunca termina. Vê-se que é matéria que o Congresso mexe e remexe, sempre com a preocupação de ajustá-la a conveniências do momento.

Entre as dúvidas que persistem, uma, acentuada a partir da eleição presidencial de 2022, é sobre a conveniência da verificação da autenticidade do voto, com a emissão de impresso, para dar ao eleitor a garantia de que a urna eletrônica registrou verdadeiramente o candidato de sua preferência. Não se nega o avanço que representou a computação eletrônica, mas a comprovação daria uma certeza a mais sobre a destinação do voto. Vários países aderiram à precaução, em nome da legitimação. Não se entende a desconfiança que alguns setores políticos sustentam em relação ao que a própria urna deve imprimir.

O senador Marcelo Castro (MDB-PI), que se especializou em eleições, combate incertezas e temores quanto ao processo, lembrando que na eleição passada concorreram 450.000 brasileiros para os diversos cargos, sem que se registrasse uma única queixa quanto a fraudes. Mas ele se refere a candidatos, não a eleitores, que, quanto a isso, não tão seguros estão.

Castro atribui a uma psicose dos cariocas os temores quanto a eleições fraudadas, por causa do famoso caso Proconsult, de 1982, quando se montou um escandaloso esquema para transformar os brancos e nulos em votos para o candidato a governador Moreira Franco, no Rio de Janeiro, contra seu concorrente, Leonel Brizola. O senador não pode negar que, graças à veemência dos protestos e a uma contagem paralela de votos, liderada por este jornal, o Rio se levantou em nome da democracia representativa. Psicótico ou não, foi o eleitor carioca que abortou o maior crime que se tentou perpetrar contra eleições contemporâneas.


BREVE AUSÊNCIA

Inicialmente, a notícia era da ausência da prefeita, por dez dias, em viagem à Europa. Depois, falou-se da viagem, em igual período, do vice Marcelo Detoni. O que exigiu ser votada, pela Câmara, a licença temporária dos dois. E o presidente da Câmara, José Márcio Garotinho, assumiu interinamente, e fica no cargo até domingo.

A expectativa era que o vice ocupasse o cargo de prefeito, talvez marcando o período com alguma medida relevante. Mas veio a coincidência das viagens. Nada feito.

Em exercício, Garotinho registrou sua passagem pelo Executivo municipal no seu currículo político. Mas é sabido que ser prefeito efetivo é seu projeto para 2028.


DOIS PESOS

O PT faz uma demonstração para o público externo de que há democracia interna no partido, com escolha direta com dirigentes municipais e estaduais. Mas, tratando-se de questão nacional, ora faz eleição indireta, ora faz direta. Este ano, eleição direta para presidente nacional do partido. Analistas acreditam que Lula achava que seu candidato, Edinho Silva (ex-prefeito de Araraquara), teria maior êxito. Afinal, Lula sempre deu a última ordem.


SEM REELEIÇÃO

O fim da reeleição para cargos executivos, como decidiu comissão do Senado Federal, é uma boa-nova. Porém há ainda uma longa tramitação pelo Congresso. A experiência da reeleição demonstrou como se tornou perversidade do sistema político brasileiro. O Chefe do Executivo (em todos os níveis) após eleito já pensa em continuar no poder, e usa da máquina administrativa para conseguir seu desejo.

Melhor seria se essa medida impedisse também reeleições de mandatos legislativos. Facilitaria a renovação na classe política. Porém é um sonho, infelizmente.



terça-feira, 20 de maio de 2025

 


Milhões de eleitores ausentes

(( Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))
Terminou, ontem, a tolerância dada pelo TSE para que 5.129.608 eleitores faltosos se manifestassem, sob pena de estarem sujeitos a multas e limitações diversas no exercício da cidadania. São os que se ausentaram de três pleitos sucessivos, algo inadmissível num país em que o voto tem mão dupla, legalmente definido como direito-dever. Hoje, ficaremos sabendo quantos foram os que aproveitaram a última hora para a regularização. Mas, por mais numerosos que tenham sido, é certo que restou multidão de devedores.
Há duas curiosidades que chamam atenção. A primeira é que a própria Justiça e seus tribunais encarregam-se de empobrecer a importância do voto, ao determinar que o ausente seja multado em apenas R$ 3,51! Poucos desistiriam de Cabo Frio ou um domingo de churrasco, mas preferindo enfrentar a grave pena imposta, menor que meia lata de cerveja…
Outra curiosidade, da mesma forma instigante, é que os partidos políticos, que sem voto não sobrevivem, ficaram totalmente ausentes do esforço para sensibilizar e reconvocar os milhões de inadimplentes. Arrisco uma explicação: se os partidos calam é por imposição da consciência, porque são os primeiros a saber que o eleitor afastado da urna é o mesmo que anda decepcionado com os políticos e com a política.
O desinteresse tem levado a outras discussões, e é um dos argumentos mais frequentemente levantados pelos que advogam, não é de hoje, o fim do voto obrigatório. Não sendo uma imposição legal, prevaleceria o facultativo e opcional. Como tese, é algo que não deve ser desconsiderado.


O que esperar de uma CPI

Temos, quase como uma tradição, desconfiar da eficácia das CPIs do Congresso Nacional, que agitam, debatem, consomem dinheiro, e, em geral, a conclusões nada chegam, ou emitem pareceres conclusivos vagos e insuficientes. Uma das mais recentes foi a Comissão da pandemia, que durou muito, denunciou demais e corroeu a dignidade profissional de alguns estudiosos chamados a depor. Carregando algumas injustiças, acabou enterrada em cova rasa. Sofrimento restou apenas aos injustiçados, porque os criminosos, os que enriqueceram com a peste avassaladora, permaneceram livres.
Se ninguém for ao pelourinho, consola que ficamos conhecendo muitos maus brasileiros, alguns frequentes nos corredores e gabinetes do poder. Explica-se o atual esforço do governo para esvaziar a CPI do INSS. Preocupado, porque com o apetite praticado no assalto contra aposentados e pensionistas, fica difícil, impossível mesmo, evitar graves repercussões na estrutura política que o mantém. Resta, consequentemente, uma indagação: o que seria menos nocivo para o Palácio, esconder a verdade do fato ou expô-lo corajosamente?, sejam quais possam ser os desdobramentos.
Ainda assim, é importante não se desinteressar totalmente por elas, porque, ao menos, servem para expor crimes e delinquências. Ninguém vai preso, mas fica com a cara marcada. Se as Comissões de Inquérito mostram um pouco do que tem de ser mostrado já é alguma coisa, num país onde a impunidade é, a um só tempo, patronesse e prostituta.
Mas por que estamos desenterrando assunto tão calejado? A explicação vem logo com a nova CPI das Bets, que pode acabar sob o mesmo destino das anteriores, embora deixando um detalhe particular, que sugere muita atenção, exatamente a partir do depoimento de uma influencer, agora sob holofotes, Virgínia, insinuante e articulada, liderando 53 milhões de apostadores. Ela pode anestesiar os senadores, que tentam extrair o que todos sabem: o Brasil mergulhou, de cabeça, nas teias de uma jogatina desenfreada, sem limites, depois que o próprio governo emprestou sua colaboração, através da Caixa, administrando jogos diários, cuja gravidade reside exatamente no fácil acesso de assalariados, sobreviventes de biscates e até mendigos. Com Bets conclui-se a missão de popularizar as apostas, feitas com total facilidade por 20 milhões de aficionados do Esporte da Sorte. Graças ao cassino nacional e à inovadora sanguessuga, constrangido e inútil, já vai se recolhendo, agonizante, o velho jogo do bicho, criado em 1888 por João Batista Drumond para manter nosso zoológico.
Há coisas incríveis a serem consideradas sobre as Bets, no campo das consequências sociais, que o Senado precisa observar, prioritariamente. Apenas um entre os detalhes significativos: a febre das apostas está consumindo R$ 3 bilhões de inscritos no Bolsa Família, dos R$ 14 bilhões que o programa investe. No apelo à sorte difícil vai-se o dinheiro da comida, do aluguel, dos serviços indispensáveis. Não seria exagero dizer que estamos diante de uma tragédia social.
(Entre os temores com a proliferação das apostas, está o vício contínuo e crescente, que pode levar até à tragédia. Fenômeno que Dostoievsky definiu em “O Jogador”: “vertigem do ganho e da febre da perda, nada se pode invocar a seu favor, salvo o favor do desfavor dos deuses”) .

Culpa dos cariocas?

Uma reforma eleitoral definitiva, permanente, sem a necessidade de periódicos consertos e adesivos, é, no Brasil, o que uma antiga lenda portuguesa definia como “obra de Santa Engrácia!”, a que nunca termina. Vê-se que é matéria que o Congresso mexe e remexe, sempre com a preocupação de ajustá-la a conveniências do momento. Ainda agora, com adiamentos e discussões intermináveis, ela balança entre questões menores ou indagações importantes. Mas sempre com o propósito dos adiamentos.
Entre as dúvidas que persistem, uma, acentuada a partir da eleição presidencial de 2022, é sobre a conveniência da verificação da autenticidade do voto, com a emissão de impresso, para dar ao eleitor a garantia de que a urna eletrônica registrou verdadeiramente o candidato de sua preferência. Não se nega o avanço que representou a computação eletrônica, mas a comprovação daria uma certeza a mais sobre a destinação do voto. Vários países aderiram à precaução, em nome da legitimação. Não se entende a desconfiança que alguns setores políticos sustentam em relação ao que a própria urna deve imprimir.
O senador Marcelo Castro (MDB-PI), que se especializou em eleições, combate incertezas e temores quanto ao processo, lembrando que na eleição passada concorreram 450.000 brasileiros para os diversos cargos, sem que se registrasse uma única queixa quanto a fraudes. Mas ele se refere a candidatos, não a eleitores, que, quanto a isso, não tão seguros estão.
Ele atribui a uma psicose dos cariocas os temores quanto a eleições fraudadas, por causa do famoso caso Proconsult, de 1982, quando se montou um escandaloso esquema para transformar os brancos e nulos em votos para o candidato a governador Moreira Franco, no Rio de Janeiro, contra seu concorrente, Leonel Brizola. O senador não pode negar que, graças à veemência dos protestos e a uma contagem paralela de votos, liderada por este jornal, o Rio se levantou em nome da democracia representativa. Psicótico ou não, foi o eleitor carioca que abortou o maior crime que se tentou perpetrar contra eleições contemporâneas.



quarta-feira, 14 de maio de 2025

 


Nas pegadas de Lupi

(( Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))

A política, dizem os experientes, não são apenas os fatos, mas também o que eles sinalizam. E adverte, como no recente episódio da destituição do ministro da Previdência, Carlos Lupi, forçado pelo parrudo escândalo do assalto à bolsa de aposentados e pensionistas, acabando por arrastar a solidariedade de seu partido, PDT, que saiu da base parlamentar de apoio ao governo. Na Câmara são 12 votos com os quais não se pode mais contar. O volume do problema com o INSS deu razões suficientes para o desembarque, mesmo com o ministro pretextando inocência, mas impondo à Presidência da República novo desafio nas tentativas de conter a onda de impopularidade. Das pegadas de Lupi restou a marca da nunca desmentida advertência de que ministros são amigos circunstanciais. Não ficam nem saem com a mesma animação com que chegam. Se retirantes, costumam aprofundar a crise de credibilidade do poder a que estiveram servindo. Convém o governo não considerar esse fenômeno como algo desimportante, isolado, nem tratá-lo como espetáculo de pirotecnia, como Lula tentou esvaziar a calamidade. Num país amalucado, podia ter perguntado quem vem depois de Lupi...
( Porque nada é impossível. A propósito, seja elogiado o IBGE, instituição que tem a grave responsabilidade de traçar o perfil correto do país, e agora decidiu nos mostrar no mapa-mundi como realmente somos e estamos: de cabeça pra baixo).
Essa nova crise deve ter levado o presidente a sentir, mais uma vez, que a estrutura de apoio nas bancadas do Congresso é sempre frágil, permanentemente sujeita a episódios imprevistos e desconcertantes, mesmo sem a gravidade do que se viu agora. Em primeiro lugar, cabe lembrar que os acordos no campo em que têm jogado Executivo e Legislativo sempre se inspiram em troca de favores, sem bolas na trave. Cessados, geram debandada. Como no adeus do PDT. Quando se perde ministério de grande importância, o que a base faz é arrumar as malas e esvaziar as gavetas.
Com tal modelo de apoiamentos, o presidente fica à mercê de novas surpresas, já que escândalos não faltam, e os partidos que o sustentam preferem retirar-se, ainda mais ligeiros quando os olhares estão atentos ao calendário eleitoral. Os circunstancialmente governistas evitam desgastes em uma quadra tão delicada, e não hesitam em desassistir o palácio. Viu-se agora com os trabalhistas brizolistas.
Se se trata de um risco concreto, cabe avaliar os instrumentos de defesa. É certo que, diante do que ainda pode acontecer, a Lula não basta fazer de conta que as coisas estão sob controle, e acusar explorações políticas de tomar carona no assalto, mas tem de matutar – e sem demora – sobre alternativas que lhe restam para salvar o mínimo de dignidade. Alternativas são complexas, porque todo o seu mandato é marcado por costuras e remendos na textura da política de relações com o Congresso. Se ela se romper, total ou parcialmente, o remédio é apelar para grande mobilização popular, estratégia em que ele soma alguma experiência. Na busca do agrado popular, talvez o caminho passe por uma corajosa varredura, em nome da moralidade no serviço público, atacando o foco dos crimes contra os interesses da nação. Se acidentes como esse do INSS podem derrubar o governo, o presidente tem de agir logo, hasteando uma nova bandeira: guerra, sem tréguas, aos corruptos, dentro ou fora do palácio, ainda que alguns deles tenham parte nas intimidades presidenciais. O povo se consola ao ver poderosos em maus lençóis.
Com três mandatos, chegando aos 80 anos, tendo como único direito a passar para a História da melhor maneira possível, Lula já não precisaria temer grandes lances heroicos. Doa em quem doer. É pagar pra ver.

Grupo de trabalho
Cada vez mais duvidoso que o Executivo consiga, sem grandes concessões, prosperar a pretendida PEC da nova política da segurança pública, que, além de estar despejada sobre ela a má vontade de governadores, tem, agora, para colocá-la à beira da cova, a criação de um grupo de trabalho, formado por senadores e deputados. A ideia é do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, que promete incursões capazes de aperfeiçoar o texto original. Sabemos como são essas comissões, altamente competentes para jogar com o tempo e nada resolver.
Matéria de tamanha complexidade, eivada de dúvidas quanto às intenções, mais ainda sua real capacidade de encostar na parede o crime organizado, ela não terá como prosperar em clima de crises, como as que estamos vivendo. E, daqui a pouco, prejudicada também pela temporada eleitoral.
Bons apostadores não jogariam todas as fichas no futuro dessa PEC.
( É tamanha a evidência dos obstáculos e a promessa de infinitos expedientes de procrastinação, que se permite duvidar do sucesso do grupo de senadores e deputados, em fase de organização. O humorista americano Art Buchwald (1925-2007) tinha uma definição peculiar de grupo de trabalho. “É um batalhão de despreparados, convocado por um desinteressado para preparar projetos desnecessários”).

terça-feira, 6 de maio de 2025

 

A hora é esta

((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" )_

Ainda sob a comoção provocada pela morte do Papa, e, na sequência, as expectativas pela eleição de seu sucessor, indaga-se sobre o que seria possível fazer para que as homilias franciscanas influenciem, beneficamente, na política. Neste mesmo jornal levantou-se a questão, com opiniões as mais diversas, embora quase todos reconheçam que aquele pontificado de doze anos marcou permanente preocupação em fazer com que o mundo empreenda sincera caminhada para o entendimento. O diálogo como meio, a paz por fim. A Igreja diz ter dado a saída. Não se pode dizer que o pontífice Francisco tenha prosperado nesse ideal, tanto quanto desejou a difícil esperança; esperança dele e dos homens de boa vontade, como reza um dos mais antigos clamores do cristianismo.

Bem ou mal, a esperança sobrevive. Já é alguma coisa. Mas é preciso robustecê-la junto às lideranças políticas, governantes, chefes de comunidades ou quem quer que seja, se tiver poder de influir. É preciso começar pelas lideranças.

(A hora em que vivemos, diria o jurista Afonso Arinos, é um Brasil confuso. Temerosa, descrente, é austera e grave, prenhe de angústias, incerteza e receios. É, sem dúvida, uma hora de desesperança, mas não, ainda, de desespero).

À vista disso, digamos ser uma pena que o governo, seus apoiadores e os que lhe fazem oposição não tenham dado conta de que, contrariamente ao que possa parecer, estamos vivendo, por obra do contraste, a hora propícia para o grande projeto de harmonia nacional, à sombra do que se herdou do sentimento do papa falecido. Fácil admitir. Por quê? Porque, no Brasil, este é um momento em que ninguém protesta, raramente se levantam os partidos, entidades de representação da sociedade recolhidas, caladas, desanimadas para contestar e cobrar, desinteressadas para grandes litígios. Todos acalmados, anestesiados. Sente-se em toda parte a preferência geral pela imperturbabilidade. É preciso tirar proveito da indiferença em que vivemos: se por um lado ela é muito ruim, também ajuda, porque não faz grandes ondas, e permite incursões mais amplas dos pacificadores. O conformismo que nos anestesia e cala é o clima para juntar as peças e reorganizar as coisas tão desarrumadas como andam neste país. Do limão costuma-se fazer a limonada.

O ambiente de braços cruzados está à vista. Tome-se apenas como exemplo (outros nem se fariam necessários), a ausência de greves de trabalhadores e funcionários, tão comuns em governos passados, mas não agora. O PT, que inspirou e liderou as maiores paralisações que o país já conheceu, tem revelado imensa habilidade para hibernar e silenciar os protestos de rua, não deixa desassossegados o governo e o presidente Lula. Fossem os tempos do PSDB e do MDB as praças estariam animadas contra a corrupção, os assaltos ao INSS, os gastos exagerados das mordomias oficiais. Bandeiras, cartazes, barricadas, palavras de ordem denunciando os salários mínimos miseráveis, lojas e bancos quebrados. Morte aos ladrões de colarinho branco, gritavam as multidões. Hoje, espectadoras. OAB, sindicatos e suas federações, os milhões de evangélicos contentes com o Velho Testamento, entidades religiosas, a começar pela CNBB, todos absorvidos na letargia cômoda. A nação espectadora abstraída, vendo os tribunais de justiça fazendo injustiças, o parlamento imerso nas emendas e nos fundos eleitorais, o Executivo às cabeçadas.

Sente-se no brasileiro comum uma coisa curiosa, que talvez explique a indisposição para agir, muito menos reagir: ele sabe de onde quer sair, mas não tem noção sobre aonde ir.

Complacente. Então, se não há cobranças e protestos para desafiar o sono do governo e dos grandes chefes; se os poderes não são incomodados, fazem o que querem e o que não deviam fazer; e raras as reações sonolentas, eis o momento adequado para, colocando o Brasil nos trilhos, vencer a nefasta impunidade que premia os maus e sacudir os indiferentes, despertar a sociedade, como desejaria o Papa, que muito antes já havia lamentado um mal que também conhecemos aqui: a indiferença.

É preciso aproveitar o instante de conformismo da nação sonolenta, e arrumar a casa, começando com o amplo projeto nacional e patriótico de pacificação. Dirão muitos: como é difícil!. Mas é exatamente o mais difícil que merece ser sonhado.