Reféns da polarização
((Wilson Cid, hoje, no "Jornal do Brasil" ))
Constatação cada vez mais presente – sente-se com certa facilidade – é que as pessoas comuns têm se revelado enfastiadas, aborrecidas com a polarização entre lulistas e bolsonaristas, fenômeno condenado ao papel de avant-première da sucessão presidencial de 2026. Será que não temos algo menos pobre ou mais criativo para desenhar o futuro imediato do país? Continuaríamos limitados a um embate que se pauta e prospera em idiossincrasias? Não é possível. Nem desejável, porque a polarização gera radicalização, que gera intolerância, que gera desordem.
Pois, se é perceptível o clima de tédio entre os eleitores, significa que devemos aspirar a algo que nos liberte daquela dicotomia nefasta, que, além de nada construir hoje, certamente haverá de destruir muito mais amanhã. Bem claro deve ficar que elaborar um raciocínio sobre isso não é o mesmo que antecipar juízos, preferências ou antipatias por eventuais pré-candidaturas que possam estar em cogitação. Nada disso. O que se estima é que o eleitorado seja contemplado, desde agora, com uma ampla e profunda discussão, capaz de libertar o Brasil dessa pobreza do embate entre duas facções cujos interesses estão no poder: chegar a ele ou mantê-lo, como via de desforras e ódios acumulados em décadas.
Por ser algo relevante, esse sentimento de exaustão tem de ser levado a sério pelos partidos e seus chefes, ao se derem à tarefa de traçar rumos da sucessão, depois do desânimo causado por um antagonismo que, até agora, em nada acrescentou, mas tem colocado o país diante de sobressaltos e inseguranças. Precisam observar, tanto aqueles como outras lideranças responsáveis, que, no fundo e na superfície, o que se tem nessa guerra Lula-Bolsonaro é o continuísmo; exatamente isso, nada mais que isso. Quem está no Planalto quer continuar, os que já estiveram lá querem voltar. Muito pouco para dar resposta às grandes questões que excitam a nação.
(Há tempos, soldados nessa guerra Lula - Bolsonaro, seus admiradores amam e odeiam, com bem medida reciprocidade. Pior: desconsideram quem não se submete a esse jogo, exigem adesão, sob pena de os não aderentes serem definidos como fascistas ou comunistas. Os radicais do ex e do atual presidente negam um princípio da lógica aristotélica, segundo a qual amar a alguém não é, automaticamente, odiar o outro).
Escassa profissionalização
As discussões sobre empregabilidade e seus desafios nos tempos atuais têm relegado a plano secundário a desejável e moderna visão sobre profissionalização. Para as camadas mais pobres o que as políticas governamentais produzem vem com o viés do assistencialismo paternal, quando o ideal seria a capacitação em larga escala, frente aos progressos da tecnologia. Instituições como Senac e Sesi são modelares, mas pobres e carentes de uma legislação federal estimuladora. Estamos atrasados nesse campo, ao mesmo tempo em que é visível as novas gerações de mão de obra esbarrando em dificuldades. Muitos jovens chegam, não conseguem se adaptar, frustram-se.
Estão desatualizadas as informações sobre projetos dessa natureza em apreciação no Congresso Nacional; mas sobre eles já teríamos sabido, se propusessem grandes novidades, e não é o caso. Os governantes revelam vago interesse, não por falta de pressão dos meios de produção, que querem evoluir, sob pena de perderem o mercado. No rastro disso, sente-se também o crescente predomínio da vocação pelo bacharelismo, em conflito com a crescente necessidade de trabalhadores desprovidos de diploma superior. Uma preocupação que acompanha a história da República. É preciso ser doutor, e nada mais.
A tecnologia reclama, diariamente, o aperfeiçoamento, não olha devidamente o trabalho despreparado. Como também expulsa. Um exemplo que logo se identifica está em qualquer agência bancária, outrora área dinâmica conduzida por funcionários, depois substituídos por caixas eletrônicos, cartões, celulares e pix e outros expedientes. São os frios e silenciosos ocupantes de antigas vagas humanas.
Na carência de modernização cabe uma dose de responsabilidade aos sindicatos, acostumados a defender o empregado apenas para garantia das vagas, não pela qualificação, muito menos o preparo dos associados para novas realizações. Ou então limitam-se a xingar os patrões.
Não estamos sabendo democratizar a marcha da tecnologia e a vastidão das oportunidades, esperando aquilo que, certo dia, disse o ministro Roberto Campos, para quem o progresso tecnológico tem virtudes autocorretivas. Quer dizer, adapta-se; como ocorreu quando chegaram os carros para substituir as carroças, ou a eletricidade, que matou os lampiões. Mas tudo isso aconteceu porque, para evoluir, havia gente que sabia das coisas…
Nenhum comentário:
Postar um comentário